quarta-feira, 5 de julho de 2017

Ainda o incêndio mais mortal de sempre

É preciso voltar ao incêndio mais mortal em Portugal desde, pelo menos, 1900, e o 11º mais mortaldo MUNDO desde essa data.

O sistema de comunicação de emergência não funcionou durante 14 horas críticas e o SIRESP apresentou agora um relatório, publicado no site do governo (!), que diz que “Não houve interrupção no funcionamento da rede SIRESP, nem houve nenhuma Estação Base que tenha ficado fora de serviço em sequência do incêndio”. É compreensível que a empresa queira branquear o seu desempenho, mas já não se admite que o governo engula este relatório à partida, nem que queira que nós o aceitemos.

Por isso, como muito bem recomenda o meu amigo Nuno Garoupa, impõe-se a criação de uma comissão de inquérito, por legislação especial a fim de ter plenos poderes de investigação, presidida por uma personalidade independente e incluindo vários peritos estrangeiros, para evitar os habituais compadrios nacionais.

Em simultâneo, impõe-se a definição do que fazer ainda este Verão em termos de preparação contra outras eventualidades, incluindo dar informação às populações sobre o que fazer em caso de incêndio. Esta informação tem que ser personalizada porque uma das coisas que mais choca é que várias mortes foram provocadas por fugas desesperadas de pessoas a quem nunca foi explicado o que fazer em caso de incêndio e que se poderiam ter salvo se tivessem ficado em suas casas.

A um prazo maior, muito maior do que o sugerido pelo Presidente da República, tem que se repensar tudo sobre a floresta, aproveitando muitos dos estudos que já se fizeram.

Aproveito aqui para puxar a brasa à minha sardinha e sugerir que também seja tomado em consideração o relatório sobre Agricultura e Floresta (de que fui o relator), elaborado no âmbito do projecto do Forum para a Competitividade “Portugal – uma estratégia para o crescimento”.

Nele se critica duramente a recente “reforma” da floresta, que pretende descentralizar o combate aos incêndios quando o caminho deve ser o oposto. Falta uma estrutura de comando único de prevenção e combate a incêndios florestais que, durante o ano, coordene e acompanhe todas as acções de prevenção, redução de carga combustível e limpeza. E que, em última análise, com a formação e experiência adequadas, coordene durante a época de incêndios os dispositivos de combate.

Outra proposta interessante é fazer muito mais certificação florestal, que consiste em garantir que a sua exploração é sustentável. Dada a elevada consciência ambiental dos consumidores europeus, estes estão dispostos a pagar um preço mais elevado por produtos feitos a partir de florestas que são geridas de forma sustentável. Assim, os custos adicionais que são incorridos pela certificação mais do que se pagam a si próprios, para além de que uma floresta mais bem gerida tem um risco de incêndio muito inferior.

Uma coisa parece certa, é claramente possível fazer melhor do que temos feito até aqui, assim haja vontade política para honrar as 64 mortes e um número ainda desconhecido de desaparecidos.


[Publicado no jornal online ECO]

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