Temos quase só um
trabalhador por cada pensionista, pelo que é impossível não mexer nas pensões
Quando falamos em rever as pensões a primeira coisa que
temos que olhar é para o número de trabalhadores cujas contribuições sustentam
os actuais pensionistas. Temos uma tendência, já com muitas décadas, de aumento
do número de reformados e, na última década, de diminuição do emprego. O
resultado conjugado destes dois efeitos tem sido um brutal estreitamento entre
aqueles dois números.
Neste momento, já só há mais 850 mil trabalhadores do que
pensionistas. Por cada reformado já só temos 1,2 trabalhadores. Com estes
números, com os problemas nas contas públicas (em que a maior rubrica são as
pensões) que enfrentamos e com a carga fiscal esmagadora, há uma conclusão
óbvia a retirar: é impossível não mexer nas pensões.
Façamos então um breve retrato das pensões em vigor. Temos
3,6 milhões de pensionistas, dos quais 40% não são pensões “normais”, mas sim
de invalidez, sobrevivência e outras. Esta percentagem parece-me excessivamente
elevada, mas não vou elaborar sobre isto.
As pensões “normais” têm uma distribuição pelos diferentes
escalões de rendimento com diferenças brutais entre o regime geral e o regime
público (CGA). No regime geral, 78,3% estão abaixo dos 500€ e uns impressionantes
93,8% estão abaixo dos 1000€. Já na CGA, estas percentagens são,
respectivamente, de 21,0% e 49,6%. Nas pensões mais elevadas a disparidade é
também drástica. No regime geral, apenas 0,8% aufere uma reforma acima dos
2500€, enquanto a CGA paga estes valores a 11,6% dos seus pensionistas. Em
resumo: enquanto no regime geral, apenas 21,7% dos trabalhadores recebe uma
pensão ACIMA dos 500€, no Estado, apenas 21,0% recebe ABAIXO dos 500€.
Logo me dirão que no Estado as qualificações estão muito
acima do que se verifica no privado. Isso é claramente verdade, mas também
existe a queixa eterna de que os trabalhadores mais qualificados do Estado
recebem muito menos do que no sector privado. Como é que isto é compatível com
esta disparidade flagrante nas pensões?
Por uma razão muito simples: porque as condições de reforma
no sector público foram sempre muitíssimo mais generosas do que no sector
privado. Até há não muito tempo, no sector público a primeira reforma era igual
ao último salário, o que, devido ao diferente tratamento fiscal, até se traduzia
num aumento do rendimento líquido. Soube-se até do caso híper-escandaloso de um
juiz que foi promovido para o Supremo Tribunal de Justiça, onde ficou apenas
três meses, apenas para se poder reformar com uma pensão mais elevada.
De tudo o que ficou dito até aqui parece concluir-se que há
duas alterações a introduzir nas pensões. Em primeiríssimo lugar, em todas as
pensões que não resultem da totalidade da carreira contributiva, sejam elas no
regime geral, ou na CGA. Em segundo lugar, dever-se-á criar um contributo que
seja função do nível da pensão, mas tendo em atenção a carreira contributiva.
Quem tem uma pensão que resulta do último vencimento deve
pagar a taxa máxima da nova contribuição de sustentabilidade. Nos casos em que
a reforma decorre de toda a carreira contributiva idealmente deveria pagar zero
desta taxa suplementar.
As reformas antecipadas, pedidas há muito, também deveriam
ser alinhadas com as actuais condições. Quem não teve nenhuma penalização
deverá ter agora a taxa máxima desta nova contribuição. Quem já teve a
penalização actualmente em vigor não deve ter que contribuir mais.
Para as pensões acima dos 2500€, que abrangem apenas 3,1%
dos pensionistas, dever-se-ia criar mesmo uma taxa extraordinária, temporária,
enquanto a taxa de desemprego permanecer acima dos 15%. As receitas desta taxa
extraordinária deveriam destinar-se exclusivamente a apoiar os desempregados de
longa duração que neste momento deixaram de receber qualquer tipo de ajuda
pública.
[publicado no i, a 15 Maio 2013]
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