O BCE tem um mandato muito estrito, a estabilidade de
preços, mas tem feito uma leitura excessivamente restritiva do seu papel. É
certo que não tem que se preocupar – explicitamente – com o pleno emprego, como
a Reserva Federal dos EUA, mas não poderia fazer mais pela retoma europeia?
Dado o enorme desfasamento da política monetária, não se
compreende o adiamento sucessivo da descida das taxas de juro de referência.
Para além daquilo que o BCE pode fazer directamente, há
também aquilo que poderia fazer em termos de aconselhamento aos actores
políticos, em dois planos, o conjuntural e o da arquitectura do euro. O euro
está em risco em ambos estes planos e não parece exagerado pedir ao BCE que
ajude a garantir as condições de sobrevivência da moeda da qual é emissor.
O clima recessivo que se vive na zona do euro tem todas as
condições para criar graves problemas nos países periféricos, que podem
desencadear um efeito dominó de consequências catastróficas. Os níveis elevados
e crescentes de desemprego arriscam-se a ter não só consequências económicas,
mas também políticas.
No plano conjuntural, o BCE poderia instar os países com
condições para isso, em particular a Alemanha, a adoptar políticas orçamentais
expansionistas, que poderiam melhorar as condições económicas em toda a área do
euro.
No plano da arquitectura do euro, esta moeda está longíssimo
de preencher os requisitos de uma área monetária óptima e, por isso mesmo,
corre sérios riscos de não sobreviver a prazo.
Neste plano, o BCE deveria ser um advogado muito mais
vigoroso da criação das condições de transformação do euro numa área monetária
óptima. Em particular deveria pugnar pela melhoria dos mercados de trabalho e
pela criação de um verdadeiro orçamento federal.
Em termos do mercado de trabalho, é necessária maior
flexibilidade dentro de cada país e uma maior mobilidade dentro do conjunto da
zona do euro.
Em termos de um verdadeiro orçamento federal, é necessário
caminhar, quer se queira quer não, para uma união de transferências.
Dir-me-ão que os pedidos que faço são irrealistas, ideia com
a qual concordo. Mas se o BCE colocar, de forma claríssima, em cima da mesa, as
condições de sobrevivência do euro e estas se revelarem totalmente
impraticáveis, então isso obriga a passar o debate para outro plano.
Se criar as condições de sucesso do euro é politicamente
impossível, então o seu fim é inevitável a prazo e devemos deixar-mo-nos de
“paninhos quentes” e passar a discutir as condições de desagregação ordenada do
euro.
Se o BCE confrontar os líderes políticos com as suas
responsabilidades ainda poderemos ter algumas surpresas positivas. De outro
modo, caminharemos inexoravelmente para a catástrofe final, desencadeando um tsunami financeiro de proporções
bíblicas, com gravíssimas consequências políticas, a nível da própria UE.
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