quarta-feira, 28 de abril de 2010

Será desta?

Desde a última mexida no nosso rating pela S&P, que o governo apresentou um fraco orçamento, com um défice de 2009 muito estranhamente revisto em alta e um PEC também insuficiente, com graves lacunas no capítulo do “Crescimento”, um dos nossos maiores cancros. Para além disso, o PEC previa que a nossa dívida externa mantivesse a sua trajectória explosiva, sem abrandamento. Parece que os investidores na altura engoliram estes documentos.

Passado algum tempo, os investidores “caíram na real” e começaram a pedir taxas de juro cada vez mais elevadas para deter dívida pública portuguesa, em parte também por contágio dos problemas gregos. O que fez o governo? Deu explicações detalhadas sobre o estranho défice de 2009? Deu um impulso ao pacote de contenção orçamental em curso? Aprovou medidas adicionais, quanto mais não fosse para fazer face a perspectivas de despesas com juros mais elevados? Nada disso. Pôs-se aos berros. Imaginem lá que isso não tranquilizou os investidores…

A S&P foi agora acusada de ir atrás dos investidores e validar a desconfiança destes. É verdade que foi isso que fez, mas como poderia ter feito diferente? Se o governo não se disponibilizou para tranquilizar os mercados com medidas concretas, com que fundamentos é que a S&P poderia ir contra a avaliação dos investidores?

Por isso pergunto: será desta que o governo acorda para a necessidade de rever o PEC, com uma clara redução da meta orçamental para 2010?

Outra questão: a negação dos problemas que o governo tem exibido tem criado uma dissonância cognitiva na população, que se vai apercebendo de alguma coisa pela sua experiência quotidiana e pela comunicação social. Ao esconder a gravidade da situação e a urgência de medidas drásticas o governo está a criar um custo político adicional para a tomada de medidas. Se o governo adoptasse uma postura mais de crise, as pessoas perceberiam melhor e engoliriam melhor as medidas necessárias. Assim, teme-se que o governo e o país acabem por pagar uma factura mais elevada por tudo o que aí vem.

3 comentários:

Borges disse...

Caro PBT,
Concordo inteiramente com o post.
Parabéns pela lucidez com que tem analisado a nossa triste situação no seu excelente blog e nos artigos no negocios.pt.
Mas, para além das finanças públicas que têm de ser saneadas, como fazer o deleveraging do sector privado? Em Portugal a dívida privada representa 159% do PIB, a mais alta da zona euro (a Grega representa "apenas" 85%)- ver artigo de W. Munchau no FT de 26/04).
Não é isto resultado de anos e anos de privatizações de monopólios a empresários do regime sem capital (finaciados pela nossa banca em conluio com o Governo?). E de investimentos de privados com financiamentos / garantias públicas? Talvez seja altura de acabar com o nosso capitalismo de Estado, partir os monopólios e vendê-los a investidores internacionais. Adeus "centros de decisão nacional" (ie monpólios privados protegidos pelo regime).
Como empresário que sempre apostou no mercado externo, sou favorável a mais competitivdade no nossso mercado. Precisamos de apostar mais na produção de Bens (e serviços) Transaccionáveis. E de ter menos pressões dos monopólios que nos inflaccionam os factores de produção. E fazem concorrência na captação de recursos nacionais (humanos e financeiros).
Qual a sua opinião?

Anónimo disse...

dois comentários
a decisão da S&P não foi pelas razões que menciona, já que há um mês tinha reafirmado o rating
e perdemos uma oportunidade de ouro no tempo da dra Leite, que vendeu os dedos e não fez uma única reforma estrutural, que nos tinha ganho vários anos

Pedro Braz Teixeira disse...

Caro Borges, peço desculpa pelo atraso da resposta, que será muito sucinta.
Concordo plenamente com a necessidade de aumentar a concorrência em muito sectores não transaccionáveis, que aumentam os custos de produção dos restantes.
Quanto à dívida privada, uma parte significativa dela resulta do excesso de consumo e falta de poupança do Zé Povinho e não pode ser assacada aos "tubarões".