As eleições
legislativas podem produzir um parlamento paralisado
As últimas sondagens apontam para um empate técnico entre as
duas principais forças políticas e os últimos desenvolvimentos não ajudam a
esclarecer este impasse. Em termos económicos, quer o desemprego quer o PIB
revelaram recentemente dados positivos, o que favorece o governo, que fica com
mais legitimidade em defender o caminho escolhido, pelo facto de este estar a
produzir alguns resultados.
Entretanto, o PS conseguiu envolver-se numa telenovela que
parecia interminável em relação aos cartazes de campanha (em que a coligação
também conseguiu mostrar as suas falhas), revelando um amadorismo estranhíssimo
naquele que é o segundo partido português mais antigo, a seguir ao PCP.
Isto reforça a suspeita de que os principais partidos
portugueses não constituem verdadeiras instituições, mas são antes um amontoado
de pessoas. Parece não existir uma estrutura fixa, com um mínimo de qualidade,
que vá acumulando competências com a experiência do passado. O que parece
existir é pessoas que vão sendo sucessivamente chamadas, mudando tudo com uma
nova liderança. Aliás, dada a animosidade que tipicamente rodeia as lutas pela
liderança e a ausência de um quadro de técnicos superiores fixo, o mais natural
é que todos os que estavam com o líder derrotado sejam afastados.
Lembro-me de Luís Filipe Menezes, ao ganhar a liderança do
PSD, em 2007, se ter queixado, com inteira razão, que o partido não tinha nada,
a não ser secretárias e motoristas. Temo que até hoje nada disto tenha mudado.
Esta falta de uma estrutura interna nos partidos é
claramente um dos responsáveis pela falta de qualidade do debate político, a
que acresce a crescente partidarização e desqualificação da administração
pública. Há um conjunto extremamente relevante de competências, jurídicas e
técnicas, que foram entretanto privatizadas, o que significa que os governos
têm cada vez menos acesso a aconselhamento de qualidade e imparcial.
Como é evidente, é absurdo sugerir que se legisle para
corrigir o problema de falta de estrutura dos partidos, já que teriam que ser
estes a aplicar esta mesma legislação.
Voltando à campanha eleitoral, é chocante como ela tem sido
ocupada por “casos”, havendo um silêncio ensurdecedor sobre os principais
problemas nacionais, tais como o baixo potencial de crescimento, a
insustentabilidade do actual Estado social, o desemprego, entre outros.
Passando aos resultados eleitorais, gostaria de fazer
algumas simulações, mantendo fixos os números de deputados para os menores
partidos. Assim, a CDU manteria os 16 deputados, próximo da sua média desde
1991. O BE perderia mais dois deputados, ficando com seis, enquanto o Livre e o
partido de Marinho Pinto teriam, no seu conjunto, apenas quatro deputados.
Sobrariam, assim, 204 lugares.
Se o PS tivesse 103 ou mais deputados, teria ganho as
eleições, devendo ser chamado a formar governo. No entanto, se tivesse 101
deputados, poder-se-ia colocar uma situação bicuda. O PSD/CDS poderia alegar
que, com 103 deputados, seria o vencedor. Mas o PS poderia contestar isso, por
ter o maior grupo parlamentar, e poderia mesmo conseguir uma coligação com os
novos partidos, o que perfaria 105 deputados. Já se o PS tivesse 100 ou menos
deputados (considerando as hipóteses desta simulação) teria perdido as eleições,
embora pudesse continuar a contestar isso.
Como vimos, e as sondagens reforçam essa ideia, podemos ter
uma AR particularmente confusa – e paralisada – nos próximos tempos. O
Presidente da República deverá ficar numa posição muito delicada, podendo pedir
um bloco central, mas que poderá ser recusada, sobretudo pelo PS, que, liderado
por António Costa, parece muito mais intransigente do que com Seguro.
Na verdade, aqueles que defendem um governo com maioria
absoluta no parlamento estão a iludir-se. Com um parlamento assim, o próximo
executivo será estruturalmente instável, quer tenha ou não apoio maioritário.
Resta saber se o próximo Presidente da República irá ajudar à festa da confusão
ou ser um elemento estabilizador.
[Publicado no jornal “i”]
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