sexta-feira, 12 de julho de 2013

Reservas morais

Nesta crise, o CDS revelou possuir uma reserva moral muito superior aos outros partidos, que o valoriza

Ainda hoje não é claro o que se passou nos bastidores durante a semana passada mas, pelo que se conhece, parece evidente que o comportamento de Paulo Portas foi o mais irresponsável. Sendo uma pessoa fria e calculista (embora erre muito nos cálculos), a interpretação que parece mais razoável é que o líder do CDS quis sair do governo, em cujos resultados tinha uma baixíssima confiança (com inteira razão), lançando as culpas da sua saída sobre o primeiro-ministro, por uma má e não negociada escolha da nova ministra das Finanças. Concordo com a avaliação que Paulo Portas faz desta escolha, que descrevi aqui na semana passada como não sendo o “cúmulo da prudência”.

No entanto, a jogada, quase infantil, que tentou, saiu-lhe pela culatra. Portas é daquelas pessoas que se considera tão inteligente e esperto, que julga que os outros não passam de um bando de estúpidos e idiotas, que engoliriam o seu truquezeco.

Mas recebeu dois valentes baldes de água fria. Em primeiro, dos mercados financeiros, que ficaram aterrorizados com a forma como Portas saiu do governo e, num primeiro momento, praticamente desfizeram todo o trabalho e esforço dos últimos dois anos que o governo e os portugueses fizeram e sofreram. Como é que Paulo Portas não foi capaz de antecipar o brutal cartão vermelho com que os mercados assinalaram a sua “esperteza”?

O segundo balde de água fria veio do próprio CDS, que se mostrou –generalizadamente – indignado com o gesto do seu líder. Filipe Anacoreta Correia foi dos mais contundentes críticos desta decisão, que classificou como “irreflectida, incoerente e totalmente irresponsável”.

Paulo Portas, um dos políticos mais incoerentes e cata-ventos da actualidade, teve que engolir o caracter “irrevogável” da sua decisão de sair do governo, como há pouquíssimo tempo tinha ultrapassado a linha que dizia inultrapassável, no caso da “TSU dos reformados”.

É certo que Portas recebeu uma significativa compensação pela sua permanência no poder, mas se este resultado fosse o almejado, desde a primeira hora, ele não teria usado a palavra “irrevogável” na sua carta de demissão. Aliás, a quantidade e importância dos pelouros que recebeu parece indicar a falta de confiança do primeiro-ministro na capacidade do seu próprio governo. Se é verdade que estes pelouros são dos mais importantes, também é verdade que são aqueles onde a probabilidade de fracasso é maior. Dá ideia que Passos Coelho ofereceu ao seu parceiro de coligação um presente envenenadíssimo.

O verdadeiro tema deste artigo é a reserva moral de que o CDS mostrou dispor, a capacidade de reprovar – publicamente – a falta de ética do seu líder.

O PSD também tem mostrado uma elevada capacidade de criticar o líder em exercício, embora a motivação destas críticas raras vezes esteja relacionada com a preocupação de manter elevados padrões morais. A maioria dos ataques ao líder parece provir de facções menos consideradas nos cadernos eleitorais.
Ao contrário do CDS e do PSD, dentro do PS há um baixo nível de dissidência pública, mesmo quando alguns dirigentes demonstram sinais evidentes de falta de ética. Será que isto se pode explicar pela maior prevalência da maçonaria dentro do PS?


Infelizmente, ainda que a maçonaria defenda – teoricamente – elevados princípios éticos, parece que, na prática, perante comportamentos eticamente reprováveis, os maçons consideram mais importante defender os “irmãos” do que a ética. É curiosíssimo como a maçonaria repete os piores padrões da igreja católica, que tanto critica, ao colocar a defesa dos interesses dos “seus” acima dos princípios superiores que – alegadamente – a norteiam. Onde é que esteve a reserva moral do PS durante o consulado de Sócrates (2005-2011), um dos primeiros-ministros mais desprovidos de ética (já nem falo na competência…) da 3ª República?

[Publicado no jornal i]

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