segunda-feira, 31 de maio de 2010

Banca estrangeira deve ganhar quota

Crédito nos bancos estrangeiros está mais barato que nos portugueses

No último mês, os bancos portugueses subiram os "spreads", cobrando, no mínimo, 1% de margem para financiarem créditos à habitação. Já as instituições estrangeiras a operar em Portugal mantiveram os seus "spreads", sendo actualmente possível conseguir taxas inferiores a 0,5%.

http://www.jornaldenegocios.pt/index.php?template=SHOWNEWS&id=428057

Estes desenvolvimentos eram previsíveis e é importante que as suas consequências não sejam combatidas. O ideal para a economia portuguesa neste momento é que os bancos estrangeiros ganhem quota de mercado, de um mercado em claro abrandamento, para que a economia não sufoque com spreads elevados.

O Banco de Portugal deveria forçar os bancos portugueses a aumentar os seus rácios de capital, mesmo que isso implique perder quota de mercado. Enquanto estes rácios não aumentarem de forma substantiva, os bancos deveriam inclusive ser impedidos de distribuir dividendos.

O risco de bancarrota mantém-se no horizonte e é muito importante os bancos estarem o mais robustos possível para lidarem com as dificuldades que se avizinham.

domingo, 30 de maio de 2010

Uma mentirazinha

Há para aí muita gente abespinhada porque afinal Chico Buarque não pediu para conhecer Sócrates, mas foi o inverso o que se passou. Ou os assessores do PM andam cada vez mais distraídos ou isto não passa de uma mentirazinha a que Sócrates tem direito.

Sócrates anda há cinco anos a falar verdade, sempre tem agora direito a dizer a sua mentirazinha. É duma grande má-vontade caírem em cima de alguém com um passado tão impoluto só por causa duma coisinha.

sábado, 29 de maio de 2010

Estranho

Poucos dias depois de se saber que o governo tenciona cortar nos apoios aos desempregados, ficamos a saber que o governo prolonga ajuda à banca por causa da crise.

http://economico.sapo.pt/noticias/governo-prolonga-ajuda-a-banca-por-causa-da-crise_90947.html

É certo que o mercado monetário está em coma e que se consegue imaginar razões para esta segunda decisão do governo. Mas não mandaria a prudência política que se tivesse muito cuidado a explicar esta situação? O que vão sentir a maioria dos portugueses?

quinta-feira, 27 de maio de 2010

China afasta-se do euro

De acordo com o FT, a China está a reconsiderar os seus investimentos em obrigações da zona euro.

http://www.ft.com/cms/s/0/7049ad6e-68ea-11df-910b-00144feab49a.html

No ano passado a China esteve a tentar diversificar a sua carteira, demasiado concentrada em dólares. Como a sua carteira é enorme e porque está todos os meses a receber novos fundos devido ao elevado superavit externo, as alterações de carteira fazem-se pelas novas compras. Ou seja, é pouco provável (mas não impossível) que a China decida vender obrigações em euros de forma maciça, mas deverá passar de compras significativas em 2009 para compras praticamente nulas neste ano. É provável que troque as dívidas da periferia do euro por dívida dos países mais robustos, agravando a pressão sobre as taxas de juro, nomeadamente de Portugal.

A depreciação do euro em curso e que se deverá agravar nos próximos tempos afasta os investidores, mas até deverá reduzir o superavit externo chinês.

Este é mais um exemplo de que os receios legítimos dos investidores e não tanto as acções diabólicas de especuladores estão a pesar nas taxas de juro. Mais um forma de nos lembrar que temos de assumir as nossas responsabilidades e corrigir os nossos excessos.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Encruzilhada

Estamos numa encruzilhada, com muitos caminhos possíveis e que os historiadores futuros poderão dizer que era óbvio o caminho que vai ser seguido, mas aqui, no meio de todo este turbilhão, é muito difícil ter essa clarividência.

Cenário A) Após mais um pico de pressão dos mercados, os alemães dão um murro na mesa e decidem abandonar o euro. A França fica com o bebé nos braços e agravam-se as tensões internas nesse país, dividido entre passar a pagar a factura mais elevada e o benefício de poder fazer a pose imperial. Dentro da diminuída zona do euro é todo um novo mundo de conflitos que se inicia.

Cenário B) A Alemanha não desiste já do euro, mas força a aprovação de um sem número de medidas que implicam a transferência de soberania dos estados nacionais para as instâncias comunitárias, para assegurar a solidez futura do euro. O Reino Unido rebela-se contra estas medidas e veta a sua aprovação. Após um desgaste brutal, a Alemanha percebe que não há formas de preservar a solidez do euro e retira-se do mesmo. Segue-se o cenário A, com a diferença que as relações dentro da UE estão muito mais deterioradas.

Cenário C) Uma variante do cenário B, em que a Alemanha, consciente da oposição do Reino Unido, retira o euro da UE, passando tudo o que lhe diz respeito a funcionar em tratados separados. A unidade da UE, uma vez quebrada a propósito do euro, começa a cindir-se nos mais variados assuntos, passando a um agrupamento “deslaçado”, vigorando crescentemente uma Europa “à la carte”. A zona do euro passa a ser um protectorado alemão e as crescentes tensões que isso gera levam a Alemanha a sair do euro. Passa-se ao cenário A, mas com muitas mais fragilidades do que as pressupostas no cenário B.

Cenário D) As garantias dos Estados nacionais aos seus bancos, mais as garantias dadas aos outros Estados membros são accionadas, revelando-se em todo o seu esplendor todo o carácter “subprime” deste sistema. Ver aqui:

http://www.ft.com/cms/s/0/7b62ac7c-6698-11df-aeb1-00144feab49a.html

e aqui:

http://ftalphaville.ft.com/blog/2010/05/21/239696/a-collateralised-eurozone-debt-obligation/

Cenário E) You name it.

domingo, 23 de maio de 2010

Diversificação de depósitos

Os riscos de bancarrota que impendem quer sobre o Estado português, quer sobre a banca nacional, sugerem no mínimo que se faça uma diversificação de depósitos. Mas em que bancos devemos colocar os depósitos?

Julgo que a CGD estará num campeonato à parte. Mesmo que a calamidade das contas públicas impeça o Estado de cumprir a sua parte no Fundo de Garantia dos Depósitos, dificilmente deixará de o fazer sobre os depósitos na CGD.

A partir daqui, instala-se a dúvida. O BCP é o mais frágil, quer em termos de rácios, quer em termos de cotação, quer na falta de consistência da base accionista.

Caso seja necessário, será que os accionistas de referência dos outros bancos avançarão com os fundos necessários a aumentos de capital? O BES tem o Crédit Agricole como grande accionista, mas e se a França também ficar engalfinhada numa grave crise do euro? O BPI e o Santander tem fortes accionistas espanhóis que poderão suster a crise, excepto se enfrentarem também graves problemas no seu mercado doméstico.

Saindo dos cinco grandes e procurando um banco estrangeiro com bolsos bem fundos, que banco escolher? Bancos alemães ou franceses têm grande exposição às dívidas soberanas em risco, pelo que se uma crise de bancarrota se abater sobre a área do euro poderão falir eles próprios. Bancos ingleses têm problemas de outra natureza, mas também estão fragilizados.

Se, por um lado faz todo o sentido procurar diversificar os depósitos, fica muito difícil de perceber (sem uma análise mais aturada) quais os bancos mais seguros para onde faz sentido transferir recursos.

Diversificar moedas

O mais seguro será mesmo ir retirando alguns fundos de euros e trocá-los por outra moeda. Mas qual ou quais?

A libra está fora de questão, porque até se tem depreciado face ao euro e o Reino Unido tem grandes problemas em cima da mesa.

Fonte: BCE, FT

O franco suíço, uma hipótese que surge logo à cabeça, acaba por estar (compreensivelmente) muito correlacionado com o euro, tendo ganho 14% do euro desde Out-07. O dólar é que se tem valorizado mais (20% desde Abr-08), beneficiando do seu estatuto da moeda refúgio, mesmo quando os EUA enfrentam uma crise orçamental séria.

O ouro é também uma hipótese a considerar, embora tenha a desvantagem de ter custos de transacção muito mais elevados. O ouro tem-se valorizado expresso em dólares, pelo que em euros o seu preço tem subido ainda mais depressa. O ouro deixou de ser refúgio contra a inflação mas preserva a sua função de refúgio contra crises. O padrão que se tem registado ultimamente é que quando há mais um episódio de crise na zona do euro, há um duplo movimento: o euro cai e o preço do ouro em dólares sobe. Assim, o preço do ouro em euros sobe duplamente quando há um problema na zona do euro, fazendo deste activo uma boa opção como seguro contra a bancarrota.

Começa mal

O futuro governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, declarou: "Nós atravessamos em termos internacionais uma fase de alguma desconfiança. Por força não da nossa situação, mas da situação de outros". Eu admitiria que se falasse num exagero de desconfiança e, mesmo assim, só pela carga simbólica das palavras de um responsável. Mas negar a existência de razões objectivas para essa desconfiança parece-me muito mau. Se vamos ter um governador em estado de negação a juntar a um PM também em negação, estamos fritos.

http://tv1.rtp.pt/noticias/?t=Carlos-Costa-admite-%93alguma-desconfianca-internacional%94.rtp&article=346784&visual=3&layout=10&tm=6

O elogio a Teixeira dos Santos (“estamos bem entregues”), de quem é amigo e que foi quem o convidou para o cargo parece-me também muito descabido. Um dos mais graves problemas de Constâncio foi a perda de independência do Banco de Portugal, cuja agenda e declarações passaram a estar sujeitas aos interesses do governo. Um novo governador que não percebe que o Banco precisa de se distanciar claramente do governo, começa mal.

Pode ter ouvido elogios à actuação do ministro das Finanças algures, mas não podemos esquecer duas coisas (para além das objecções já referidas): Teixeira do Santos conseguiu a notável proeza de ser “eleito” o pior ministro das Finanças da UE. O ministro tem também um inimigo implacável, que tudo fará para o impedir de fazer um bom trabalho: Sócrates.

sábado, 22 de maio de 2010

Estão loucos

As sondagens de hoje do Expresso são elucidativas sobre o divórcio entre o governo e o país. 79% dos inquiridos acha que o TGV deve ser adiado. Praticamente quatro quintos do país percebe o óbvio que o governo se recusa a interiorizar. Apenas 14,5% acham que deve continuar. Ou seja, parece que menos de metade do equivalente ao eleitorado do PS está de acordo com o governo.

Um governo que toma uma decisão duramente criticada pelos nossos melhores e esmagadoramente repudiada pelo eleitorado não está louco?

Mas parece que não estamos sós:

http://www.publico.pt/Economia/tgv-portugal-espanha-e-franca-vao-pedir-a-ue-prioridade-maxima_1438303

“TGV: Portugal, Espanha e França vão pedir à UE prioridade máxima”

Se a Alemanha não puser um travão nesta loucura colectiva, se a Alemanha não tomar consciência do bando de irresponsáveis que a acompanham no euro, vamos esbarrar muito proximamente “numa parede junto de si”.

Se na segunda-feira os investidores tiverem um ataque de pânico perante a pura incompetência destes governos, não se esqueçam de repetir a fábula dos “especuladores”.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Uma imprudência

A UE deu luz verde para a Estónia entrar no euro em 2011, num momento em que a própria sobrevivência do euro vem sendo crescentemente debatida. Parece-me que seria preferível estabilizar o euro com os actuais membros do que estar a aumentar as potenciais dificuldades futuras.

A Estónia tem apresentado contas públicas invejáveis, com superavits até 2007 e uma dívida pública minúscula, abaixo dos 10% do PIB! No entanto, o seu bom comportamento a nível dos preços é muito recente, com crescimentos salariais nos dois dígitos até 2008, muito acima do crescimento da produtividade. As suas contas externas revelaram défices elevadíssimos até 2008, passando para um superavit em 2009, com a dívida externa a subir de 77% em 2004 para 127% do PIB em 2009.

http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/european_economy/2010/pdf/ee-2010-3_en.pdf

Se há uma lição que a crise recente deveria ter ensinado é que não se deve olhar apenas para as contas públicas, é também imprescindível olhar para as contas externas. Se é verdade que a Estónia conseguiu bons resultados em algumas frentes, também é verdade que eles são demasiado recentes para se poderem considerar estruturais. Parece-me uma imprudência deixar a Estónia entrar neste momento, a não ser que seja mais uma fuga para a frente dos líderes europeus, que julgam que assim demonstram a sua confiança no projecto do euro.

António José Seguro

Só agora li a entrevista do Expresso a António José Seguro publicada no último sábado e gostei claramente. Está consciente dos problemas do afastamento da classe política da realidade, percebe que em Portugal “nos pusemos a jeito” para sofrer com a crise internacional: “O nosso crescimento económico é muito baixo e consumimos acima das nossas possibilidades.”

António Costa poderá ser mais inteligente e ter mais experiência, mas está completamente dentro do sistema (a sua prestação na Quadratura do Círculo é tão constrangedora que muitas vezes desligo a TV), não mostrando ter um décimo da liberdade de pensamento de António José Seguro. Este tem muitíssimo mais facilidade de dialogar do que Sócrates, uma qualidade importantíssima na actual crise.

As últimas palavras de Passos Coelho não se percebem (dizer que lança moção de censura se se concluir que Sócrates mentiu à AR), mas talvez tenhamos mais cedo do que o esperado uma contenda entre Passos Coelho e António José Seguro para o cargo de PM.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Portugal, protectorado

O meu artigo deste mês no Jornal de Negócios sobre os ganhos e perdas de passarmos da condição de país independente com um (muito) mau governo a um protectorado.

http://www.jornaldenegocios.pt/index.php?template=SHOWNEWS_OPINION&id=426317

Discordo

Martin Wolf publicou mais um artigo indispensável, do qual me permito discordar em parte.

http://www.ft.com/cms/s/0/58ebec36-62aa-11df-b1d1-00144feab49a.html

But the view that everything would now be fine had fiscal rules been followed is wrong. The private sector’s irresponsibility was the biggest failing.

Não cabe ao sector privado fazer a estabilização macroeconómica, coisa que aliás seria virtualmente impossível. É ao Estado que cabe essa função. Tendo em atenção o que é o comportamento do sector privado, cabe ao governo ter políticas públicas que contrariem tudo o que naqueles provoca desequilíbrios macroeconómicos. Se, por exemplo e como aconteceu em Portugal desde meados dos anos 90, a procura interna é demasiado elevada ao ponto de provocar um elevado défice externo, então é necessário intervir para corrigir esse desequilíbrio. Usando a política orçamental, poderá ser necessário um elevado superavit para contrariar o excesso de procura interna.

Há aqui o erro de pensar que as regras orçamentais são ter um défice inferior a 3% do PIB e uma dívida inferior a 60% do PIB. Como a Espanha inicialmente percebeu, a política orçamental deve estar ao serviço de estabilizar a economia e não de cumprir aqueles valores numéricos.

A preocupação pelas contas externas esteve aliás, desde sempre, nos Tratados Europeus:

No actual artigo 119º do Tratado de Lisboa (antigo artigo 4º do TCE-Tratado que instituiu a Comunidade Europeia), número 3 pode ler-se:

3. Essa acção dos Estados-Membros e da União implica a observância dos seguintes princípios orientadores: preços estáveis, finanças públicas e condições monetárias sólidas e balança de pagamentos sustentável. (meu negrito)

Como é evidente, países como Portugal e a Grécia mandaram às urtigas esta preocupação com uma “balança de pagamentos sustentável”. Se em vez de se preocuparem em respeitar os valores numéricos sobre as contas públicas (a Grécia nem isso), tivessem usado a política orçamental para contrariar desequilíbrios macroeconómicos, em particular o excesso de procura, que gerou as perdas de competitividade e dívidas externas galopantes, teríamos hoje um cenário muito diferente. Teríamos contas públicas muito mais saudáveis, mais competitividade, menos desequilíbrio externo, muito mais facilidade em sair da crise.

Uma decisão acertada

Acho extremamente louvável a decisão do BPI de sair do consórcio que financia o TGV Caia-Poceirão. É um sinal fortíssimo enviado aos seus concorrentes que é uma imprudência estar a dar o aval a grandes obras públicas de mais do que duvidosa utilidade e que podem causar graves danos ao sector bancário, como já tinha avisado aqui (2 Dez 2009), de que destaco:

Há banqueiros que aplaudem os projectos faraónicos de endividamento público (na expectativa de ganhar umas comissões de financiamento), esquecendo que este endividamento ajuda a que o cenário atrás descrito [de risco de falência da banca] se materialize, colocando os bancos em sério risco.

Já a decisão de Fernando Ulrich de apontar para as nossas dificuldades de financiamento foi interpretada como um tiro no pé por banqueiros no anonimato. Esta é uma escolha arriscada, embora Ulrich tenha falado mais sobre Portugal como um todo e não na banca em particular. Mas, apesar de tudo, acredito no discernimento de Ulrich, que deve ter sentido que só um balde de água gelada pode acabar com o autismo e negação em vive o governo e talvez mesmo alguns dos seus colegas banqueiros.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Socorro!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Na Europa o problema prioritário a resolver são as agências de rating:

http://www.jornaldenegocios.pt/index.php?template=SHOWNEWS&id=426155

Em Portugal, o ministro Vieira da Silva, em resposta aos avisos do presidente do BPI, “garante que nada mudou nos últimos dois anos, sublinhando que ‘Portugal sempre teve capacidade de se financiar’ ".

“nada mudou nos últimos dois anos” nas nossas condições de financiamento?????????????????????????????????????????????????????

Parece que estamos a fazer todas as asneiras possíveis para bater o mais depressa possível na parede!

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Mais uma vergonha

“Ao arrepio do discurso oficial traçado desde Maio desse ano, que insistia estar a cobrança fiscal "em linha com o previsto", a DGCI foi mensalmente assinalando uma degradação assinalável e chegou a estimar, a poucos dias das eleições legislativas de Setembro, uma quebra de 12,2 por cento face a 2008, quando o Governo ainda afirmava esperar uma queda de 9,1 por cento. Só em Novembro, o Governo admitiu o falhanço da previsão. O défice orçamental de 2009 acabaria por saltar para 9,3 por cento. O Ministério das Finanças não quis comentar. (…)”

“Tal como se pode ler nas suas actas - cujo acesso só foi possível com a intervenção da Comissão de Acesso dos Documentos Administrativos (CADA) -, o CAF reúne-se mensalmente e, desde o final de 2008, os dirigentes da DGCI traçaram um quadro de incumprimento sucessivo das metas.“ (meu negrito)

http://economia.publico.pt/Noticia/governo-congelou-valor-do-defice-de-2009-contra-as-previsoes-da-dgci_1437462

É preciso mais alguma coisa para nos horrorizarmos com quem nos (des)governa? Infelizmente, cheira-me que a procissão ainda nem saiu da igreja.

sábado, 15 de maio de 2010

Uma excelente notícia

Como objector de consciência fico muito contente com a notícia de que a Grécia e a Turquia podem reduzir as despesas de armamento com o pretexto da crise.

http://jornal.publico.pt/noticia/15-05-2010/crise-economica-pode-levar-grecia-e-turquia-a-enterrarem-o-machado-de-guerra-19406283.htm

Para além do contributo para a paz, este gesto ajuda a equilibrar as contas públicas e externas dos dois países.

Pedir desculpa

Francisco Assis afirmou: “No dia em eu pedir desculpa por alguma coisa é para me retirar da vida política”. Esta atitude face ao erro é muito má. Quando não se assume que o erro é um acontecimento natural, ainda que indesejável, da actividade humana, fica-se em maus lençóis.

Em vez de reconhecer rapidamente um erro, pedir desculpa por ele, emendar o que se pode e seguir em frente, entra-se me negação, mente-se descaradamente, faz-se o impossível para negar a existência do mais leve traço de erro. Para tentar tapar o erro inicial cometem-se novos erros. Torna-se impossível um debate intelectualmente honesto com uma pessoa que considera que um erro é algo tão horrível que obriga a um castigo definitivo até ao fim da vida.

Percebemos assim porque é que o PS ainda não pediu desculpa por coisa nenhuma, mas este problema é infelizmente mais genérico. São raríssimos os políticos que pedem desculpa, o que me surpreende porque tenho quase a certeza absoluta que uma atitude dessas seria altamente benvinda pela generalidade dos eleitores.

Quanto ao pedido de desculpas de Passos Coelho é perfeitamente enquadrável em alguém que pede desculpa por uma coisa que vai fazer conscientemente, mas que vai causar um sofrimento necessário.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Tipos de atitude face à crise

A) Os que ainda estão em negação ao ponto de dizerem que não se deve cortar despesa pública ou aumentar impostos porque isso afunda a economia. São pessoas que acham que não deviam existir mercados financeiros e agem como se eles não existissem.

Eles não percebem que não reduzir o défice faz aumentar as taxas de juro de tal maneira que afunda completamente a economia e faz disparar o desemprego.

Recusam-se terminantemente a lidar com a realidade.

São a esquerda radical, mas têm também economistas com responsabilidades, tais como (pasme-se!) o bastonário da Ordem dos Economistas, Murteira Nabo.

B) Reconhecem a existência do problema dos juros, mas consideram que o problema é europeu e não português e, por conseguinte, é a Europa (leia-se a Alemanha) que deve pagar a factura.

Ignoram os nossos problemas estruturais, alguns dos quais duram há mais de uma década: a perda de competitividade, o potencial de crescimento baixíssimo, o descontrole orçamental.

É como se Portugal tivesse tido o extremo azar de ser apanhado pelo turbilhão da crise sem que tivéssemos um átomo de responsabilidade nos problemas que nos atormentam.

Temos aqui muitas pessoas já não tão radicais, mas que têm uma enorme dificuldade em lidar com o conceito de “responsabilidade”.

C) Os que julgam que os nossos problemas são exclusivamente orçamentais. Estes já reconhecem parte da realidade, mas parecem ignorar a outra parte.

Com estes (Teixeira dos Santos, entre outros) corremos o sério risco de chegarmos a 2013 com o problema orçamental semi-resolvido, com um défice abaixo dos 3% do PIB, mas com todos os outros problemas intactos.

Considero este como um dos cenários mais frustrantes: chegarmos a 2013 com o problema das contas públicas aparentemente resolvido, mas com os mercados então a virarem-se para o problema da dívida externa. Portugal e os portugueses de rastos a julgarem que chegou o tempo de respirarem de alívio e os mercados a exigirem a resolução do problema do défice externo, que ficou esquecido durante quatro anos. Aí teremos os portugueses desesperados a julgarem que o tempo dos sacrifícios terminou e os mercados a exigirem novas e duríssimas medidas para resolver um problema que ficou esquecido.

Isto dito, duvido muito seriamente que os mercados esperem até 2013 para fazerem soar as campainhas de alarme sobre a nossa dívida externa, que está numa trajectória explosiva há quinze anos.

D) Os poucos (mas bons) que parecem compreender a seriedade do buraco em que estamos, incluindo praticamente todos os ex-ministros das Finanças que se reuniram recentemente com o PR.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Pacote insuficiente

Do que é conhecido do pacote, parece que ele é insuficiente. Em primeiro lugar é insuficiente no sentido de só prever medidas para 2010 e nada ser dito sobre o caminho até 2013. É evidente que o governo deveria apresentar o mais cedo possível um PEC revisto.

Aliás, um bom PEC, que corrija o recurso excessivo ao aumento de impostos no curto prazo até ajudaria a torná-lo aceitável imediatamente. O governo deveria aproveitar a boleia da urgência dos mercados e do elevado espírito de cooperação do PSD para fazer reformas sectoriais onde os problemas orçamentais são mais graves, como é o caso da educação. Se não se aproveitam os momentos excepcionais para reformar, quando é que se fazem reformas?

O pacote é também insuficiente porque continua focado nas contas públicas, ignorando as contas externas onde os problemas são muito superiores, embora os mercados ainda não pareçam inteiramente conscientes disso. Se o actual pacote pode ser demasiado focado nas contas públicas e no curto prazo, já o PEC revisto não o deverá fazer.

Resolver os problemas com inflação

O euro está a cair devido aos receios das repercussões das compras de dívida pública pelo BCE:

http://www.ft.com/cms/s/0/163f1c6a-5da4-11df-b4fc-00144feab49a.html

Por enquanto, com este segundo pacote o BCE vai comprar dívida pública de países da zona do euro, distorcendo os seus preços de mercado, mas esterilizando o efeito monetário destas compras. Ou seja, vai vender outros títulos em montantes equivalentes de modo que o seu objectivo para a base monetária (o agregado monetário que o BCE controla directamente) se mantenha.

No entanto, a prazo e com a eventualidade de serem necessários mais pacotes (necessidade de que o mercado desconfia crescentemente), esta esterilização pode parar ou passar a ser apenas parcial. Ou porque a esterilização total já não é possível ou porque já não é desejada.

O montante de compras de dívida pública pelo BCE pode tornar-se tão elevado que se torne quase impossível de ser completamente esterilizado. Ou, cenário talvez mais provável, já que estão a redefinir as regras do euro, os países aderentes podem decidir que um surto de inflação seria mesmo a forma mais conveniente (para os governos) de resolverem os problemas de contas públicas.

Com a esmagadora maioria da dívida pública a taxa fixa, um surto de inflação iria reduzir substancialmente o stock real de dívida. É evidente que o problema não desapareceria por encanto: haveria uma transferência forçada de poder de compra dos detentores de dívida pública para os Estados emissores. A Alemanha deveria ser o país que mais se oporia a uma saída do problema pela via da inflação, tendo aqui mais uma oportunidade e um pretexto para sair do euro.

Mas para quase todos os outros países isso seria talvez uma tentação demasiado forte para que lhe pudessem resistir.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Altamente recomendado

Mais um indispensável artigo de Martin Wolf, sobre as múltiplas reformas necessárias à sobrevivência do euro:

http://www.ft.com/cms/s/0/ebb8ec92-5d2a-11df-8373-00144feab49a.html

terça-feira, 11 de maio de 2010

Diferenças

A grandeza de Gordon Brown de se demitir de PM para facilitar uma coligação entre os trabalhistas e os liberais contrasta superlativamente com a pequenez de um PM de certo e determinado país que é o maior obstáculo à criação de condições de boa (sublinho boa) governabilidade num período dos mais difíceis.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Dupla batota

Afinal o pacote de salvamento do euro é baseado numa dupla batota. Por um lado invoca o artigo 122 do Tratado de Lisboa, sobre catástrofes naturais. Isto representa um abuso, que poderá ser contestado, mas é também uma atitude algo pragmática, que não me desgosta.

A segunda batota parece-me muito mais grave: usar este artigo para dispensar a unanimidade. O Reino Unido será a maior vítima deste estratagema, que recebe um “imposto europeu” sem ser ouvido. Logo os ingleses, amantes do “no tax without representation”. Logo nesta altura, em que estão com uma crise orçamental sem precedentes em tempo de paz.

Cheira-me que o pacote de salvação, que tanto entusiasmou os mercados antes de o perceberem verdadeiramente, se arrisca a ter um curto prazo de validade.

Algumas ideias via O Insurgente:

http://oinsurgente.org/2010/05/10/brincar-com-o-fogo-2/

Paliativos

Os mercados, com a sua propensão para a visão imediatista, receberam com euforia o pacote desvendado pela UE, BCE e FMI.

Mas, como bem salienta Wolfgang Münchau:

So this deal is going to be ineffective beyond the very short term, unless it is followed up by substantive reforms – the introduction of a single European bond, an agenda to co-ordinate economic reforms with specific relevance for the monetary union, policies to reduce economic imbalances, much tighter supervision of fiscal policies that kick in well before budgets have already been announced, and, in my view also a kernel of a fiscal union – in essence all the things over which the EU has been, and still is, in denial.

http://www.ft.com/cms/s/0/cdb9658a-5c0f-11df-95f9-00144feab49a.html

Concordo plenamente com a necessidade de reformas, embora não com o pacote exacto que Münchau propõe. Discordo da Eurobond (é interessante para aumentar a liquidez, mas não para resolver os problemas actuais) e tenho dificuldade em perceber a necessidade a união orçamental. Os problemas actuais não precisam dela, talvez os problemas futuras precisem, não sei.

Concordo plenamente com uma maior supervisão das políticas orçamentais, sobretudo na sua correlação com os desequilíbrios económicos. Portugal nunca deveria ter sido admitido na zona do euro só porque baixou o défice orçamental umas décimas abaixo dos 3% do PIB, quando esse défice coexistia com um défice externo brutal e crescente, resultante de um excesso de procura, fruto de uma política orçamental claramente laxista.

Ainda hoje os governos insistem que a contrapartida para os países terem acesso a fundos é aplicarem medidas de consolidação orçamental, ignorando “olimpicamente” a necessidade de diminuir os desequilíbrios externos.

domingo, 9 de maio de 2010

Cenas dos próximos capítulos

Na segunda-feira os mercados devem rir-se da promessa do governo de baixar o défice mais 1pp do PIB, depois de se ter comprometido com o louco contrato para o TGV no meio da fúria dos mercados. A prova de irresponsabilidade que o governo deu deve ser a machadada final na sua credibilidade e convencer finalmente os mercados que ninguém deve confiar neste governo.

As taxas de juro a dois anos (OTs) facilmente subirão acima dos 10%, reforçando a distância face à dos dez anos, apoiando-se na convicção de que o risco de bancarrota é de curto prazo.

Os bancos portugueses deverão ver-se excluídos do mercado monetário do euro, embora o facto de se terem constituído reservas de títulos descontáveis no BCE os deverá livrar de problemas de liquidez no curto prazo.

O governo que negou todo o tempo a gravidade da situação vai agora ter uma enorme dificuldade em convencer a população da inevitabilidade dos sacrifícios que aí vêm. É natural que a reacção de rua seja forte, embora não com os extremos de violência registados na Grécia.

Tenho dúvidas sobre a reacção dos líderes europeus, sobretudo se se sentirem gozados com o facto de Sócrates ter assinado o contrato do TGV à beira da catástrofe. É bem possível que esse facto impeça “a” Europa de accionar rapidamente o pacote que deve ser completado este fim-de-semana.

A bancarrota aproxima-se.

A corrupção faz parte da profissão de advogado?

A defesa de Rui Pedro Soares pretende que o testemunho de Paulo Penedos seja declarado nulo porque terá sido obtido com violação do sigilo profissional. É desde logo maravilhoso que não se argumente que o testemunho é falso, apenas que não pode ser utilizado.

Mas, pergunto eu, a corrupção faz parte da profissão de advogado? Os actos corruptos podem ser defendidos pelo sigilo profissional porque fazem parte da profissão de advogado? Todos os actos cometidos nas instalações onde se trabalha são actos profissionais? Um médico que viole uma doente no consultório está a exercer a sua profissão?

Este país está louco?

sábado, 8 de maio de 2010

Só agora

Parece que o PM terá sido mesmo confrontado com a ameaça de demissão de Teixeira dos Santos e que cedeu finalmente à necessidade de reavaliar os projectos faraónicos.

Também percebeu a necessidade de, pelo menos, traçar uma meta mais exigente para o défice deste ano (de 8,3% para 7,3% do PIB), embora a revisão do PEC não esteja sequer prometida.

Porque perdemos tanto tempo e dinheiro, não tendo sequer suspendido a assinatura da concessão do TGV?

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Mais umas explicações

A CE publicou hoje o seu relatório sobre contas públicas:

http://epp.eurostat.ec.europa.eu/cache/ITY_OFFPUB/KS-EK-10-001/EN/KS-EK-10-001-EN.PDF

A informação sobre défices e dívida pública já era conhecida, mas o relatório contêm também valores sobre a “situação líquida financeira” dos Estados. Não coincide exactamente com a situação patrimonial porque ignora (por falta de informação) os activos não financeiros. A evolução da situação líquida reflecte melhor a evolução das contas do Estado do que a dívida pública, porque esta pode ser “massajada” com privatizações. Uma privatização permite diminuir a dívida pública, mas não altera a situação líquida do Estado porque este perde também um activo. Mas se, pior, as receitas de privatização forem “espatifadas” em despesas correntes, há uma deterioração patrimonial do Estado que a dívida pública não incorpora.



Este quadro conta-nos histórias terríveis, mas também ajuda a esclarecer algumas dúvidas. Portugal ocupa o primeiro lugar ex-aequo com a Eslováquia, como os países que mais viram deteriorar a situação patrimonial do Estado. A Alemanha vem logo a seguir, fruto da pesada factura da reunificação.

A Grécia sofreu uma deterioração modesta da sua posição e a maioria dos países melhorou francamente a robustez das suas finanças públicas. Atente-se no notável esforço da Bélgica, que ajuda a explicar porque apesar da sua elevada dívida pública se tem mantido afastada dos holofotes.

Finalmente a coincidência de as melhores performances se registarem na Escandinávia, com a Noruega (que não pertence à UE) a bater todos os recordes, graças não só ao petróleo, mas à sua atitude em relação a este recurso finito.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Mais uma descida de rating

Nas suas previsões da Primavera, a Comissão Europeia (CE) não acredita no nosso PEC. Pior do que o cenário macro é a previsão para o défice público, que deverá descer muito pouco em 2011, ficando-se pelos 7,9% do PIB, contra os 6,6% PIB que constam do PEC. Não se pode dizer que a CE aprovou o nosso PEC e as agências de rating é que estão com má vontade porque o que estas previsões revelam é que a CE não acredita nem na retoma estimada pelo governo, nem no impacto orçamental das medidas propostas pelo governo.

Hoje foi também dia de a Moddy’s prometer equacionar uma nova descida do nosso rating a curto prazo, mas quem nos baixou já hoje o rating foi a CE.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Estranho jornalismo

O Público de hoje, p. 4, tem um estranho artigo: “Governo não gostou de ouvir Cavaco sobre obras públicas”, assinado por Nuno Simas.

“O primeiro-ministro, sabe o PÚBLICO, não gostou de ouvir o Presidente dizer, alto e bom som, ser favorável a uma reavaliação das grandes obras”. Ainda bem que o Público tem acesso às opiniões do PM, que este entende “soprar” cá para fora.

A primeira coisa que não percebo é na mesma notícia dizer-se que o próprio ministro das finanças está de acordo com o PR e valorizar-se mais a opinião de um PM que nem de engenharia sabe do que a opinião do ministro especialista no assunto. Convém esclarecer que dum lado temos o PM que não percebe nada de finanças públicas e do outro temos o actual e anteriores ministros das finanças e o PR, professor de economia, que se percebeu recentemente que ganhou o chamado “choque de titãs” com Constâncio sobre as contas externas. No meio disto, qual é a dificuldade em perceber de que lado está a razão?

Em segundo lugar, em termos hierárquicos quem tem direito a não gostar do que o outro pensa ou faz é o PR. É o PR que tem o poder de demitir o PM, se considerar que este está a ter um comportamento altamente nocivo para o país, como considero que é o que se passa actualmente. O PM parece o comandante de um navio em que o imediato avisa que há um iceberg em frente do navio, todos os oficiais superiores corroboram a informação e recomendam a mudança de rota e o comandante diz que não, que continuamos em frente e com os motores a toda a força.

Ou seja, manda a razão e a força que se secundarize a opinião do PM à opinião do PR, mas para este jornalista e os seus superiores hierárquicos nada disso interessa.

Uma folga?

Há finalmente um pacote de ajuda à Grécia. No entanto, não percebi o que acontece se a Grécia não conseguir a sua meta orçamental já deste ano? Deixa de haver novos fundos em 2011?

E qual atenção dada neste pacote à evolução das suas contas externas? Nas últimas previsões disponíveis (FMI, Abr-10) prevêem-se défices externos superiores a 7% do PIB até 2014, o que indicaria uma dívida externa sempre crescente.

Parece claro que os problemas gregos foram adiados e não resolvidos. Ou seja, a Grécia vai entrar em incumprimento, com os credores a serem forçados a perder parte dos juros e/ou capital.

Portugal arrisca-se assim a perder por duas vias: porque deverá ter que se financiar a uma taxa superior à que empresta à Grécia e porque a esta não deverá honrar os seus compromissos na totalidade.

Adenda

Nunca pensei que estas coisas fossem tão rápidas. Hoje mesmo soube-se que a Grécia contratou a Lazard, especialista em re-estruturação de dívida, isto é, em renegociação dos termos de dívida, o que equivale a um incumprimento dos termos originais.

http://www.ft.com/cms/s/0/0bd638fa-5780-11df-b010-00144feab49a.html

Oficialmente nega-se a re-estruturação, mas os analistas não falam de outra coisa:

http://www.zerohedge.com/article/greece-has-hired-lazard-restructuring-advice

sábado, 1 de maio de 2010

Bancarrota

Para evitarmos a bancarrota é condição necessária mas não suficiente estabilizarmos os rácios da dívida pública e dívida externa sobre o PIB. Pode não ser suficiente porque os mercados podem não gostar de esperar tanto tempo como o necessário para a estabilização e/ou podem não gostar do nível de dívida a que esta “estabiliza”. É importante lembrar que “estabiliza” em relação ao choque actual, mas se levar (como vai levar de certeza) outro choque, as condições de estabilização agravar-se-iam.

Já aqui falei sobre o optimismo heróico do nosso PEC, mas vou partir do princípio que, mesmo assim o que está lá previsto se concretiza. Assim sendo, a dívida pública estabilizaria em 90% do PIB em 2012. O valor é elevado, na fronteira do que conduz a baixos níveis de crescimento, mas poderá ser atingido dentro de dois anos, o que poderia sossegar os investidores. No entanto, como não considero que esta seja a restrição activa, nem vou perder mais tempo com as contas públicas.

O verdadeiro problema, o problema adormecido que deverá erguer-se com uma fúria mitológica, é a dívida externa. Segundo o PEC (implicitamente) a dívida externa deverá subir de 110% para 130% do PIB em 2013, sem o menor abrandamento no seu ritmo de crescimento. Ou seja, não só não se prevê uma estabilização desta dívida em percentagem do PIB, como nem sequer se prevê um abrandamento no seu ritmo de crescimento.

Imaginemos que o PEC era mesmo um bocadinho melhor e previa algum abrandamento da dívida externa, ao ponto de ela estabilizar em 200% do PIB alguns anos depois de 2013. Mesmo assim ficaríamos com um duplo problema: a dívida externa estabilizar a um nível muito elevado e estabilizar daqui a muito tempo. É altamente improvável que os mercados engolissem tal cenário.

Em resumo, ou uma nova versão do PEC prevê um forte ataque ao nosso défice externo, para além do défice público, ou o nosso futuro próximo é a bancarrota. Existe um cenário intermédio: vivermos de empréstimos dos nossos parceiros durante a próxima década, mas parece-me altamente improvável que eles estejam pelos ajustes.

Demissão de Teixeira dos Santos

Não sei se isto é um recado público:

http://economico.sapo.pt/noticias/dramatizacao-de-teixeira-dos-santos-desagrada-a-socrates_88444.html

O primeiro-ministro foi surpreendido na terça-feira com o teor do comunicado de Teixeira dos Santos no qual pedia, de forma explícita, o apoio do PSD para enfrentar a voragem dos mercados financeiros. O Diário Económico sabe que o primeiro-ministro depois de surpreendido ficou desagradado.

Sócrates não está em condições de continuar a ser PM de Portugal. Teixeira dos Santos devia ameaçar demitir-se se as grandes obras públicas não forem adiadas sine die. Se mesmo assim Sócrates não perceber e não ceder, Teixeira dos Santos deve demitir-se, mesmo que isso provoque um rombo no curto prazo na cotação da dívida pública portuguesa. Talvez esse seja o preço a pagar para o PM acorde para a gravidade da situação.

Sócrates iria enfrentar inúmeras recusas ao convite para ser seu ministro das Finanças, com todos a dizerem que recusavam, mas que se aceitassem colocariam como condição a suspensão imediata de todas as grandes obras públicas. Sócrates ficaria na mesma posição de Guterres a tentar substituir Pina Moura, acabando por conseguir in extremis um ministro dentro da nomenclatura do PS, com vaguíssimas credenciais nas Finanças.

Há evidentemente o risco de um ministro-capacho acelerar o desastre financeiro, que cada vez considero mais inevitável, se Sócrates mesmo assim não perceber nada.