quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Estado bloqueador

Um dos obstáculos maiores ao nosso desenvolvimento económico (e outro) é a forma de actuação do Estado e da Administração Pública. Em particular, os intermináveis atrasos nos licenciamentos e nas mais diversas autorizações, que não cessam de ser criadas.

Em relação a prazos, há demasiadas cláusulas que permitem o congelamento do tempo de contagem. Estas cláusulas precisam de ser revistas e reduzidas ao mínimo. Em seguida, há tendência em considerar o prazo máximo como o prazo normal de resolução das questões. Proponho que se cria o “prazo recomendado” que, por defeito, seria, por exemplo, metade do prazo máximo. Nos serviços em que o prazo médio fosse acima do prazo recomendado, haveria uma forte restrição à atribuição da classificação de bom ou superior.

Dizem-me que muitas vezes a indecisão da Administração Pública (AP) resulta de medo dos funcionários de tomar decisões, de medo de serem acusados de corrupção, o que os leva a tomar decisões maximalistas e pouco sensatas.

Em particular na transposição das directivas comunitárias, é frequente uns funcionários, que ninguém sabe quem são, escolherem, dentro do leque de escolhas disponíveis, uma das mais restritivas. Quando se diz – e bem – que Portugal é mais papista do que o papa em relação a questões comunitárias, muitas vezes a iniciativa é da AP, que depois o governo aceita acriticamente.

Contaram-me recentemente um caso, cujos contornos concretos não vou revelar, para preservar o anonimato da fonte, em que uma directiva comunitária foi contestada por todos os países, excepto por dois, Portugal e a Grécia, que a verteram para a legislação nacional. Isto pode ter duas interpretações, qual delas a pior. Ou se trata de Estados que não têm a menor intenção de cumprir a legislação, ou têm governos e AP totalmente desfasadas da realidade dos respectivos países.

Para contrariar a inércia e a falta de realismo da AP, julgo que se impõe passar a tornar públicas estimativas, ainda que aproximadas das perdas para a economia – e para o próprio Estado – de todos os pedidos de licenciamento e autorização que aguardam decisão da AP.

Julgo que numa estimativa muito por baixo, há pelo menos 10 mil empregos por criar, pela inacção da AP. Isto corresponderá, desde logo, a 10 mil desempregados a mais, a cerca de 400 milhões de euros PIB que não temos, cerca de 180 milhões de euros de receita pública que o Estado não recebe e cerca de 50 milhões de euros em subsídio de desemprego que a Segurança Social tem que pagar porque a AP está a bloquear a criação de emprego.

Julgo que seria muito importante que, do outro lado da balança, a AP passasse a ter mais consciência de como as suas decisões (e sobretudo a falta delas) gera desemprego, pobreza e afecta as contas públicas.

Seria excelente que se disponibilizassem estimativas de emprego e investimento “pendurado”, com detalhe sobre o ministério ou autarquia em causa, com discriminação geográfica no caso da AP central. A própria comparação entre as diferentes regiões e autarquias poderia constituir uma competição muito saudável, para termos um Estado mais ágil, mais amigo do emprego e das empresas.


[Publicado no jornal online ECO]

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