Há quem acredite que a
Alemanha pagará todos os custos do euro, mas neste país prefere-se “um fim com
horror a um horror sem fim”
No meio da crise do euro há quem acredite que, consciente da
gravidade das consequências da desagregação do euro, a classe política alemã
irá convencer o seu eleitorado a pagar tudo e mais um par de botas para
garantir a sobrevivência do euro. Será?
Estes crentes até se poderão basear na experiência passada
do chanceler Helmut Kohl, que praticamente conseguiu “impor” o euro aos seus
compatriotas que, desde o início, abominaram a ideia de prescindir do seu
querido “deutsche mark”, um dos pilares da sua frágil identidade do pós-guerra.
Esta ideia de que, no final, a Alemanha pagará todas as
contas tem alguns problemas graves. Em primeiro lugar, a classe política
germânica tem andado a enganar os seus eleitores sobre as facturas que os
esperam e aquelas que até já estão a pagar. O perdão encapotado da dívida grega
é um dos exemplos de factura actual escondida e várias outras ainda os aguardam.
Em segundo lugar, a táctica que tem sido usada nesta
camuflagem tem sido o adiamento sucessivo do reconhecimento dos problemas. Só
que este adiamento tem tido como consequência inevitável o agravamento brutal
das facturas a pagar.
Não estamos numa mera situação de compra de tempo, em que se
tenta criar a aceitação pelos eleitores alemães da necessidade de contribuir
para a estabilidade do euro e da Europa. Não se está apenas a adiar o confronto
com a realidade, porque o próprio adiamento está a agravar de forma muito
significativa a própria realidade com que se terão de confrontar no futuro.
Por isso, é altamente provável que estejamos a enveredar por
um caminho instável, com fortes probabilidades de ruptura. Uma factura elevada
mas limitada poderia ser digerível, mas uma factura cada vez maior e
descontrolada muito provavelmente deixará de ser tragável.
Existe, aliás, um ditado alemão que diz que “é melhor um fim
com horror a um horror sem fim”.
Há mais de vinte anos que os contribuintes da antiga RFA
estão a pagar a reunificação com a Alemanha de Leste e existe um enorme cansaço
em relação a isto, ainda que exista uma natural solidariedade e identificação
com os alemães de Leste, donde, não podemos esquecer, a chanceler Angela Merkel
é oriunda.
Mas temos visto, por toda a Europa, os mais variados
protestos de zonas ricas de certos países a não quererem mais subsidiar as
zonas mais pobres desses mesmos países. Em Espanha, a Catalunha tem-se
destacado nesses protestos. Se a solidariedade está a fraquejar dentro de
países que partilham séculos de história, como esperar que ela se mantenham
entre países com laços tão fracos, como é o caso da relação da Alemanha com a
generalidade dos Estados periféricos?
Para além de tudo isto, é preciso não esquecer que a
Alemanha não seria o único contribuinte líquido das facturas presentes e
futuras, havendo um conjunto de outros países, tais como a Holanda e a
Finlândia, que não têm – nem de longe – a consciência pesada pela II Guerra
Mundial como os alemães, pelo que não terão um incentivo tão a forte a pagar as
contas do euro. A Finlândia, em particular, é o único país escandinavo no euro
e só tem sofrido com isso.
Finalmente, é uma ilusão completa pensar que a crise do euro
se está a desenrolar de forma controlada e que há líderes europeus ou outros
que têm poder para domesticar esta realidade. O que se passou em Chipre tem que
ser encarado como um sinal preocupante da tremenda falta de preparação com que
a crise está a ser gerida. O prolongar da indefinição italiana também só pode
constituir motivo de inquietação. Por tudo isto, desenganem-se os que pensam
que o eleitorado alemão poderá ser domado por líderes políticos prescientes,
quando tudo estiver a arder.
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