sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Liberdade na educação

É chocante como em Portugal a liberdade não é a primeira opção, mas o último dos recursos

Com mais de dois anos de atraso, o ministro da Educação veio finalmente propor a liberdade de escolha na educação. Espero que este princípio devolva aos pais a escolha da escola dos seus filhos, desde logo entre os vários estabelecimentos de ensino públicos.

O actual sistema burocrático nunca foi projectado para escolher a melhor escola para cada aluno, mas apenas para resolver os problemas e insuficiências da própria “burrocracia”. Para além disso, o actual método está profundamente corrompido, havendo alegados encarregados de educação de dezenas de crianças, pela mera razão de morarem perto de uma escola pública apetecível.

Em segundo lugar, a escolha deverá ser entre todas as escolas existentes. Nos primeiros tempos, por razões orçamentais, duvido muitíssimo que a escolha possa ser “livre”.

Há ainda outro tipo de liberdade de escolha, que duvido que esteja na mente do ministro, mas de que sou profundo adepto: a liberdade de escolher os programas e métodos de ensino. Em particular, até ao 9º ano, considero que a uniformização é uma ideia abominável e que deveriam florir mil tipos de escolas diferentes.
O lobby das corporações logo começou a estrebuchar, defendendo a “escola pública”, um objectivo estranhíssimo. Eu julgava que o que precisamos é de boas, óptimas escolas e que a sua propriedade é uma questão secundaríssima.

Para além disso, tem havido uma conversa sobre o verdadeiro custo do ensino público e sua comparação com o do ensino particular, com doses substanciais de desonestidade intelectual.

Julgo que esta discussão é, neste momento, perfeitamente ociosa, até porque não há margem orçamental para se começar em pleno com o sistema do cheque-escolar.

Teremos que começar com algo muito modesto, digamos, com 100€ por mês por aluno. No caso dos alunos no sector público não haverá desembolso de qualquer quantia e, no caso de escolha de outro tipo de escola, o ministério pagará os tais 100€ de mensalidade, ficando o restante a cargo da família. Aliás, estes 100€ deverão ser ainda descontados de qualquer tipo de apoio público existente, nomeadamente fiscal.
Este desconto de 100€ mensais poderá levar algumas famílias a optar pelo ensino particular, mas é altamente duvidoso que provoque uma revolução no sistema, que seria muito difícil de gerir.

Após a avaliação do impacto inicial, todos no terreno terão que se adaptar. Dentro do sector público é que as mudanças poderão ser mais significativas. Algumas das escolas públicas mais problemáticas poderão ver-se quase totalmente esvaziadas de alunos, que escolherão outras escolas públicas. Nestes casos, em que se instalou uma indisciplina e impunidade generalizadas, o melhor será mesmo fechá-las definitivamente.
Nos anos seguintes o cheque-ensino poderá ir subindo paulatinamente, mas de forma moderada. 

Imaginemos que no segundo ano passava para 150€ mensais. Isto deverá aumentar a factura orçamental por duas vias. Em primeiro lugar, como é óbvio, porque o cheque é maior. Mas, em segundo lugar, porque é provável que um cheque maior incentive mais famílias a aproveitá-lo. Por isso aumentos posteriores terão que ser bem ponderados e não é avisado qualquer governo comprometer-se a aumentar o cheque ensino em 50€ por ano ou com qualquer outra quantia.

Devo concluir avisando que os números que referi são meramente fictícios, não resultando de qualquer cálculo. Como se vê, pelo menos durante os próximos anos, é irrelevante saber se a escola pública custa mais do que a privada ou não.

Os protestos que esta proposta mereceu revelam uma falta de apreço pela liberdade, que me choca. Este é um tema sobre o qual gostava mesmo que houvesse uma sondagem. Era bom que, ou fosse restrita a quem tem filhos no ensino não superior ou que, pelo menos, desagregasse as respostas em função dos grupos: a) os que ainda não têm filhos; b) os que já os têm no ensino não superior; c) aqueles cujos filhos já não estudam ou não têm filhos.

Esperaria, mas não estou seguro, que o resultado deste inquérito mostrasse que os interesses corporativos da educação estão longíssimo do pensar e sentir da esmagadora maioria da população sobre este tema.

[Publicado no jornal i]

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