A responsabilidade dos
sindicatos na crise actual tem sido muito desvalorizada
A generalidade dos portugueses está muito zangada com a
maioria dos políticos e seus partidos, devido à responsabilidade que se lhes
atribui pelas dificuldades presentes. No entanto, há um outro grupo, dos
sindicalistas e sindicatos que, embora não partilhando um quinhão equivalente
nos problemas actuais, tem também responsabilidades não despiciendas na nossa
actual encruzilhada. Apesar disso, têm permanecido quase incólumes no
escrutínio público.
Como veremos, precisamos não apenas de reformar os partidos
políticos, mas também de transformações profundas nos sindicatos.
Entendo que os sindicatos, em particular os do sector
público, têm uma tripla responsabilidade pela crise, porque muitos dos
problemas actuais decorrem de cedências de diversos governos a reivindicações
sindicais.
A primeira responsabilidade, talvez a menor, por resultar
mais de cumplicidade do que de pressão, prende-se com o excessivo crescimento
do Estado em termos de pessoal. Os sindicatos ficaram muito contentes com a
expansão do emprego público, uma forma de aumentar o número de trabalhadores
sindicalizados, aumentando as receitas sindicais, não tendo tido a visão de
perceber que estender este número arriscar-se-ia a colocar um travão nas
regalias no sector público.
A segunda responsabilidade, esta claríssima, decorre de todo
o tipo de reivindicações a que forçaram sucessivos governos, não só sobre as
regalias dos trabalhadores do sector público, mas também dos seus reformados.
Parte da má vontade actual contra a Administração Pública deve ser assacada aos
sindicatos, que não perceberam que reivindicar aquilo que nunca poderia ser
estendido a toda a população iria trazer problemas aos funcionários públicos na
altura em que chegasse a factura.
A terceira responsabilidade prende-se com a despreocupação
com a criação das condições materiais para o cumprimento de promessas
governamentais, em particular a nível das pensões. Ao contrário das empresas
privadas, o Estado não fez contribuições para a Caixa Geral de Aposentações
(CGA), cuja saúde financeira poderia hoje ser muito melhor.
As contribuições da entidade patronal são hoje de 23,75% do
salário bruto nas empresas privadas, mas no caso do Estado esta contribuição
teria que ser muito superior, nunca inferior a 50%, para poder financiar um
sistema público muito mais generoso do que o privado.
Os sindicatos deveriam ter-se batido pela existência destas
contribuições, porque só elas é que poderiam garantir que as generosas
promessas para os reformados do sector público, feitas por diferentes governos,
seriam cumpridas.
É evidente que se estas contribuições tivessem existido,
nada teria tido a evolução que teve. Em primeiro lugar, o emprego público,
sobretudo nas autarquias, jamais poderia ter crescido tanto como cresceu. Para
além disso, os aumentos salários não poderiam ter sido tão fortes e não se
poderiam ter negociado tabelas remuneratórias tão generosas.
Em suma, se os sindicatos tivessem tido uma atitude mais
responsável e menos demagógica, não estaríamos hoje num buraco tão grande, como
é aquele em que nos encontramos.
Mas os problemas trazidos ou acrescidos pelos sindicatos não
se esgotam no plano das contas públicas. Eles estendem-se também à ética e à
meritocracia. Quando os sindicatos se opõem à menor sanção disciplinar, estão a
colocar-se do lado da minúscula minoria de maus trabalhadores. Quando se opõem
à meritocracia e a uma verdadeira avaliação, estão a promover um clima de
bandalheira, que cria incentivos perversos, que geram comportamentos
deploráveis, que desprestigiam a generalidade da função pública.
Se os partidos políticos precisam de uma varridela de alto a
baixo, os sindicatos também estão altamente necessitados de uma barrela
generalizada.
[Publicado no jornal i]
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