Há muitas razões para
virmos a ter mais greves, mas uma delas tem sido esquecida: a descida da taxa
de desemprego.
Há várias razões para esperar um aumento da contestação
laboral e do seu caso limite, as greves.
Desde logo é importante distinguir entre o sector público e
o sector privado. No público, o problema principal reside no flagrante
contraste entre o discurso do fim da austeridade e a realidade da sua
continuação no terreno, sob a nova designação de “cativações”. Tivemos mesmo
este caso flagrante da manutenção da austeridade nos salários dos professores,
que a direita, em vez de sublinhar e usar isso como prova de que a austeridade
foi sempre necessária e nunca um capricho, desastrosamente tentou anular. Pode
dar agora todas as explicações, mas falhou politicamente em toda a linha.
A isto acrescentam-se dois factores. O primeiro é que,
contra tudo o que é recomendado, este governo distribuiu as benesses no início
do mandato e agora já não tem (quase) nada para oferecer. Em segundo lugar, a
economia europeia e portuguesa deverão ter, em 2019, o pior crescimento dos
últimos quatro anos, pelo que a margem orçamental é agora mínima.
No sector privado, as razões são diferentes. Em primeiro
lugar, a estagnação da produtividade nos últimos anos, a somar ao aumento de
impostos exigido pelo desgoverno herdado de Sócrates, tem conduzido a uma
estagnação salarial profunda, com excepção dos salários mais baixos, devido à
subida do salário mínimo. A substituição de impostos directos por indirectos
tem impedido de aumentar o poder de compra dos trabalhadores, que só
parcialmente estão a ser iludidos por esta estratégia do executivo de tirar com
uma mão o que dá com a outra.
Mas o que está a fazer a diferença é a redução da taxa de
desemprego para níveis da chamada “taxa natural de desemprego” (estimada entre
6% e 7% em Portugal). Isto significa que as empresas estão com dificuldade
crescente em conseguir mão-de-obra com as qualificações necessárias (não
necessariamente elevadas, apenas adequadas).
O resultado prático é que os trabalhadores estão agora na mó
de cima, com o máximo de poder negocial. É, assim, a coisa mais natural deste
mundo que aproveitem isso e lutem pelos aumentos salariais que não conseguiram
há, pelo menos, dez anos. Resta saber, sobretudo nos casos das empresas que
concorrem nos mercados internacionais, se haverá margem para acolher estas
reivindicações.
Em suma, por razões diferentes, quer no sector público quer
no privado, é de esperar uma forte agitação laboral, pelo menos até às eleições
legislativas.
Não devemos ficar surpreendidos pela emergência de novos
sindicatos e novas formas de luta, face à falência de centrais sindicais, cuja
agenda subjuga os interesses laborais aos partidários, servindo muito mal os
seus associados.
Isso deverá levar a rever uma lei da greve, totalmente
desactualizada das actuais condições do mercado de trabalho e a actual maioria
de esquerda está numa posição privilegiada para o fazer.
A direita escusa de espernear, porque isto é um caso típico
conhecido na ciência política como “Nixon vai à China”. Só um político
conservador como Nixon, com as mais altas credenciais anti-comunistas, poderia
estabelecer relações diplomáticas com a China, em 1972, sem suscitar críticas.
Em Portugal, também só a esquerda está em condições de rever a lei da greve.
Espera-se (sem grande esperança, diga-se) é que esta revisão tenha em atenção
as preocupações das empresas e dos consumidores e não apenas as preocupações do
actual governo com o sector público.
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