É muito provável que a justiça continue a fazer estragos
sobre a classe política durante o próximo ano, porque tudo indica que a
remoção de elementos corruptos nas mais altas instâncias estão a permitir que deixe
de haver “vacas sagradas”. É aliás muito provável que processos emperrados
ganhem outro alento, passe o estranhíssimo final do processo dos submarinos.
Todos os partidos são potenciais vítimas disto, o que pode
arrastar dúvidas sobre os resultados eleitorais até muito próximo das eleições.
Apesar disto, o mais provável é o surgimento de um governo de bloco central,
tão instável como a sua versão original, cujo fim poderá ser decretado pelo
parceiro menor.
De resto, em termos económicos, os problemas maiores parecem
ser externos. Desde o Verão que se assiste a uma sucessiva revisão em baixa das
previsões de crescimento da zona do euro e tudo indica que deverão continuar.
Estamos a aproximarmo-nos perigosamente da armadilha da
deflação, na qual, uma vez entrada, é muito difícil de escapar. É
verdadeiramente chocante como, sendo os riscos de deflação muito mais fortes na
zona do euro, seja aqui que a acção das autoridades seja menor. Não são só os
riscos económicos, já suficientemente graves, mas os próprios riscos políticos.
As economias mais frágeis desta zona são as mais endividadas e a deflação iria
aumentar estas dívidas em termos reais. É altamente improvável que, dada a sua
actual fragilidade, a zona do euro consiga sobreviver intacta a uma provação
tão devastadora como uma deflação generalizada e persistente. Por seu turno, o
fim do euro tem o potencial de destruir o mais importante legado do pós-guerra
europeu.
Aliás, na Grécia, tem hoje lugar a terceira volta das
eleições presidenciais que, se for inconclusiva, deverá conduzir a eleições
antecipadas. Aí, a extrema-esquerda está a frente nas sondagens e aquilo que
tem prometido indica um braço-de-ferro completamente provocador com os
parceiros europeus. É demasiado temerário fazer previsões, mas é evidente que
isto nos afectará.
Outro braço-de-ferro em curso, diz respeito à compra de
dívida soberana pelo BCE, onde já se fala em serem os bancos centrais nacionais
a comprarem (e ficarem com o risco) a dívida dos Estados respectivos, como
forma de ultrapassar o actual impasse. Tudo isto equivale a estar a discutir
como se deve prosseguir a operação no meio de uma cirurgia de coração aberto. É
difícil ficar optimista sobre a zona do euro, no meio disto.
Para agravar o cenário, a actual queda dos preços do
petróleo prepara-se para fazer mais mal do que bem, tendo todas as
condições para iniciar um período de deflação na Europa. A grande dúvida é saber
se poderá ser combatida antes de se tornar verdadeiramente perigosa. Isto sem
falar no urso ferido em que a Rússia se transformará. Toda esta incerteza
política pode bem agravar um cenário económico em degradação.
[Publicado no DiárioEconómico]