quinta-feira, 1 de maio de 2014

O 25 de Abril e a economia

O 25 de Abril trouxe fortes perturbações à economia e agravou o choque petrolífero de 1973

O 25 de Abril de 1974 ocorreu num momento económico particularmente azarado. Em Agosto de 1971, o presidente dos EUA, Nixon, tinha declarado a fim da convertibilidade do dólar em ouro, colocando um ponto final no sistema monetário de Bretton Woods, criado em 1944. Quase três décadas de câmbios fixos chegavam ao fim, bem como a estabilidade que este sistema tinha trazido.

Mais grave do que isso, o choque petrolífero de Outubro de 1973 ajudou a pôr termo ao um “período de ouro” de crescimento, que seria seguido pela Grande Inflação dos anos 70. A redução do potencial de crescimento que se lhe seguiu, por toda a Europa, travou a forte emigração portuguesa dos anos 60, que tinha sido uma importante válvula de escape da nossa economia, bem como uma muito significativa fonte de rendimentos.

Pode-se tentar despejar sobre o choque petrolífero de 1973 muitos problemas de que a economia portuguesa veio a sofrer posteriormente, mas isso não é inteiramente honesto.

Um choque externo nunca é apenas um choque externo, já que temos sempre que considerar a resposta nacional. Só nos casos em que a reacção nacional tenha sido no sentido de o minimizar é que poderemos falar sobretudo num choque externo.

O que fizemos em relação àquele choque petrolífero foi no sentido de o minimizar? Não, pelo contrário, maximizámo-lo e isso foi consequência directa do 25 de Abril. Um país altamente importador de petróleo tem que responder a uma subida dos preços desta matéria-prima com uma desvalorização, uma redução dos salários reais e contracção da procura interna.

Como a política de “escudo forte” era um aspecto muito valorizado do Estado Novo, os governos do novo regime tiveram um enorme receio de desvalorizar, com medo de que surgissem saudades do anterior regime. Por isso, a desvalorização do escudo foi adiada da forma mais irresponsável possível.

Quanto aos salários reais, não só não desceram como subiram fortemente. Basta recordar a criação do salário mínimo, em 1974, que foi fixado a um nível tão estratosférico, que nunca voltou a ser igualado, em termos reais, até hoje, apesar dos significativos progressos económicos registados desde então.

Outra consequência economicamente devastadora da revolução dos cravos foi as nacionalizações, directas e indirectas, decididas em Março de 1975. Por mais que se critique os principais grupos económicos da altura, pelos benefícios decorrentes do “condicionamento industrial”, é impossível pretender que as empresas públicas decorrentes daquelas nacionalizações, mastodônticas e proverbialmente ineficientes, pudessem constituir uma alternativa ao dinamismo da iniciativa privada.

Aliás, as nacionalizações e perseguição aos dirigentes levou à fuga de Portugal de alguns dos nossos melhores quadros, uma “fuga de cérebros” grave num país com fortes debilidades na formação. O discurso anti-capital também gerou uma relevante fuga de capitais, que a legislação que a proibia não conseguiu impedir.

Por tudo isto, não é minimamente credível argumentar que o abrandamento da economia se deveu ao choque petrolífero e não ao 25 de Abril.

O fim da guerra colonial também trouxe um enorme “dividendo de paz”, já que as forças armadas consumiam 40% do orçamento. Esta folga terá permitido aumentar o Estado social, então muito incipiente.

A forma como a descolonização foi conduzida pelo MFA, a favor da URSS e não das populações das ex-colónias, gerou também um êxodo maciço de “retornados”, cuja integração foi um autêntico milagre, sem os conflitos que outros fenómenos semelhantes, mas muito menos expressivos, ocorreram em outros países, nomeadamente em França.

O rapto do 25 de Abril pelas forças pró-comunistas e anti-capitalistas gerou, em suma, gravíssimas consequências económicas, que constitui um fortíssimo exemplo negativo. O nosso cardápio completo, de todos os erros que não se devem cometer, ajudou enormemente Espanha a fazer uma transição democrática muito mais tranquila e muito menos perturbadora da economia.


[Publicado no jornal “i”]

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