Em economia, como em muitas outras áreas, não existem vias
únicas. Em relação ao documento “Uma década para Portugal”, apresentado por um
conjunto de economistas convidados pelo PS, parece que seria útil saber se
propõe uma via mais à esquerda ou uma outra via, em direcção ao abismo, como
foi aquela em que o país seguia em 2011, quando esse caminho foi interrompido
com o pedido de auxílio à troika.
Uma coisa é aquele programa prometer muitos mais estímulos
públicos, outra coisa é dizer que isso será conseguido sem qualquer problema
nas contas públicas, nem nas contas externas, antes pelo contrário, prevendo
que ambas melhorariam.
Pelo menos, temos que conceder que o PS elevou o debate
político, fazendo o que nenhum outro partido na oposição fez até hoje. Para
sermos coerentes com esta elevação faz todo o sentido que este cenário
macroeconómico seja avaliado por um organismo independente.
Sugeriu-se que seja o Conselho de Finanças Públicas (CFP) a
fazer esta avaliação, mas este ainda não teve uma posição clara sobre o
assunto. Esperamos que este organismo tenha uma visão lata do seu mandato e não
se refugie em nenhuma bizantinice legal, como é demasiado frequente.
Se for caso disso, que seja o próprio PS a propor a
alteração da lei que rege o CFP, para que este possa fazer esta avaliação e que
entre as suas atribuições se preveja chamar os autores do documento para
eventuais esclarecimentos.
O que está em causa é demasiado importante para ficarmos
pela chicana política ou pelos rodriguinhos administrativos.
A este propósito, recordo-me de um dos mais infelizes
debates do espaço público português. Antes das eleições de 2009, quando
Portugal preparava – com a maior irresponsabilidade – o seu caminho para o
abismo, um grupo de reputados economistas e académicos publicou um manifesto
contra as grandes obras públicas, cuja utilidade se vinha a revelar cada vez
mais duvidosa.
Logo em seguida, surgiu um segundo manifesto, recheado de
não economistas e adeptos da extrema-esquerda a defender o investimento público.
Pouco dias depois, um terceiro grupo, que se pode designar o manifesto dos
interesses, envolvendo pessoas directamente envolvidas nos negócios da
construção civil, a defender que o Estado deveria continuar a gastar dinheiro
naquilo em que eles ganhavam dinheiro.
O que chocou no meio disto tudo é que os três manifestos
foram assumidos como defendendo posições equivalentes, como se a opinião de
economistas sobre assuntos económicos fosse equivalente à de não economistas e
como se opinião de pessoas isentas devesse ser olhada com o mesmo peso com que
se olha para aqueles que estão demasiado interessados nos seus negócios para
poderem ser olhados como isentos. Faltou então uma visão independente e
esperemos que não falte agora.
[Publicado no DiárioEconómico]
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