A Comissão Europeia
aparenta uma grande abertura de espírito para pensar a UE a prazo, mas isto não
parece um exercício genuíno, mas antes uma resposta tardia e ineficaz ao
Brexit.
A Comissão Europeia acaba de publicar “Livro Branco sobre o
futuro da Europa. Reflexões e cenários para a UE27 até 2025”, a propósito da
comemoração dos 60 anos do Tratado de Roma, que instituiu as Comunidades. Nele
se traçam cinco cenários de evolução possível, que não são exaustivos nem
mutuamente exclusivos: 1) Continuar como até aqui; 2) Nada para além do mercado
único; 3) Os que querem mais, fazem mais; 4) Fazer menos de forma mais
eficiente; 5) fazer muito mais juntos.
Antes de prosseguir, gostaria de apresentar a minha
avaliação da construção europeia até agora. Penso que a dado passo se gerou um
equívoco brutal, em que se esqueceu os dois verdadeiros objectivos da UE – a
paz e a contenção do poder da Alemanha – e se erigiu a integração como objectivo,
quando não passava de um instrumento.
Este equívoco conduziu, por um lado, a integração excessiva,
de que o euro é o exemplo mais claro já que, para além dos problemas
económicos, é um gigantesco erro político face aos dois objectivos essenciais
da UE (aumentou exponencialmente os conflitos e deu uma hegemonia brutal à
Alemanha). Por outro, criou integração forçada, feita a contragosto e gerando
muitos anticorpos, cuja consequência mais evidente é o Brexit, a resposta
britânica a um conjunto de abusos da UE. Aliás, este Livro Branco é claramente
uma resposta tardia e ineficaz à saída do Reino Unido, ainda hoje encarada como
uma heresia à doutrina oficial comunitária. Deve também acrescentar-se que é
muito duvidoso que os cenários apresentados espelhem uma genuína abertura de
espírito para discutir sem tabus o futuro da “Europa”, porque não se fala em
reformar para que isso faça os britânicos perderem a vontade de sair.
O cenário 1, de prosseguir como até aqui, parece-me ser de
descartar, porque a crise é tal que não faz qualquer sentido deixar tudo na
mesma. O cenário 5, de acelerar a integração, é de um irrealismo total e também
pode ser ignorado. O quarto, “Fazer menos de forma mais eficiente”, parece uma
abordagem tecnocrática pouco inspirada para um problema que é essencialmente
político.
O que me parece que seria mais promissor é um misto dos
cenários 2 e 3. Ou seja, tudo o que esteja para além do mercado único deveria
ser facultativo, com geometrias variáveis de acordo com os temas. Mesmo em
relação ao mercado único, julgo que se deveria colocar de lado a uniformização,
dada a crescente heterogeneidade da UE, e passar a haver escalões por nível de
rendimento. Parece-me absurdo que a Roménia e a Suécia tenham que respeitar os
mesmos padrões ambientais, entre outros.
Qual a probabilidade de um tal caminho ter futuro? Depende
muito do exame de consciência que as elites comunitárias estejam dispostas a
fazer e de até que ponto estão dispostas a abdicar de preconceito de que mais
integração é melhor. Não estou muito confiante, até porque – insisto – não me
parece que este exercício seja genuíno.
PS. O PCP e BE nunca se converteram verdadeiramente à
democracia e o seu apoio ao actual governo começa a apresentar os seus custos,
ao tentarem eliminar a existência de um órgão independente como o Conselho de
Finanças Públicas, que é, em última análise, um garante de que os governos não
estão a enganar os eleitores sobre os verdadeiros custos orçamentais das suas
opções políticas.
[Publicado no jornal online ECO]
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