Mesmo com a informação incompleta conhecida até hoje, é
evidente que já há razões mais do que suficientes para levar os anteriores principais
responsáveis do GES e do BES a tribunal.
Entendo que seria muito benéfico para o interesse público
que houvesse uma acusação conjunta do Ministério Público, do Banco de Portugal
e da CMVM, por duas razões. Não sei se isto é inédito, mas parece evidente que
uma acusação conjunta daria muito mais força à acusação.
Em segundo lugar, permitiria uma acusação de superior
qualidade. O Ministério Público tem sobretudo competências jurídicas e o Banco
de Portugal tem uma capacidade elevada em termos económicos, financeiros e
contabilísticos, para além de um conhecimento especializado da legislação sobre
o sector financeiro. Por seu turno, a CMVM domina a legislação sobre protecção
dos investidores. A união destas competências conseguiria certamente formar uma
acusação de muito maior qualidade do que acusações separadas de cada uma destas
instituições.
Em termos económicos, os comportamentos do GES e do BES, em óbvio
conluio, criaram um grave problema de risco sistémico. Este tipo de risco pode,
com extrema facilidade, estender-se a todo o sistema bancário, razão pela qual
é designado de sistémico. Foi também por isso que o BPN não foi liquidado, como
merecia.
Por seu turno, o risco sistémico pode afectar milhões de
depositantes e pôr em risco o normal fluxo de crédito à economia. Isto poderia
colocar em causa não só a sobrevivência de, no mínimo, dezenas de milhares de
empregos, como provocar um rombo significativo nas contas públicas, criando
mesmo a possibilidade de um segundo resgate ao Estado português, com graves
consequências para todos. É impossível sobrevalorizar a gravidade dos
comportamentos dos dirigentes do GES/BES.
Em termos financeiros, mesmo com as medidas de contenção já
aplicadas pelo Banco de Portugal, são evidentes os estragos que as ilegalidades
cometidas no GES/BES já provocaram não só a nível nacional como mesmo no plano
internacional. O que aconteceria se as autoridades não tivessem parado esta
gestão antes do desastre final?
As manobras contabilísticas do GES/BES poderão ser
facilmente desmontadas pelo Banco de Portugal, pela forma como, sonegando
informação, prejudicaram gravemente terceiros.
Finalmente, a CMVM deve intervir no sentido de proteger, na
medida em que tal ainda seja possível, os outros accionistas do BES, das
extraordinárias perdas que têm sofrido.
Aparentemente, o GES deverá apresentar um plano de
restruturação a 29 de Julho. Não é possível ficarmos mais duas semanas a
assistir impávidos a esta catástrofe. O Banco de Portugal deverá forçar o GES a
apresentar rapidamente os traços gerais deste plano, para tentar aclamar os
mercados. Tudo indica este plano estabelecerá que o GES deixará de ter acções do
BES. É muito importante que isto fique definido antes da assembleia geral do
BES, a 31 de Julho, devendo o GES ficar inibido de votar nesta assembleia,
devido a todos os atropelos aos direitos dos outros accionistas que perpetrou.
Os restantes accionistas do BES foram altamente lesados por
tudo o que o GES fez e deveriam pedir uma indemnização significativa por isso.
É evidente que o GES não tem fundos para pagar essas indemnizações mas, pelo
menos, essas indemnizações fariam parte do conjunto das responsabilidades do
GES e poderiam ser parcialmente pagas. Os obrigacionistas do BES, que também estão
a ver o seu património derreter-se, também poderiam juntar-se à “festa”.
É muito provável que o novo accionista principal do BES
queira mesmo mudar o nome da instituição, para a colocar a salvo de todas as
terríveis notícias que se deverão seguir nos próximos meses, associadas ao nome
“Espírito Santo”.
[Publicado no Observador]
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