sexta-feira, 4 de março de 2022

Inventar desculpas para os maus resultados

Não é aceitável inventar desculpas para os problemas, em vez de propor soluções.

 

A economia portuguesa está estagnada há mais de duas décadas, mas a tomada de consciência deste problema tardou imenso, continuando a haver largos segmentos da população e do espectro político para quem isto não é – ainda – suficientemente claro.

 

Há quem imagine que a questão já está resolvida e, quanto a isso, saliento apenas dois factos recentes. Em primeiro lugar, as novas previsões da Comissão Europeia, divulgadas este mês, indicam que, entre os 27 países da UE, Portugal terá o terceiro pior crescimento acumulado entre 2019 e 2023, apenas ligeiramente menos mau do que o de Espanha e Itália.

 

Já esta semana, o instituto europeu Brueghel divulgou um estudo em que estima que Portugal possa vir a receber mais 11% de fundos para o PRR, pelas piores razões: por ser dos países com uma das maiores perdas acumuladas de PIB em 2020 e 2021. Não imagino como é que a propaganda irá disfarçar isto, porque é totalmente falso que seja qualquer tipo de prémio. Trata-se apenas de um apoio adicional, para auxiliar a recuperação da economia.

 

Se temos um grave – e antigo – problema de crescimento, é fácil deduzir que o PRR deveria ter como foco principal ajudar a solucioná-lo, mas não é nada disso que se passa. A versão portuguesa deste programa europeu não passa dum amontoado de programazitos sem qualquer visão estratégica. Nem sequer nas componentes digital e de alterações climáticas há uma visão integrada e de longo prazo.

 

Infelizmente, uma das estratégias para (não) encarar a nossa estagnação tem sido a sua negação. Em versão ainda pior, há quem se dedique a coleccionar desculpas para os nossos maus resultados. Como se, quando há problemas, o que se exigisse fosse encontrar umas justificações, como se isso nos dispensasse de os resolver.

 

Ficou em último lugar na corrida? É verdade, mas isso foi porque só treinou meia hora por dia; porque tinha trocado os ténis de corrida por umas sandálias de praia; porque se tinha esquecido de levar água; porque não ouviu o tiro de partida; etc., etc. Por isso, é muito natural ter ficado em último e não há nada a criticar porque temos aqui uma lista muito completa das razões desta classificação.

 

Um dos argumentos mais inaceitáveis para sermos ultrapassados pelos países de Leste é que eles tinham um sistema de ensino melhor do que o nosso no tempo do comunismo. A queda do muro de Berlim foi há 32 anos (!) e ainda continuamos a usar isso como desculpa? Mas isso não era mais do que sabido? Não percebemos que passaríamos a ter uma concorrência muito mais difícil? O que fizemos ao nosso sistema de ensino e de formação profissional?

 

É altamente escandaloso que o IEFP continue a ser um sorvedouro de milhões, de “formação” cujo único propósito é retirar desempregados das estatísticas. O PRR apenas dedica 8% à formação e, mesmo assim, mais de metade, para gastar em instalações. Queremos mesmo continuar a ter apenas desculpas para os resultados dos erros inacreditáveis que – ainda hoje – repetimos sem cessar?

 

[Publicado no Jornal Económico]

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