Aumentar o salário
mínimo neste momento arrisca-se a agravar o desemprego, sobretudo entre as
mulheres
Ao contrário do que muitíssimas pessoas desejavam que fosse
verdade, os governos não podem determinar os salários na economia, que dependem
sobretudo da produtividade.
No caso do salário mínimo é preciso reconhecer que este tem
um impacto assimétrico no emprego. Se for definido muito abaixo da
produtividade dos trabalhadores com menor produtividade (os mais jovens, sem
experiência, e aqueles com menores qualificações), ele torna-se irrelevante
porque as empresas pagariam sempre salários acima do mínimo legal. Se for
legislado acima daquela produtividade, proíbe a contratação dos trabalhadores
em situação mais frágil, agravando o desemprego neste segmento.
Como os governos desprezam geralmente as leis económicas e
procuram a maior popularidade, o risco de decidirem salários mínimos demasiado
abaixo daquele limiar de produtividade é insignificante. Mas persiste o risco
de os governos tomarem decisões fantasiosas sobre o salário mínimo.
Até aqui há alguns anos, havia duas restrições muito
importantes que limitavam a demagogia na fixação do salário mínimo: a
necessidade de ter contas externas equilibradas e o facto de o salário mínimo
ser um importante indexante de prestações públicas, com fortes implicações
orçamentais. Infelizmente ambas as restrições foram destruídas entretanto,
permitindo a políticos irresponsáveis perpetrarem os maiores erros neste
domínio.
Antes da entrada no euro, subidas do salário mínimo acima do
crescimento da produtividade criavam graves problemas de competitividade, que
se traduziam em défices externos elevados, cuja correcção exigia uma forte
desvalorização, que diminuía os salários reais, eliminando os excessos
anteriores. Após a entrada no euro, por pura ignorância e irresponsabilidade
dos governantes e com a indesculpável conivência do governador do Banco de
Portugal, Vítor Constâncio, criou-se a ilusão de que os desequilíbrios externos
tinham deixado de ser importantes e destruiu-se a primeira restrição sobre os
aumentos do salário mínimo. Em 2007, antes da grave crise internacional,
Portugal apresentava um défice externo de 9,5% do PIB e uma dívida externa de 89%
do PIB. Estes valores indicavam um gravíssimo problema de competitividade, que
foi olimpicamente ignorado.
Em 2006, com a criação do Indexante dos Apoios Sociais
(IAS), o salário mínimo perdeu a sua importante função de indexante de um
conjunto muito variado de situações, em particular de prestações sociais pagas
pelo Estado.
Liberto desta segunda restrição, o governo da época pôde ser
extremamente generoso com o dinheiro dos outros. Dado que uma subida do salário
mínimo deixou de ter impacto nas contas públicas, isso deixou mãos livres ao
executivo para decretar substanciais aumentos desta remuneração básica.
Sublinhe-se que a subida extraordinária plurianual do
salário mínimo que foi negociada na altura aconteceu quando já havia sinais
extremamente preocupantes de falta de competitividade, que desaconselhavam em
absoluto esta medida.
Os resultados foram muito preocupantes, como não podia
deixar de ser: enquanto em 2005 a percentagem de pessoas a receber o salário
mínimo era de apenas 4,5%, ela foi subindo sucessivamente, encontrando-se nos
11,7% em Abril de 2013. Isto é grave porque indicia que se está a gerar
desemprego, sobretudo nas mulheres, já que nestas a percentagem a receber a
retribuição mínima é superior a 15%. Há mesmo um conjunto de actividades em que
mais de um quinto das trabalhadoras aufere o salário mínimo: indústria têxtil,
alimentar, da madeira e em vários serviços (restauração e imobiliária).
É extraordinário que ainda a troika não tenha saído e já estejamos a prepararmo-nos para repetir
todos os erros que nos forçaram a pedir auxílio externo. Parece que três quase
bancarrotas em menos de 40 anos é pouco e precisamos de começar, desde já, a
trabalhar para a próxima crise.
Esta ideia de subir, neste momento, o salário mínimo parece
ser mais um claro exemplo do ditado “de boas intenções está o inferno cheio”.
[Publicado no jornal “i”]
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