Apesar da tentação de
listar todos os erros cometidos, o mais importante é procurar soluções, que,
evidentemente, têm que se basear num diagnóstico circunstanciado e correcto dos
problemas.
O que mais impressiona nos desastres de Pedrogão Grande e
Tancos é a lista interminável de falhas. Quase todas elas são inaceitáveis, mas
o que mais impressiona é tantas terem ocorrido em simultâneo.
Em relação a Pedrogão Grande, muito longe de uma lista
exaustiva, temos: um contrato do SIRESP que o Tribunal de Contas criticou, mas
não impediu de se concretizar; um contrato que prevê que o sistema de
comunicação de emergência possa não funcionar em situações… de emergência; um
chefe da protecção civil nomeado contra o parecer das chefias militares, mas
com fortes ligações ao PS (um “boy”); ausência de informação às populações em
áreas de risco sobre quais os comportamentos adequados em caso de incêndio;
etc.
No caso de Tancos, longe de esgotar o tema, temos: uma
denúncia detalhada (com números de telemóvel) de suspeitos feita à PJ em Abril,
que andou a passear entre várias “quintas” do Ministério Público, com dúvidas
sobre qual seria “territorialmente competente” (!), até as escutas solicitadas
serem barradas por um juiz; um sistema de videovigilância avariado há anos,
quando se assiste a vários atentados terroristas pela Europa; uma vedação
deficiente, cujo concurso de reparação foi publicado no Diário da República,
para todos os potenciais ladrões ficarem a saber detalhes sobre as suas
deficiências; etc.
Estes filmes de terror têm tudo a ver com uma enorme falta
de profissionalismo e de ética e muito pouco a ver com falta de meios. Só em
relação às Forças Armadas: quando é se adapta a sua estrutura ao fim da guerra
colonial?
O primeiro problema que se denota é que os governos têm
demasiada liberdade de acção, não havendo suficientes “pesos e contrafeios”
para impedir o seu abuso, nomeadamente a corrupção. Se o Tribunal de Contas até
detectou alguns problemas no contrato do SIRESP, porque é que não impediu a sua
assinatura? Se não tem poderes para isso, deve passar a tê-los.
Um segundo problema é o peso crescente dos “boys” na
administração pública, que degradam o funcionamento de tudo, quer pela sua
falta de competência, quer por afastarem o princípio da meritocracia,
desmotivando todos os restantes funcionários.
Para isto, sugiro a criação da Associação dos Funcionários
Públicos Decentes, que denuncie os mecanismos que permitem a contratação de
“boys” na administração pública e mesmo alguns dos casos mais flagrantes.
Lembro-me de me contarem um caso em que se lançou um concurso público para um
assessor de turismo, que apresentava como requisito… uma licenciatura em
Filosofia. Que esta Associação denuncie também toda a falta de cumprimento de
preceitos básicos.
Ao ritmo com que têm saído notícias escandalosas sobre estes
casos, é natural que ainda venha a lume muita informação que possa levar a
propor outras soluções para a actual degradação do Estado, pelo que este artigo
deverá ter sequelas.
Portugal preparou-se muito mal para o desafio da
globalização e o da digitalização está em crescendo. Alguém acredita que com o
Estado neste estado, poderemos responder bem a estes desafios?
[Publicado no jornal online ECO]
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