O mundo beneficiaria
se fossem tomadas opções políticas mais “femininas”
O planeta não precisa de mais “pessoas com sucesso”.
O planeta precisa desesperadamente de mais pacificadores,
curadores, restauradores, contadores de histórias
e amantes de todos os tipos.
Tenzin Gyatso, o 14º Dalai Lama
Uma das dimensões culturais identificada por Geert Hofstede
(1991, Cultures and organizations) é
a de género, não no sentido individual, mas na forma como ela é assumida pelos
países. Bem sei que esta ideia corre o risco de ser atacada por aqueles
(irrealistas) que imaginam que os papéis masculinos e femininos são pura
invenção social, ignorado a biologia e os impulsos das crianças, desde a mais
tenra idade.
A existência de papéis “naturais” masculinos e femininos não
implicam a classificação de patologia a qualquer tipo de distância desta
tendência natural. Aqui de novo teríamos os excessos relativistas, como se a
tolerância só pudesse existir se não houvesse um padrão “natural”. O que acaba
por ser paradoxal: é como se aqueles que são tolerantes num contexto
relativista, fossem obrigados a deixar de o ser se um padrão “natural” fosse
identificado pela ciência. É como se se sentissem forçados a distorcer a
realidade para que ela se conformasse com a sua ideologia.
Vamos aqui seguir a definição do eixo masculino-feminino,
tal como usado em Hofstede, que se reporta aos padrões das sociedades de
recolectores. É suposto os homens estarem preocupados com os sucessos fora de
casa (caçar e lutar nas sociedades tradicionais), o que faz deles assertivos,
competitivos e duros. Das mulheres espera-se que tomem conta da casa, das
crianças e das pessoas em geral, repetindo padrões ancestrais.
Os tipos de papéis desempenhados pelos pais deverão influenciar
os valores dos filhos e, assim, ter um impacto significativo nos sistemas de
valores nacionais.
Nos estudos realizados por aquele antropólogo holandês,
verificou-se que os valores das mulheres variam menos entre países do que os
dos homens.
Os resultados empíricos revelam uma ausência de relação
entre esta característica e o rendimento: encontramos países mais desenvolvidos
em ambos os extremos, quer entre os países mais “masculinos”, quer nos mais “femininos”.
Poder-se-á também dizer que os países escandinavos
apresentam o máximo de feminilidade, alguns dos países latinos registam de
forte a moderado feminino e os anglo-saxónicos são mais marcadamente masculinos.
Esta dimensão cultural tem claras implicações políticas, verificando-se
que as sociedades mais masculinas preferem o desempenho, enquanto as mais
femininas preferem o bem-estar.
Enquanto países mais masculinos preferem a recompensa dos
fortes, os mais femininos optam pela solidariedade com os fracos; enquanto os
primeiros escolhem o crescimento económico, os segundos valorizam mais a protecção
do ambiente; onde os valores masculinos prevalecem dá-se primazia à despesa em
defesa, onde dominam os valores femininos é a ajuda aos países pobres que
recebe mais atenção.
Os países “femininos” tendem a resolver os conflitos
internacionais através da negociação, enquanto os mais “masculinos” preferem o
uso das armas.
Parece, assim, evidente que o mundo beneficiaria de opções
políticas mais “femininas”, no sentido em que foram aqui faladas.
No entanto, como não se podem alterar de forma significativa
os valores dos diferentes países, talvez a forma de conseguir sociedades mais
femininas passe por duas vias. Em primeiro lugar, uma maior participação das
mulheres em lugares de responsabilidade, para o que talvez seja necessária a
promoção de alterações que facilitem isto (flexibilidade de horários e de
empregos a tempo parcial). Em segundo lugar, parece que se torna também
necessário que as mulheres que ocuparem essas posições de destaque o façam
assumindo com orgulho a sua feminilidade e não tentem imitar os modelos
masculinos.
[Publicado no jornal “i”]
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