sábado, 10 de janeiro de 2015

Saída da Grécia do euro

A saída da Grécia do euro conduziria, com elevada probabilidade, à saída de Portugal

As eleições legislativas na Grécia, a 25 deste mês, estão a elevar a probabilidade da saída deste país da zona do euro. Pode não ser imediatamente, até porque a incapacidade de formar um governo maioritário pode conduzir a novas eleições pouco tempo depois.

No entanto, haverá dois momentos críticos. Estima-se que em Março as reservas do país se esgotem, ignorando-se o que poderá acontecer em consequência disso. No Verão, é devida uma tranche ao BCE de 6,7 mil milhões de euros, os quais não se sabe de onde poderão surgir. Se não for pago, o BCE já ameaçou cortar o financiamento à banca grega, o que seria quase o equivalente à expulsão do país do euro. O líder do Syriza terá dito aos seus colaboradores mais próximos que considera esta ameaça um bluff e, qual jogador de póquer, tenciona testar o BCE.

Trata-se de um jogo arriscado, de parte a parte. Uma coisa é certa: ninguém vencerá. Se a Grécia for expulsa do euro por causa disto, a promessa do BCE de fazer tudo o que fosse necessário para salvar o euro ter-se-á revelado oca. A partir daí, é muito provável que se assista a uma subida imparável das taxas de juro de longo prazo dos Estados mais frágeis.

Portugal estará obviamente na primeira linha de fogo, devido à elevada fragilidade da sustentabilidade da nossa dívida, por três factores: 1) dívida demasiado elevada; 2) potencial de crescimento demasiado baixo; 3) excessiva dependência do financiamento externo.

Mas, na pior das hipóteses, Portugal seria forçado a solicitar um segundo pedido de ajuda à troika, com provável antecipação das eleições legislativas, como ocorreu em 2011. Diria que o novo memorando talvez não tivesse que ser tão duro em termos do défice público, mas seria certamente muito mais exigente em termos das reformas estruturais.

O mais grave de tudo seria o contágio a Itália que, ainda por cima, tem fragilidades semelhantes às nossas, com a excepção do financiamento externo, que não é tão elevado como a nosso em termos proporcionais, mais é muito significativo em termos absolutos, devido à dimensão desta economia.

Antes de prosseguir com Itália, voltemos à Grécia, que entretanto teria saído do euro. Uma das questões essenciais a esclarecer é se esta saída teria sido negociada ou forçada pelas circunstâncias. Há um mundo de diferença entre estas duas retiradas. Se houver negociações, muita coisa ficará esclarecida (desvalorização da nova moeda, redenominação de dívida e contratos, etc.) e será muito provável que um apoio significativo seja fornecido à Grécia, até porque ela estaria a ajudar o euro a tornar-se mais forte (na visão ilusória dos negociadores alemães).

Mas se tudo ocorrer devido a um conjunto de jogadas que correm mal, será o caos. Não só a desvalorização será muito maior (provavelmente superior a 50%) como descerá um nevoeiro de confusão e dúvida, que colocará gravíssimos entraves ao comércio externo, dificultando inclusive tirar partido de uma moeda muito mais fraca. Imaginem que os fornecedores das importações gregas, nomeadamente de energia, suspendem os fornecimentos devido à brutal incerteza sobre os pagamentos. Seria a total calamidade, com as próprias exportações bloqueadas pela falta de componentes importadas.

Perante esta catástrofe, poder-se-ia pensar que os italianos ficariam subitamente empenhados em aprovar todas as reformas que lhes permitissem mudar de vida e convencer os mercados da sustentabilidade da sua dívida. No entanto, mesmo que este milagre acontecesse, é altamente improvável que ele comovesse os mercados, até porque muitas das medidas demoram imenso tempo a produzir resultados.

A questão essencial é que, se Portugal e outros países pequenos podem ser ajudados, a Itália é demasiado grande para isso e a sua saída do euro seria inevitável, gerando um efeito de quebra de um dique. A única ressalva que se pode colocar é que estas retiradas poderiam ser fruto de acordos alcançados em tempo record, com todas as imperfeições que isso implicaria, mas muito menos graves do que o caos grego.


[Publicado no jornal “i”]

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