quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Fukushima orçamental

Há muita gente com a esperança que as eleições alemãs de 22 de Setembro venham abrir caminho para todas as soluções para a crise do euro. Sempre achei que, pelo contrário, a seguir a estas eleições assistiríamos a um recrudescer dos problemas. Afinal, parece que as questões se vão exacerbar já durante a campanha eleitoral.

O ministro das Finanças, Schäuble, veio avisar que a Grécia vai precisar de um terceiro resgate, o que deverá assustar ainda mais os eleitores alemães.

Steinbrück, líder do SPD, veio acusar Merkel de dizer que não temos uma união de transferências, embora, sendo ele, esta união já exista. Para todos aqueles que tinham a ilusão de que uma solução poderia vir do SPD, desenganem-se. Mesmo que venha a coligar-se com Merkel, o SPD nunca será a favor dos eurobonds ou de qualquer outra coisa que implique gastar dinheiro dos contribuintes germânicos.

Entretanto, Merkel veio dissuadir de se falar de um perdão parcial da dívida grega, porque isso iria assustar os investidores sobre as dívidas dos países periféricos. Na verdade, dado que a maior parte da dívida grega está nas mãos dos credores oficiais, quem a chanceler alemã tem medo de perturbar, é o seu eleitorado.
Com o nível estratosférico a que se encontra, mais de 150% do PIB, é praticamente inevitável haver um novo perdão da dívida pública grega. Merkel só está a tentar adiar ao máximo o momento em que se venha a reconhecer o incontornável.

Quando esse momento chegar, é bem possível que a Alemanha sofra um Fukushima orçamental. Quando se deu o acidente na central nuclear japonesa houve uma alteração radical na opinião pública alemã, que forçou o governo a mudar também a sua opinião sobre a energia nuclear.

No momento em que o eleitorado alemão perceber que os empréstimos que estão a ser concedidos aos países em dificuldades na zona do euro, afinal não são bem empréstimos, é muito possível que forcem a uma alteração radical do governo alemão (qualquer que ele seja) perante a crise do euro.

Esperemos bem que a próxima avaliação de Portugal pela troika, que tem tudo para correr mal, não seja a gota de água de um copo demasiado cheio. O livro que lancei há praticamente um ano, O fim do euro em Portugal? (Editora Actual, grupo Almedina), vaticinando o fim desta moeda no nosso país, mantêm-se bem actual, com a excepção da previsão de que aquele fim ocorreria até final de 2012. De resto, todas as fragilidades estruturais mantêm-se praticamente intactas e os problemas conjunturais têm-se alastrado.


Alemanha está num dilema terrível e vai sair-se mal, seja qual for o caminho que escolha. Se sair do euro, embora esse seja o cenário que menor prejuízo traria para todos, será acusada de matar o euro. Se continuar a recusar-se a aprovar as reformas essenciais para a sobrevivência do euro, também será acusada de levar ao fim do euro. Como é evidente, o colapso do euro trará não só consequências devastadoras em termos económicos (como detalho no meu livro), mas também graves impactos políticos, ameaçando a sobrevivência da UE.

[Publicado no Jornal de Negócios]

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