A crise política que se vem desenrolando nas últimas semanas
tem fortes condições para aumentar a necessidade de um segundo resgate, que é
bem provável que envolva algum tipo de reestruturação da dívida pública, no
mínimo do tipo mais benigno, em que só se prolongam os prazos dos empréstimos.
Teme-se que a sucessivamente adiada reforma do Estado (e/ou
da despesa pública) se venha a revelar um fiasco, limitando a capacidade de
diminuir o défice público de forma sustentável nos próximos anos.
Mais cortes cegos e rápidos têm fortes condições de impedir
a continuação da tímida retoma económica em curso. Estamos perante um dilema
terrível: ou se concretizam reduções significativas na despesa, com claras
consequências recessivas, que agravarão a dívida pública (em percentagem do
PIB); ou se dilui o ajustamento orçamental, o que também piorará a trajectória
da dívida pública.
A segunda opção parece claramente preferível, em termos
sociais, mas está obviamente dependente do acordo dos nossos credores.
A dívida pública portuguesa está já em níveis praticamente
insustentáveis, não só por ser demasiado elevada, mas também porque Portugal
está em divergência estrutural desde cerca de uma década antes da chegada da troika. As medidas entretanto tomadas
apenas poderão ter um impacto extremamente limitado no nosso baixíssimo
potencial de crescimento.
Portugal deverá ser chamado a tomar decisões da maior
importância nos próximos tempos (um segundo resgate e reestruturação da dívida),
para as quais seria necessário dispor de um governo com uma clara legitimidade
e uma força anímica de que o actual executivo não dispõe.
O actual governo que, por força da confusa intervenção do
PR, não se sabe muito bem qual é (quem é ministro do quê? vai ficar ou está de
saída?), aparenta ser uma amálgama esboroada, incapaz de apresentar uma
proposta convicta de orçamento para 2014, para a qual já faltam menos de três
meses.
Neste contexto, pareceria preferível uma clarificação
política, através de eleições antecipadas, cujo custo deveria ser minimizado.
Como Pacheco Pereira muito bem sugeriu, seria preferível encurtar os prazos
oficiais e obter um acordo para os próximos meses, que seria muito mais fácil
de alcançar do que um acordo por doze meses.
Aliás, a ideia do PR de que nos livraremos da troika dentro de um ano está,
ironicamente, a ser posta em causa pela própria intervenção daquele órgão de
soberania, que criou a mais sui generis
das crises.
Aguardemos os próximos desenvolvimentos, não só internos,
como externos, em que se devem destacar as eleições legislativas alemãs de 22
de Setembro que, ao contrário do que a generalidade dos analistas pensa, julgo
que marcarão um agravamento da crise do euro. A partir daquela data é muito
provável que aquele eleitorado comece a ser confrontado com a quebra da
promessa de que a crise do euro nunca custaria nada aos contribuintes
germânicos. O pior nem sequer será a factura, mas antes o confronto com a
mentira.
[Publicado no Jornal de Negócios]
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