quinta-feira, 25 de julho de 2013

Meses de alto risco

Temos enormes obstáculos pela frente: a reforma do Estado, a oitava e nona avaliações pela troika, as eleições autárquicas e o orçamento de Estado

Após o interregno das últimas semanas, não vamos voltar à normalidade, porque há imensos – e enormes – obstáculos nos próximos meses: a reforma do Estado, a oitava e nona avaliações pela troika, as eleições autárquicas e o orçamento de Estado.

Quanto à reforma do Estado, há fortes razoes para suspeitar que o trabalho realizado pelo governo seja manifestamente insuficiente. O adiamento sucessivo da apresentação de resultados e a ligeireza da demissão do ministro com a tutela desta matéria deixa-nos altamente apreensivos.

Por isso, a próxima avaliação pela troika (a oitava e a nona em simultâneo) tem todas as condições para correr ainda pior do que a sétima, cujas dificuldades e atrasos terão sido algumas das principais razões para a demissão de Vítor Gaspar.

Os resultados das autárquicas (de 29 de Setembro) devem ser péssimos para os partidos da maioria, não só por serem contaminados pela conjuntura económica, mas também pelas inúmeras trapalhadas em que as candidaturas têm estado envolvidas, continuando sem se saber quais serão sequer aceites. Por seu turno, estes maus resultados eleitorais têm todas as condições para exacerbarem os conflitos internos dentro do PSD e do CDS, agravando o estado de saúde da coligação, que já não é nada famoso.

Passando agora para o orçamento de Estado, que tem que ser apresentado até 15 de Outubro, o quadro é altamente complicado, sobretudo pela relutância do CDS em aceitar os elevados cortes exigidos pela troika. Há aqui uma terrível ironia. Uma profunda reforma do Estado, com claros efeitos de médio e longo prazo, ainda que tímidos no curto prazo, poderia constituir uma das mais fortes armas negociais do governo para conseguir uma suavização do ajustamento da consolidação orçamental. No entanto, tudo indica que o CDS, com o pelouro da reforma do Estado, produzirá a mais pífia das propostas, o que deverá constituir o principal obstáculo à aceitação das suas reivindicações orçamentais.

Para além disto, segundo os dados do 1º trimestre, Portugal tem a terceira maior dívida pública da UE (127,2% do PIB) atrás da Grécia, num destacadíssimo primeiro lugar (160,5%) e da Itália (130,2%).
Segundo as previsões da Comissão Europeia, de Maio, Portugal deveria chegar ao fim de 2014, com uma dívida de 124,3% do PIB, o que significa que só no primeiro trimestre deste ano já ultrapassámos a meta do próximo ano. Como a execução orçamental não está a correr bem, este cenário tem todas as condições para se agravar ao longo do ano.

Uma flexibilização das metas orçamentais trará, quase inevitavelmente, mais dívida pública. Ou seja, estão reunidas as condições para Portugal passar a ter, muito em breve, a segunda maior dívida pública da UE, apenas superada pela Grécia. Por isso, será cada vez mais difícil argumentar que Portugal não é a Grécia.
Por tudo isto, estou altamente apreensivo com o orçamento de 2014, que poderá ser mais um passo importante para nos aproximar da Grécia. Vejo duas hipóteses: ou o orçamento é credível e será dificílimo de ser aprovado, em particular pelo CDS; ou a proposta de orçamento é uma ficção. Neste segundo caso, os problemas políticos poderiam ser adiados, mas apenas no caso de a troika de engolir aquela ficção.
Não custa nada imaginar uma reedição da saída “irrevogável” de Paulo Portas por alturas da discussão do orçamento. Com a diferença que, então, o governo já não terá remendo possível.

Restar-nos-á ir para eleições antecipadas, provavelmente ganhas pelo PS, sem maioria absoluta, que não tem nenhuma alternativa, a não ser dizer “a Europa que pague!”. Seguirá fatalmente os passos do socialista Hollande, contrariando cada palavra que disser durante a campanha eleitoral.


Os tempos que vivemos têm todas as condições para destruir os partidos tradicionais, que não só nos trouxeram até aqui como não parecem fazer ideia nenhuma de como sair do buraco em que estamos. Haja quem aproveite a oportunidade para criar novos partidos…

[Publicado no jornal i]

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