A questão central no
caso BES, que vos proponho, é esta: preferem que haja custo zero para os
depositantes ou custo zero para os contribuintes?
O atraso na actuação dos reguladores no caso BES (mesmo
assim uma melhoria face ao caso BPN) trouxe avultados prejuízos ao próprio
banco e a um conjunto alargado de investidores, sem que isso tenha sequer
impedido a falência das holdings do GES. Não me vou agora debruçar sobre isto,
que dava um outro artigo, mas sobre a solução encontrada.
Julgo que é útil olhar para essa solução como resposta a um
problema com três objectivos e duas restrições. Os objectivos eram, por esta
ordem: 1) proteger os depositantes portugueses; 2) garantir a estabilidade
financeira; 3) minimizar o
custo para contribuintes. As restrições eram: a) respeitar o sentido da
legislação sobre união bancária, que deverá entrar em vigor em 2015; b) a incerteza
sobre extensão dos problemas, apesar de tudo o que já se sabe. Foi esta
incerteza que impediu o surgimento de investidores privados interessados, para
além de existir incerteza sobre a solução, devido a possível contestação
judicial dos accionistas.
Reconhecendo a impossibilidade de criar um solução sem
problemas, considero que a fórmula desenhada é razoavelmente positiva. A
questão central no caso BES, que vos proponho, é esta: preferem que haja custo
zero para os depositantes ou custo zero para os contribuintes?
Pessoalmente, prefiro – claramente – custo zero para os
depositantes. Para enquadrar a questão, é essencial ter presente que Portugal
apresenta um nível excepcionalmente elevado de dívida externa, o que nos coloca
numa posição de especial vulnerabilidade e dependência face ao financiamento
externo.
Se os depositantes em Portugal deixassem de estar
inteiramente seguros, isso provocaria uma desastrosa fuga de capitais, não só
do BES, mas de todos os outros bancos. Relembro a extrema sensibilidade com que
as cotações dos outros bancos têm reagido aos problemas no BES.
Uma fuga de capitais agravaria a nossa extrema dependência
do financiamento externo. É óbvio que isso provocaria uma subida das taxas de
juro da dívida portuguesa, agravando o défice público, para além de dificultar
o financiamento dos bancos portugueses, constituindo um forte travão à
recuperação económica e à criação de emprego. Seria uma catástrofe em cima de
uma calamidade. Tal como a solução foi desenhada, mesmo que acabe por haver
custos para os contribuintes, tudo indica que estes serão apenas uma fracção do
que custou o BPN, um banco muito mais pequeno.
Para aqueles que preferiam defender os contribuintes de toda
e qualquer perda, haveria ainda a possibilidade de dividir o Novo Banco em
dois. No Novíssimo Banco (banco bom) ficariam os depósitos até 100 mil euros,
enquanto no Novo Banco (banco assim-assim) permaneceriam os de montante
superior, mantendo-se o BES com o seu actual estatuto (banco mesmo mau).
Voltando à solução encontrada, convém considerar algumas
alternativas para se perceber que dificilmente se poderia fazer melhor. A
alternativa da falência não respeitaria o objectivo de minimizar o custo para os
contribuintes, porque teria que haver garantia dos depósitos até 100 mil euros
e o Fundo de Garantia de Depósitos só dispõe de 1 500 milhões euros,
manifestamente insuficiente para materializar aquela garantia, impondo pesados
custos aos contribuintes.
Tratar os pequenos accionistas de forma mais favorável iria
contra as condições do mecanismo de resolução e acarretaria perdas muitíssimo
superiores para os contribuintes, porque implicaria também um tratamento
preferencial para os obrigacionistas.
Apesar de tudo, julgo que o Banco de Portugal poderia ajudar
os pequenos accionistas a processarem a antiga administração por danos causados,
oferecendo-lhes toda a ajuda jurídica possível, bem como fornecendo-lhes o
máximo de provas para incriminar os administradores responsáveis por
comportamentos tão reprováveis.
Quanto às acusações de confisco, elas não fazem sentido,
porque os accionistas no BES são ainda donos do Novo Banco, no sentido em que têm
direito a qualquer eventual lucro que a sua venda proporcione, sem que tenham
participado com um único euro do capital necessário para que esse lucro seja
gerado.
[Publicado no jornal “i”]
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