Os países que podem
usar política orçamental não querem e os que querem não podem
Esta quarta-feira teve lugar a primeira votação antecipada
para a presidência da Grécia, em que Stavros Dimas não conseguiu a maioria
qualificada necessária. A 29 de Dezembro terá lugar a terceira e última votação
que, se não for bem-sucedida, levará a eleições legislativas antecipadas já em
Janeiro.
As sondagens indicam que o Syriza, de extrema esquerda,
lidera as preferências do eleitorado, à frente do conservadores actualmente no
governo, em coligação com os socialistas. O discurso radical do Syriza tem
assustado os mercados, registando-se algum contágio a Portugal. Mesmo que este
partido modere os seus intentos quando chegar ao poder, tudo indica que, mesmo
assim, conseguirá introduzir alguma incerteza, até porque se nota nele um gosto
pela provocação.
Noutra frente, tem-se assistido a uma fortíssima queda do
preço do petróleo, o que poderia ser encarado como uma boa notícia.
Infelizmente, não é o caso. Em primeiro lugar, esta diminuição de preço é já
ela, em si mesma, em parte, sintoma da debilidade da economia mundial. Por
outro lado, porque ela vem reforçar, de forma poderosa, os já muito elevados
riscos de deflação nas principais economias desenvolvidas.
Há uma assimetria muito importante entre inflação elevada e
deflação (inflação negativa), quer em termos dos instrumentos de cura, quer em
termos de persistência, que me parece útil sublinhar e explicar.
Quando a inflação está elevada, os bancos centrais podem
subir as taxas de juro (sem haver nenhum limite superior) para a baixarem.
Quando estamos sob a ameaça de deflação os bancos centrais deveriam baixar as
taxas de juro, mas existe um limite inferior para isto, que é o zero, e a
generalidade dos bancos centrais dos países mais avançados já atingiram este
limite há muito tempo. Podem tentar as chamadas “medidas não convencionais”, de
“expansão quantitativa”, mas estas têm tido um impacto limitado.
Para além disso, no caso do BCE, há razoáveis dúvidas sobre
a legalidade de compra de dívida soberana, única forma de estas medidas terem
um impacto sensível. O BCE começou tardíssimo a tomar estas medidas, embora a
zona do euro seja aquela onde os riscos de deflação são maiores. Devido aos
referidos receios sobre essa legalidade, o BCE tem comprado apenas obrigações
privadas, num montante muito limitado (porque também não há muito mais
disponível), o que dificilmente poderá ajudar a combater, quer a deflação, quer
o abrandamento económico na zona do euro.
Mas a segunda assimetria entre inflação elevada e deflação é
ainda mais perigosa. Inflação elevada é, geralmente, sinónimo de excesso de
procura, que é corrigido pela subida das taxas de juro. Já a deflação é, também
em geral, sintoma de défice de procura, muito difícil de combater, como vimos,
e que se reforça a si própria. Quando se entra em ambiente de deflação há
tendência a adiar despesa, porque quanto mais tarde se comprar, mais baratos
são os bens. Por outro lado, as dívidas vão aumentando em termos reais, podendo
também isso fazer as famílias e empresas gastar menos, por se sentirem mais
pobres. Por isso é que a deflação é considerada uma armadilha, em que, uma vez
caídos, é muitíssimo difícil escapar.
Convém repetir que a recente descida dos preços do petróleo
acontece no momento em que já se registavam fortes riscos de deflação,
agravando um cenário já difícil, sobretudo na zona do euro.
É verdade que há um instrumento para escapar a isto, a
política orçamental, mas cuja utilização está fortemente limitada, não tanto
por razões económicas, mas ideológicas. Aliás, muito curiosamente, nos países
onde a política orçamental não está limitada por razões ideológicas,
nomeadamente na periferia da Europa, ela está fortemente restringida por razões
económicas. Os que podem não querem e os que querem não podem.
Quer nos EUA, quer na Alemanha, faria todo o sentido usar
pacotes orçamentais expansionistas, ainda por cima quando as taxas de juro
reais são nulas em termos reais (quase nulas no caso dos EUA).
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