Se, entre 2000 e 2017,
tivéssemos crescido como Espanha, o nosso PIB seria 22% maior do que é, o
emprego poderia não ter caído, poderíamos pagar menos impostos e poderíamos ter
evitado a “troika” e a dose cavalar de austeridade motivada pelos erros de
Sócrates.
Há, certamente, ainda muita ineficiência na despesa pública,
mas o problema maior das nossas contas públicas é a falta de crescimento
económico das últimas duas décadas. Entre 2000 e 2017, Portugal cresceu, em
termos acumulados, apenas 7,5%, enquanto Espanha cresceu 31,3% (dados AMECO,
ligeiramente diferentes dos do INE).
Se fizermos uma singela simulação, imaginando que Portugal
tinha tido o mesmo crescimento do que Espanha desde o ano 2000, concluímos que
a nossa dívida pública poderia estar num nível muito parecido com o do nosso
vizinho (97% do PIB em 2018); as taxas de juro seriam semelhantes; os impostos
poderiam ser mais baixos, sobretudo a nível dos combustíveis; a despesa pública
poderia ser um pouco maior, eliminando muitas das actuais restrições
(“cativações”, a nova designação da austeridade), em particular na saúde e nos
transportes, onde os seus efeitos são mais visíveis e sentidos pela
generalidade da população.
Para se ter uma ideia mais palpável desta simulação (com
todas as suas limitações), ela significaria que o PIB seria 43 mil milhões de
euros mais elevado (238 em vez de 195 mil milhões de euros em 2017), o que,
aplicando as actuais taxas de imposto, de contribuições e outras receitas
correntes (42,5% do PIB), geraria 18 mil milhões de euros de receitas públicas
adicionais (mais de 9% do actual PIB).
Isto seria uma margem muito ampla, que permitiria o
“milagre” de conseguir três objectivos, todos eles favoráveis: um défice
público menor, impostos mais baixos e aumentar o investimento público. Quando
se interrogam porque é que os impostos sobre os combustíveis são muito mais
baixos no nosso vizinho, a resposta é: porque Espanha cresceu e Portugal não.
Naquele período o emprego caiu 5%. Se o nosso PIB tivesse
crescido como o espanhol, esta queda poderia não ter ocorrido, tal como o
elevado surto de emigração, e, para além disso, o salário bruto médio poderia
ter subido cerca de 17%, fazendo que a massa salarial subisse 22%, em linha com
o crescimento do produto e da produtividade. O salário mínimo talvez não
estivesse muito longe do seu actual valor, mas abrangeria um número muito mais
reduzido de trabalhadores. Como os impostos seriam mais baixos, os salários
líquidos teriam subido mais do que 17%.
Se o nosso crescimento tivesse tido a qualidade do espanhol
(com défices externos limitados), também não teria sido necessário pedir ajuda
à “troika”, nem uma dose tão elevada de austeridade, altamente exponenciada
pelas asneiras e abusos que a justiça está a investigar sobre Sócrates. Aliás,
quase inevitavelmente, para termos crescido como Espanha, não poderíamos ter
tido um primeiro-ministro tão mau.
Espero bem que, com estes números, tomem – finalmente –
consciência de que o problema “número um” das finanças publicas é mesmo a falta
de crescimento económico e que é essencial tomar medidas para o resolver.
Não se diga que crescer tanto como Espanha é algo de
absurdamente ambicioso e quixotesco. Entre 2000 e 2018, o nosso vizinho cresceu
em média 1,6% ao ano, enquanto a média da UE foi de 1,4%. Crescer duas décimas
acima da média comunitária está longíssimo de constituir um grande desafio.
Aliás, crescer tanto como Espanha é o patamar mínimo de
exigência. Os países menos desenvolvidos da UE têm a obrigação de crescer mais
do que o pelotão da frente e, por isso, Portugal tem mesmo a obrigação de
crescer mais do que o nosso vizinho ibérico.
Uma versão deste texto
foi publicada inicialmente na “Nota de Conjuntura” de Novembro de 2018 do Forum para a
Competitividade.
[Publicado na CapitalMagazine]
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