sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Governar contra o interesse nacional (2)


Continuo hoje a apresentar os tipos de erros que explicam porque estamos a caminhar para ocupar o lugar do país mais pobre da UE. Este destino não é inevitável, se tomarmos consciência destes erros e deixarmos de os cometer.

Gostava de sublinhar que estes tipos de erros não são mutuamente exclusivos, ou seja, há disparates que conseguem a proeza de preencher várias das asneiras elencadas.

4. Erro consciente, por corrupção. Há imensos casos em que os ministros sabem que estão a cometer uma grossa asneira, mas o fazem por corrupção. Aqui, não resisto a dar um exemplo concreto de um erro que até foi evitado: a escolha demencial de fazer o novo aeroporto de Lisboa na Ota, a pior localização possível, mas que obrigava a obras gigantescas, que deveria proporcionar “comissões” muito interessantes a quem o decidisse.

5. Definição absurda de prioridades. Os partidos não têm que ter todos as mesmas prioridades, seria até muito estranho que assim fosse. Dito isto, há claramente temas de primeira e temas de segunda e é claramente absurdo dar primazia ao segundo grupo. Os temas de primeira são os nossos problemas principais: a natalidade (um problema com quatro décadas, que ameaça a sustentabilidade da segurança social das próximas décadas), o crescimento económico (a estagnação que dura há quase vinte anos tem-nos empobrecido em termos relativos, impedido a subida do nível de vida e é o principal problema das nossas contas públicas); a habitação (escassíssima e com rendas incompatíveis com os nossos salários); a saúde (agravada com a decisão absurda, como já detalhei aqui, de se ter optado pelas 35 horas na administração pública, que não temos economia – e muito menos – finanças publicas para sustentar); a educação (temos a população menos qualificada da UE); os transportes (sobretudo os que usamos todos os dias); a pobreza (dispenso-me de justificar…); e alguns outros, que deixo ao leitor enunciar, para não me alongar mais.

Aqui vou ser muito concreto numa medida, em boa hora abortada, o TGV. Alguém me consegue explicar qual era o problema, grave e urgente, que o TGV ia ajudar a resolver? O TGV iria proporcionar viagens mais caras e mais demoradas para Madrid (para Barcelona nem se fala e para o resto da Europa seria uma piada) do que as actualmente disponíveis por avião. Como é possível que se tenha pensado em espatifar rios de dinheiro (que não tínhamos) numa medida, que era a última das últimas prioridades? Este projecto só tem uma explicação plausível: corrupção em escala gigantesca.

6. Remendos, que criam mais problemas do que os que resolvem. Uma abordagem muito típica, em Portugal, é começar com um péssimo diagnóstico, incapaz de identificar a origem da doença e fixar-se num ou noutro sintoma. Depois tomam-se umas medidas perfeitamente idiotas, que, como é óbvio, não resolvem a essência do problema, tendo a “vantagem” de criar imensos novos problemas, que tentarão ser resolvidos, com a mesma inépcia, com mais um conjunto de novas “soluções”, que tentarão chegar ao pódio do concurso das “mais estúpidas medidas imagináveis”.

7. Inconsistência dentro dum mesmo ministério. Quando um ministro (ou ministra) escolhe fazer obras sumptuárias em alguns edifícios do seu sector e, em simultâneo, deixa à beira da ruína algumas outras edificações, por sinal históricas, do mesmo sector, na mesmíssima cidade, isto é o quê? Ideologia não será certamente, incompetência e corrupção quase de certeza. Ninguém está a ver o exemplo em que me inspirei, pois não?

8. Condicionar ou silenciar a comunicação social. Quando um governo tenta, por todos os meios (mesmos os mais sujos), condicionar ou silenciar um órgão de comunicação social, isso é ideologia? Até pode ser, mas será então uma má ideologia e certamente contrária ao interesse nacional, que só pode ser servido pela transparência e pelo escrutínio aturado da acção governativa.

(continua, que este tema, em Portugal, tem pano para mangas)

[Publicado na CapitalMagazine]

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