segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Estes partidos e a justiça como coveiros da democracia


Os actuais partidos e a justiça andam a brincar com o fogo, ao não assumirem a necessidade de uma forte luta contra a corrupção, estando a abrir caminho a partidos políticos inimigos da democracia

Na semana passada, dei uma aula, como convidado, numa universidade de Lisboa, que pretendia responder à seguinte pergunta: foi a entrada no euro que nos trouxe a estagnação? Adianto já que a minha resposta é: não, foi a péssima preparação que fizemos para entrar, em especial a partir de 1995.

Fiquei impressionado por duas perguntas que os alunos fizeram. Um angolano mostrou-se chocado que um país com Portugal, com uma história com tantas feitos dignos de registo, tivesse, hoje, uma atitude de tanta subserviência face aos estrangeiros e que esperava que o nosso país fosse capaz de dar muito mais ao mundo.

Mas a outra pergunta, dum aluno português, foi a mais reveladora. Questionou-me ele que, dado que os actuais partidos eram tão incompetentes a gerir a economia e tão corruptos, se a solução não estaria num partido fascista.

Em primeiro lugar tenho que dizer que fiquei com a sensação que a única pessoa na sala que ficou chocado com a pergunta fui eu, todos os outros a encararam com naturalidade.

Em segundo lugar, é preciso registar que ele poderia ter escolhido outras formulações, mais benignas: um partido “nacionalista”, “patriota”, de “extrema-direita” ou outras, mas que não teve qualquer pejo em descrever a alternativa como “fascista”.

Respondi-lhe que estava a fazer duas perguntas, e que as responderia separadamente: 1) existem alternativas aos actuais partidos? 2) a melhor alternativa é um partido fascista?

A resposta à primeira pergunta era claramente “sim” e até havia muitos novos partidos que se perfilavam para concorrer às próximas eleições legislativas.

Em relação à segunda pergunta, disse-lhe que, para ser fascista, esse partido teria, no mínimo, de defender o nacionalismo e o proteccionismo. Assim, deveria defender a saída do euro para recuperar a soberania monetária e a saída da UE, para poder aplicar o proteccionismo. Ora, um programa desses equivaleria a um Brexit elevado ao cubo, o que seria uma calamidade económica, certamente o oposto do pretendido.

Como estávamos numa aula de economia, não me referi aos aspectos políticos do fascismo. Antes de prosseguir, gostava de sublinhar que, quer o nacionalismo (incluindo limites à imigração) quer o proteccionismo não colidem com a democracia, sendo perfeitamente integráveis no debate democrático. Pode-se concordar ou discordar destas ideias, mas elas não colocam em causa a essência da democracia.

A característica política maior do fascismo é ser anti-democrático. Provavelmente por ignorância, ele nem sequer defende o fim da democracia, mas é sintomático que não tenha qualquer pejo em usar esta designação.

Em conversa posterior com amigos, fiquei a saber que há cada vez mais pessoas que defendem mesmo que se acabe com a democracia, para pôr o país na ordem e acabar com a corrupção.

Não interessa aqui debater a ilusão destas pessoas (como se o fascismo fosse um regime santo), mas antes tomar consciência de que o que se passou na Andaluzia não está assim tão longe da realidade portuguesa.

Parece-me óbvio concluir que os actuais partidos e a nossa justiça andam a brincar com o fogo, na forma displicente com que andam a tratar a corrupção. Como nos revelou a anterior PGR, sem surpresa para os mais atentos, não há uma estratégia nacional de combate à corrupção.

Estou firmemente convencido que a incompetência (e outras características que a prudência me impede de explicitar) da justiça portuguesa é altamente responsável pelo sentimento de impunidade dos nossos corruptos e de que tivemos o décuplo de corrupção da que o teríamos tido se a nossa justiça cumprisse o mínimo do mínimo dos mínimos.

Se continuarmos por este caminho, bem podemos ficar com a democracia em risco.

[Publicado na CapitalMagazine]

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