Os actuais partidos e
a justiça andam a brincar com o fogo, ao não assumirem a necessidade de uma
forte luta contra a corrupção, estando a abrir caminho a partidos políticos
inimigos da democracia
Na semana passada, dei uma aula, como convidado, numa
universidade de Lisboa, que pretendia responder à seguinte pergunta: foi a
entrada no euro que nos trouxe a estagnação? Adianto já que a minha resposta é:
não, foi a péssima preparação que fizemos para entrar, em especial a partir de
1995.
Fiquei impressionado por duas perguntas que os alunos
fizeram. Um angolano mostrou-se chocado que um país com Portugal, com uma
história com tantas feitos dignos de registo, tivesse, hoje, uma atitude de
tanta subserviência face aos estrangeiros e que esperava que o nosso país fosse
capaz de dar muito mais ao mundo.
Mas a outra pergunta, dum aluno português, foi a mais
reveladora. Questionou-me ele que, dado que os actuais partidos eram tão
incompetentes a gerir a economia e tão corruptos, se a solução não estaria num
partido fascista.
Em primeiro lugar tenho que dizer que fiquei com a sensação
que a única pessoa na sala que ficou chocado com a pergunta fui eu, todos os
outros a encararam com naturalidade.
Em segundo lugar, é preciso registar que ele poderia ter
escolhido outras formulações, mais benignas: um partido “nacionalista”,
“patriota”, de “extrema-direita” ou outras, mas que não teve qualquer pejo em descrever
a alternativa como “fascista”.
Respondi-lhe que estava a fazer duas perguntas, e que as
responderia separadamente: 1) existem alternativas aos actuais partidos? 2) a
melhor alternativa é um partido fascista?
A resposta à primeira pergunta era claramente “sim” e até
havia muitos novos partidos que se perfilavam para concorrer às próximas
eleições legislativas.
Em relação à segunda pergunta, disse-lhe que, para ser
fascista, esse partido teria, no mínimo, de defender o nacionalismo e o
proteccionismo. Assim, deveria defender a saída do euro para recuperar a
soberania monetária e a saída da UE, para poder aplicar o proteccionismo. Ora,
um programa desses equivaleria a um Brexit elevado ao cubo, o que seria uma
calamidade económica, certamente o oposto do pretendido.
Como estávamos numa aula de economia, não me referi aos
aspectos políticos do fascismo. Antes de prosseguir, gostava de sublinhar que,
quer o nacionalismo (incluindo limites à imigração) quer o proteccionismo não
colidem com a democracia, sendo perfeitamente integráveis no debate
democrático. Pode-se concordar ou discordar destas ideias, mas elas não colocam
em causa a essência da democracia.
A característica política maior do fascismo é ser
anti-democrático. Provavelmente por ignorância, ele nem sequer defende o fim da
democracia, mas é sintomático que não tenha qualquer pejo em usar esta
designação.
Em conversa posterior com amigos, fiquei a saber que há cada
vez mais pessoas que defendem mesmo que se acabe com a democracia, para pôr o
país na ordem e acabar com a corrupção.
Não interessa aqui debater a ilusão destas pessoas (como se
o fascismo fosse um regime santo), mas antes tomar consciência de que o que se
passou na Andaluzia não está assim tão longe da realidade portuguesa.
Parece-me óbvio concluir que os actuais partidos e a nossa
justiça andam a brincar com o fogo, na forma displicente com que andam a tratar
a corrupção. Como nos revelou a anterior PGR, sem surpresa para os mais
atentos, não há uma estratégia nacional de combate à corrupção.
Estou firmemente convencido que a incompetência (e outras
características que a prudência me impede de explicitar) da justiça portuguesa
é altamente responsável pelo sentimento de impunidade dos nossos corruptos e de
que tivemos o décuplo de corrupção da que o teríamos tido se a nossa justiça
cumprisse o mínimo do mínimo dos mínimos.
Se continuarmos por este caminho, bem podemos ficar com a
democracia em risco.
[Publicado na CapitalMagazine]
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