terça-feira, 28 de julho de 2015

Saída da Alemanha

Agora que a saída da Grécia do euro passou a fazer praticamente parte do discurso oficial, parece útil referir uma alternativa que há vários anos é considerada a melhor forma de iniciar a desagregação do euro, nomeadamente a saída da Alemanha.

Uma primeira diferença é que a saída da Grécia seria provavelmente imposta pelas circunstâncias, podendo preceder uma sucessiva degradação da imagem da UE. Em contrapartida, a saída da Alemanha poderia ser encarada como uma iniciativa política, que reconhece que o euro foi um projecto bem-intencionado, mas cujos fracos resultados impõem um fim. Enquanto a saída da Grécia seria vista como um fracasso do projecto europeu, a saída da Alemanha seria a eliminação da mais grave fonte de perturbações da UE desde a sua criação, o euro, e a recuperação do seu objectivo essencial: a paz.

Porque é que a Alemanha poderá ter interesse em sair? Devido ao cansaço dos seus eleitores, que também já estão na zona da fadiga da contribuição, porque pagaram mais de duas décadas de reunificação alemã (e continuam a pagar) antes do início da crise do euro. Poderão preferir pagar um preço elevado de uma só vez, em vez de pagar uma factura interminável e geograficamente indefinida. Na verdade, com as taxas de juro actualmente muito baixas, o momento de saída não é apropriado, mas poderá sê-lo quando as taxas de juro dos periféricos subirem e colocarem em causa a sustentabilidade das suas dívidas.

A saída da Alemanha (provavelmente acompanhada por outros países do Norte) permitiria o respeito pelos actuais termos contratuais, em que estes países perderiam vultuosas quantias pela apreciação significativas das suas novas moedas nacionais, mas os contratos em euros manter-se-iam em euros na encurtada zona do euro, enquanto eram redenominados nos países que saíam. Esta redenominação não produziria qualquer problema nos contratos internos, mas seria mais problemática nos contratos entre várias nacionalidades.

Tem havido comentários equivocados de que a depreciação do euro face ao novo marco alemão geraria uma inflação descontrolada, o que não faz sentido, porque o euro tem-se depreciado já fortemente face ao dólar e isso pouco se reflectiu nos preços internos. Para além disso, o BCE manteria a sua meta de inflação, que só por extrema e não previsível incompetência não cumpriria. Trata-se de uma confusão entre uma desvalorização pontual, para corrigir um défice de competitividade, e uma desvalorização recorrente, devido a inflação elevada.

Àquele primeiro grupo de saída poderiam juntar-se, posteriormente, outros grupos, retirando-se de forma semelhante. Vamos simplificar e admitir que o segundo grupo era composto por todos os outros Estados do euro, com a excepção da Grécia e Chipre, que se manteriam no euro por pouco mais tempo, desaparecendo esta moeda de vez.


 [Publicado no Diário Económico]

Syriza e Portugal

A recente capitulação do Syriza vai condicionar fortemente o novo governo português, mas também deverá ser fonte de crises futuras

As eleições legislativas foram finalmente marcadas para o próximo dia 4 de Outubro, tendo Presidente da República manifestado uma clara preferência por um executivo apoiado por uma maioria absoluta, mas não enjeitando alternativas.

As sondagens têm estado relativamente estáveis, dando um empate técnico entre PS e a coligação PSD-CDS. A recente capitulação do Syriza, com o próprio Tsipras a dizer que não lhe explicaram nenhuma alternativa, poderá ter fortes consequências em Espanha, onde o Podemos já teve uma considerável queda nas intenções de voto desde o início do ano.

Em Portugal, como os novos partidos não tem revelado nenhum sucesso relevante, o impacto do fracasso do Syriza não deverá ser muito significativo, embora devesse ser desfavorável ao PS, que inexplicavelmente se colou ao sucesso inicial do novo governo grego, ainda que este tenha destruído o partido socialista irmão, o PASOK.

Parece ser razoável esperar que a nova AR tenha uma grande dificuldade em criar um governo de maioria absoluta. Tudo indica que quer o PS, quer a actual coligação fiquem longe de uma maioria absoluta. Por outro lado, o PSD-CDS não terá parceiros naturais com que se coligar e o PS apenas poderá coligar-se com o Livre e o partido de Marinho Pinto, ambos com resultados muito baixos nas sondagens, que muito dificilmente permitirão uma maioria absoluta à esquerda, dada a irredutibilidade do PCP e BE em participarem em qualquer tipo de executivo, ainda por cima num governo que terá que aplicar a tão odiada austeridade.

Para a criação de um governo de maioria absoluta restará a opção de um bloco central, para o qual o PSD e CDS parecem mais disponíveis do que o PS. Curiosamente, parece que o PS não quer uma grande coligação (com ou sem CDS), quer ganhe ou perca as eleições.

É provável que, no imediato, as eleições produzam um impasse. Por um lado, o PR deverá pressionar a criação dum bloco central, a que o PS resistirá ao máximo. Por outro, é possível que os partidos perdedores, vejam a sua liderança contestada ou que esta tome a iniciativa de sair, dificultando a formação de um novo governo por falta de protagonista com quem negociar.

Em relação ao programa e actuação do novo executivo, é evidente que a recente cedência em toda a linha do Syriza veio colocar grandes freios naquilo que vai ser possível fazer. Muitas das fantasias do PS nunca chegarão sequer a ser experimentadas. Mas também se teme que muitas das reformas, nomeadamente a do Estado, eternamente adiada, também não vejam a luz do dia.

O Syriza deverá condicionar o novo governo também de uma outra forma, na medida em que aceitou um acordo em que não acredita. É verdade que foram impostas condições brutais à Grécia, impossíveis de cumprir, mas a falta de convicção do executivo só irá dificultar as coisas.

Por isso, é natural que dentro de não muito tempo, o executivo helénico venha a ser nova fonte de perturbação da zona do euro e que o cenário de saída deste país volte a estar em cima da mesa. Sempre que isso ocorrer, as taxas de juro da dívida portuguesa devem sofrer, criando uma pressão adicional sobre o novo governo, sobretudo se também ele estiver a aplicar a austeridade a contragosto. Aliás, a atitude do nosso novo executivo será crucial para os mercados decidirem se estamos mais próximos da Grécia (não confiáveis) ou da Irlanda (confiáveis).

Qualquer crise grega tem condições de, em algum grau, se contagiar a Portugal. Curiosamente, na actual conjuntura, não acredito que um governo de bloco central seja mais estável do que um governo de maioria relativa que necessite de acordos parlamentares pontuais. Um bloco central minado por profundas desconfianças mútuas muito dificilmente acabará o seu mandato. Aliás, dados os resultados eleitorais que se antecipam instáveis e a continuação da crise do euro, o mais provável é que haja eleições antecipadas algum tempo depois.


 [Publicado no jornal“i”]

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Acordo arriscadíssimo

O acordo que a Grécia foi forçada a aceitar não tem condições de ser cumprido e deverá levar à saída deste país do euro

Terá sido no último minuto que se conseguiu um acordo com a Grécia, que evitasse que este país saísse do euro. A Alemanha defendia esta solução que, na actual conjuntura, parece ser a única forma de resolver definitivamente o problema daquele Estado.

A França, supostamente com mais visão, é que terá feito a proposta final, que permitiu o acordo. Julgo ser útil fazer um paralelismo com o que se passou com a criação do euro, para percebermos melhor o que aconteceu naquela reunião.

Com a queda do muro de Berlim, em 1989, estaria aberta a porta para a reunificação alemã. No entanto, Mitterrand temeu que o eixo franco-alemão, essencial na construção europeia, ficasse duplamente desequilibrado, quer em termos económicos, com a expansão territorial do vizinho, quer políticos, com uma Alemanha mais assertiva e segura de si própria. Como forma de conter o poder germânico, o presidente francês colocou a condição da abdicação do marco alemão, que seria substituído pela moeda única. Dada a fortíssima oposição do eleitorado alemão e do Bundesbank a ceder um elemento tão central da sua frágil identidade, o chanceler Kohl conseguiu obter de França quase tudo o que quis. O resultado final, que está à vista de todos, é que o euro, que foi criado para conter a Alemanha, acabou por ter o resultado exactamente oposto.

Na reunião da semana passada, Berlim queria a saída da Grécia do euro, mas Paris conseguiu travar isso, apresentando uma proposta que sabia que Berlim não podia recusar. Ou seja, em primeira aproximação, a França venceu ao impor a sua solução, mas, na verdade, os termos do acordo foram ditados pela Alemanha.

Aliás, este pacote pode mesmo acabar por conduzir à saída da Grécia. Em termos políticos, este acordo, é uma humilhação terrível, com a obrigação de acordar toda a legislação com as “Instituições” antes de as colocar em consulta pública ou apresentar ao parlamento. Para além disso, propõe-se também a criação inédita de um fundo com as receitas das privatizações, um sinal claríssimo da falta de confiança na liderança helénica.

Em termos económicos, deverá agravar quase todos os actuais problemas de recessão, desemprego e dívida pública sempre a crescer, sobretudo quando se requer que qualquer derrapagem nas metas orçamentais tenha que ser compensada com cortes de despesa “quase automáticos”. É certo que há um pacote envolvendo 35 mil milhões de euros, mas não é claro quanto dele são fundos já prometidos, reembrulhados de novo.

Apesar de o acordo referir explicitamente que não pode haver cortes nominais na dívida, já houve entretanto alguma abertura neste domínio, o que facilitará a participação do FMI.

O próprio primeiro-ministro Tsipras já afirmou que não acredita no acordo, o que não augura nada de bom. Aliás, mesmo que, por milagre, este programa chegasse ao fim, seria sempre necessário um quarto resgate, porque é impensável que dentro de três anos a dívida grega já seja sustentável e a Grécia se possa financiar nos mercados.

O sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) discordava de Karl Marx (1818-1883), quando este encarava como questão essencial a luta de classes. Para Weber, a relação mais conflituosa encontrava-se entre credores e devedores, ideia provavelmente agravada na perspectiva alemã, já que nesta língua a palavra que designa “dívida” (Schuld) também significa “culpa”.

Ora o euro criou uma montanha de credores e devedores, que jamais teria existido com as moedas nacionais. No caso português, o FMI teria sido chamado dez anos antes. O euro criou aliás uma combinação terrível: a possibilidade de desequilíbrios externos muito maiores e a perda de um instrumento essencial para a sua correcção: a desvalorização.

Por isso e devido ao gigantismo dos desequilíbrios acumulados, a Grécia deverá sair do euro mais cedo ou mais tarde, sobretudo a partir do momento em que essa hipótese passou a ser apresentada nas discussões oficiais.


[Publicado no jornal “i”]

terça-feira, 14 de julho de 2015

Grexit

Quando publiquei o meu livro O fim do euro em Portugal? (Actual, grupo Almedina), em Agosto de 2012, falava-se na saída da Grécia do euro, o que voltou a estar fortemente em cima da mesa, por muitas das razões que então referi.

Após voltar a enganar a UE, como já tinha feito antes da entrada no euro, a Grécia foi forçada a pedir ajuda em 2010, tendo-lhe sido negada re-estruturação da dívida quando ela tinha sido mais necessária. A maior parte dos fundos emprestados à Grécia foram directamente para os seus credores. É curioso como tantos contribuintes, entre os quais de Portugal, não tenham protestado quando lhes forem pedidos fundos que, na prática, se destinavam a salvar bancos alemães e franceses, libertando estes Estados de problema equivalentes ao que Espanha teve que enfrentar.

Hoje, a Grécia está quase há seis anos em crise, o desemprego estratosférico, o sistema partidário esmagado e com o surgimento dos demagogos do Syriza e o melhor que a zona do euro é capaz de fazer é pedir mais austeridade?

Os líderes europeus podem sentir-se muito orgulhosos de terem vergado o Syriza e o seu referendo ou muito contentes de terem obrigado ao cumprimento das regras, mas parecem totalmente inconscientes do desastre que estão a criar. Depois de mais este pacote de austeridade, a Grécia é um desastre à espera de acontecer.

É tão fácil perceber que o Syriza irá aceitar (se o fizer) as condições do terceiro resgate sob reserva mental e que dentro em breve se recusará a cumpri-lo. Os dois resgates anteriores, muito deficientemente aplicados, tiveram como principal problema o facto de não terem sido assumidos como seus pelos governos gregos. Se isto aconteceu com os dois primeiros, imagine-se com o do Syriza.

É facílimo que se criem condições para os bancos gregos voltarem a fechar e que ocorra o pior dos cenários: a saída caótica da Grécia do euro. As externalidades negativas dum tal evento seriam tão elevadas, quer económicas quer geopolíticas, que se justifica uma atitude mais benévola dos dirigentes europeus. Infelizmente, o Syriza fez tudo para dificultar as negociações e existem custos políticos muito elevados por parte dos credores. Mas, se não há condições para a permanência da Grécia, em condições minimamente favoráveis para o país, é preferível negociar a sua saída, do que permitir que se voltem a criar condições para uma retirada desordenada, essa sim, com elevadas probabilidades de contagiar muitos outros países.

É também certo que uma saída ordenada envolveria um perdão maior de dívida do que permanecendo do euro, porque com um dracma desvalorizado o nível de dívida sustentável seria bem menor. Mas a actual dívida grega é impagável, havendo apenas dúvida sobre quem vai anunciar isso: os credores (com perdão) ou o devedor (com incumprimento).

 [Publicado no Diário Económico]

sábado, 11 de julho de 2015

Riscos chineses

Os riscos com origem na China podem não estar iminentes, mas poderão manifestar-se a prazo.

Enquanto a Europa se vê a braços com os problemas na Grécia, na China a bolsa teve uma queda muito significativa, cujas implicações não estão ainda completamente esclarecidas, sobretudo tendo em conta que esta já é a segunda maior economia do mundo.

A primeira questão que se tem que reconhecer é que este país tem um modelo de crescimento sui generis e insustentável. Até à crise de 2008, as exportações eram um grande motor de crescimento, mas a desaceleração das economias avançadas diminuiu a sua importância, tendo havido uma muito substancial redução do superavit externo, de 10% para 3% do PIB. Faria mais sentido a eliminação completa deste excedente externo, porque ele só serve para acumular divisas e o que já foi acumulado até hoje é exagerado e só tem servido para comprar dívida pública americana. É um contra-senso que a China seja hoje um dos maiores fornecedores de capital aos EUA, a maior e mais capitalista economia do mundo. É verdade que uma parte ínfima destas reservas tem permitido aos investidores chineses fazerem compras muito significativas no exterior, como tem sido claramente o caso de Portugal, mas não se justifica um tão elevado montante de divisas.

Houve um reforço do peso do investimento, que já era excessivo, para 45% do PIB, um valor elevadíssimo, mesmo para uma economia que precisa de construir infra-estruturas, havendo aqui um forte elemento de construção imobiliária, surgindo cada vez mais notícias de cidades fantasma, com habitações de luxo que não são minimamente acessíveis ao cidadão comum.

O parente pobre do crescimento nesta economia continua a ser o consumo, que não chega aos 40% do PIB, quando o comum na generalidade das economias são valores da ordem dos 60%-70%.

O que é normal é que se invista para produzir bens de consumo, mas na China tem-se investido para produzir bens de investimento, o que é insustentável e irá requerer uma alteração profunda na estrutura da economia, o que não se consegue de forma rápida e será difícil de conseguir sem uma transição complicada. Se se chegar a uma situação, que se teme que esteja próxima, de um excesso de capacidade instalada, sobretudo no imobiliário, é natural que o investimento caia a pique, por já não ser possível manter os volumes do passado. Por outro lado, dado o peso exageradíssimo desta componente da procura interna, será muitíssimo mais difícil lidar com essa queda do que em outras paragens, embora a China ainda tenha uma margem monetária, que os EUA e a zona do euro já esgotaram.

Há um elemento que poderá minorar isto, que é o compromisso governamental recente de lançar um programa de investimento gigantesco em termos ambientais, em resposta aos elevadíssimos níveis de poluição atingidos, fazendo com que este país deixe de ser, tal como infelizmente os EUA, um dos principais opositores a medidas destinadas a prevenir as alterações climáticas.

De acordo com o FMI, a actual queda da bolsa chinesa não deverá produzir grandes consequências na economia chinesa, porque a bolha especulativa era muito recente (caiu para níveis de Março passado) e porque não tem a dimensão relativa das bolsas das economias avançadas.

No entanto, é necessário ter presente que existe o risco latente de perturbações na China e que uma desaceleração ou mesmo uma recessão aí podem ter consequências graves no resto do mundo, sobretudo se ocorrer num momento em que os instrumentos, orçamentais e monetários, de combate à recessão e à deflação estejam esticados até ao limite, como é o caso presente sobretudo na zona do euro.

A China é um grande importador de matérias-primas, beneficiando muitas economias emergentes. Por isso, um abrandamento do crescimento chinês terá impacto em quase todo o mundo, ao contrário da crise de 2008, que afectou sobretudo as economias avançadas, mas quase poupou as emergentes.


[Publicado no jornal “i”]

domingo, 5 de julho de 2015

E depois do referendo?

É difícil de acreditar que o referendo grego venha ajudar a encontrar uma solução duradoura

Em Agosto de 2012, publiquei o meu livro O fim do euro em Portugal? (Editora Actual, grupo Almedina), em que previa o colapso da moeda única até final desse ano. Desde Janeiro desse ano que tinha recebido a informação, por um jornalista, de que se preparava a saída da Grécia e acreditava que isso provocaria um efeito dominó que desintegraria o euro.

Nessa altura, havia duas teses que se digladiavam, a tese da perna gangrenada, defendida pelo ministro das Finanças alemão, que defendia que cortar a perna (a Grécia) curaria o resto do corpo, e a tese do dominó, que veio a ser escolhida por Angela Merkel no Outono daquele ano.

Em Abril de 2014, publiquei uma segunda edição do meu livro, actualizada e aumentada, em que a única coisa que tive que corrigir foi a data da previsão do fim do euro. Se o voltasse a rever hoje, as questões principais teriam a ver com actualização dos acontecimentos entretanto ocorridos e não as análises nele contidas.

Com as últimas piruetas do Syriza, chegámos outra vez muito próximo da saída da Grécia do euro, embora tenha que reconhecer que o risco do efeito dominó se materializar não me parece tão imediato como há três anos. No entanto, continuo a afirmar a vulnerabilidade estrutural do euro e a insuficiência das reformas que se têm vindo a realizar e a preparar, pelo que o risco de contágio a prazo permanece. Apesar de Portugal passar a ser o elo mais fraco após a eventual saída da Grécia, parece-me que os riscos maiores se concentram em países grandes, sobretudo em Itália. A questão crucial é que, se Portugal pode ser ajudado, a Itália é demasiado grande e um auxílio a este país tornar-se-á politica e financeiramente proibitiva.

Voltando à Grécia, as sondagens sobre o referendo dão um empate técnico, pelo que me parece útil considerar três cenários: 1) vitória do “sim” com eleições posteriores; 2) vitória do “sim” sem eleições; 3) vitória do “não”.

Caso haja eleições após a vitória do “sim”, é de admitir que os gregos desistam de votar em quem não percebeu as prioridades do eleitorado. É evidente que os eleitores querem acabar com a austeridade e permanecer no euro, mas é também claro que, para eles, o segundo objectivo é muito mais importante do que o primeiro.

Neste caso, haveria condição de acalmar a situação actual, que a irresonsabilidade do Syriza conseguiu criar no pico da estação do turismo, uma das maiores fontes de receita do país. Há notícias de paralisação de importações, devido à dificuldade de fazer pagamentos, que ameaçam parar a produção. Espera-se que, nesta hipótese, os parceiros europeus venham a ser mais generosos com os novos interlocutores helénicos, para evitar o ressurgimento do Syriza. Será sempre um caminho muito difícil e o FMI veio – finalmente – reconhecer que terá que incluir um perdão de dívida.

Alguns poderão pensar que haver vitória do “sim” e não haver eleições em seguida não fará sentido, mas o governo grego já foi tão contraditório, que mesmo isto parece possível. Seria uma combinação terrível, até porque poderia estar associada a uma maior intransigência dos parceiros europeus, prolongando-se os psicodramas diários.

No caso de vitória do “não”, o governo grego deve-se achar mais legitimado para prosseguir a sua política irrealista, de exigir mais do que os trunfos que tem na mão justificariam. Com o seu delírio negocial é mais do que provável a dificuldade de chegar a acordo.

Como os negociadores europeus não são robots, mas pessoas com as suas fraquezas humanas, é bem possível (ainda que altamente indesejável) que um desastre ocorresse e que a Grécia acabasse por sair do euro duma forma caótica.


Aliás, neste momento as coisas estão muito negras. É altamente improvável que os bancos possam abrir na próxima semana e a necessidade de criar uma moeda paralela ao euro pode tornar-se inevitável a curto prazo.