Seria uma total irresponsabilidade
o governo e o PS não apoiarem a negociação de um programa cautelar.
A execução orçamental de 2013 acabou por correr melhor do
que o esperado por todos, inclusive o governo, e os sinais consistentes de
recuperação económica estão a dar um novo alento ao executivo.
As sondagens sobre as eleições europeias de Maio poderão
ainda dar mais ânimo ao executivo, tendo em atenção os dados até agora
conhecidos. O BE parece estar a multiplicar-se, o que poderá enfraquecer o PS.
A demagogia de Marinho Pinto, tão do agrado do eleitorado português e a
principal responsável pelas três quase bancarrotas da 3ª República, poderá
também fazer mossa nesse partido, bem como nos da maioria. A questão central é
que, com a dose cavalar de austeridade e desemprego, o governo deveria ter um
resultado fraquíssimo, mas até as poderá ganhar. Temo que tudo isto faça o executivo,
mais uma vez, perder a cabeça e esquecer que o país precisa de um acordo entre
o governo e o PS.
A decisão irlandesa de não requerer um programa cautelar
após o programa de ajuda colocou um problema político ao governo português,
sobretudo porque a política em Portugal parece ser uma brincadeira de miúdos
mal-educados, que só estão interessados em fazer trapaça para ganharem no jogo
do berlinde, sendo a coisa mais afastada do interesse do país.
Se o PS estivesse interessado no interesse de Portugal e dos
portugueses, deveria estar do lado do governo e apresentar uma posição conjunta
face aos mercados no pós-troika. A
falta de acordo do PS, colocará o país numa situação muitíssimo mais frágil
para colocar emissões de obrigações no mercado, muitas das quais com prazos de
maturidade de dez anos. Qual é o investidor que colocará o seu dinheiro neste
país num tal prazo, sem o mínimo de garantias?
Em segundo lugar, o PS deveria estar caladíssimo em relação
ao programa cautelar, apoiar o governo nessa escolha e não vir com conversas
que este programa demonstraria um fracasso do governo. Portugal tem uma dívida
pública de 130% do PIB e uma dívida externa de mais de 110% do PIB. Ou seja,
quase toda a dívida pública portuguesa está na mão de investidores estrangeiros
e será arriscadíssimo manter-mo-nos dependentes destes investidores sem uma
rede de segurança.
Se a dívida pública estivesse sobretudo em mãos nacionais,
como é o caso da Irlanda e de Itália, os riscos seriam muito menores, porque dificilmente
os investidores nacionais a trocariam pela de outros países. No caso português
é completamente diferente: nenhum investidor estrangeiro precisa de comprar dívida
portuguesa se não quiser. Por isso, arriscar ir aos mercados sem um programa
cautelar é pura irresponsabilidade.
Para além disso, se Portugal tem uma dívida pública e
externa tão elevadas “deve-o”, essencialmente, aos governos do PS que estiveram
no poder quase todo o tempo entre 1995 e 2011. Se o PS é o principal
responsável pelas fragilidades nacionais que nos vão empurrar para um programa
cautelar, seria o cúmulo da desfaçatez vir acusar o governo de fracasso ao
recorrer a este “cinto de segurança”.
É preciso também recordar que, apesar de as taxas de juro de
longo prazo na zona do euro estarem em valores mínimos, nenhum dos problemas
estruturais do euro está resolvido. Por isso, é perfeitamente possível que,
poucos meses após a conclusão do programa inicial com a troika a crise do euro possa regressar “com uma vingança”. Tal como
estamos agora a beneficiar de condições extremamente favoráveis por factores
externos, também podemos vir a sofrer de um fenómeno oposto, mesmo que nos
estejamos a portar muito bem. Por isso, também, devemos recorrer a um programa
cautelar.
Há quem proteste contra o programa cautelar, porque isso
seria ficarmos mais tempo sob observação internacional. Mas, meus caros, é
evidente que vamos ficar sob o olhar do exterior, quanto mais não seja dos
investidores e das agências de rating.
Vamos ter que prosseguir a austeridade (que, no Estado, praticamente ainda não
começou), quer queiramos quer não. Ter um programa cautelar pode mesmo
emprestar credibilidade ao nosso compromisso e diminuir os custos de
financiamento, aliviando a própria austeridade.
[Publicado no jornal “i”]
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