segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Governar contra o interesse nacional (4)

Temos sido tão mal governados, que não admira que estejamos a caminho de sermos a quinta economia mais pobre da UE, como detalhei aqui (páginas 16 a 19).

Podem ler aqui a primeira, a segunda e a terceira parte desta série, que pretende desfazer a grande ilusão de que, em Portugal, as medidas políticas têm racionalidade ou inspiração ideológica.

13. Leis mal feitas. As nossas leis são muito deficientes, sendo muitas vezes difíceis de interpretar, pela incompetência com que são feitas. Lembro de um caso em que a lei estava tão mal escrita, que era praticamente impossível de perceber qual era a interpretação que o legislador tinha em mente. O exemplo era tão flagrante que, pouco tempo depois da lei ser aprovada, o ministro que a tinha concebido foi confrontado por jornalistas, para que esclarecesse a questão. Em vez de reconhecer o erro e promover uma nova redacção da legislação, o ministro teve o topete de dizer que os tribunais é que deveriam decidir. O cúmulo do descaramento: não reconheceu a asneira, não a corrigiu e remeteu o disparate para os tribunais, que deveria achar que não estavam ainda suficientemente sobrecarregados.

Há um conjunto alargado de casos, de legislação económica, em especial fiscal, em que se percebe que o legislador não domina noções básicas de matemática e produz os maiores disparates.

14. Medidas ineficientes. Eficiência, em termos económicos, é definida como eficácia com o mínimo de custo. Despejar uma banheira com um balde é eficaz, consegue esvaziar a banheira, mas não é eficiente. A forma mais eficiente de o conseguir é destapar o ralo. Na justiça, parece que se está a tentar esvaziar a banheira com uma colher de café…

Quando estamos em presença de medidas eficazes mas não eficientes, demasiadas vezes não há oposição, porque parece que se está no caminho certo. Mas não é verdade, há outras medidas que seriam mais eficientes, mas que não são sequer tentadas, muitas vezes por pura ignorância e falta de inteligência dos “boys” que dominam a política nacional.

15. Privatização (mal pensada) de funções da administração pública. A transposição directa de mecanismos de gestão do sector privado para o sector público dá, demasiadas vezes, asneiras grossas, porque as condições são demasiado diferentes. No sector privado é comum as empresas subcontratarem alguns serviços, por boas razões, quando a especialização dos subcontratantes permite significativos ganhos de eficiência, e também por más razões, quando a subcontratação tem como principal objectivo não pagar regalias comuns na empresa e proletarizar os trabalhadores das empresas exteriores. Em qualquer dos casos, este mecanismo permite reduzir os custos das empresas e tem alguma lógica.

A transposição directa desta ideia para o sector público é, geralmente, fruto de falta de inteligência, ignorância e cobardia. Falta de inteligência, por não se perceber que as condições no sector público são muito diferentes. No sector privado, apesar de tudo, é possível o despedimento colectivo, que permite poupar recursos. No sector público, este despedimento, para além de ser legalmente muito difícil, é politicamente proibitivo, o que impede que se verifiquem poupanças. Ignorância, porque os empregados despedidos que vão para o desemprego criam custos de subsídios de desemprego que não são suportados pelas empresas, mas que são suportados pelo Estado. Ou seja, despedimentos no Estado (quase) não poupam encargos públicos. Cobardia, porque, em vez de se trabalhar para um aumento da eficiência da administração pública, há uma demissão dessa tarefa essencial.

[Publicado na Capital Magazine]

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