A partir de 2016, a
possibilidade de sanções tornou-se bem real, o que impõe que se passe a criminalizar
a desonestidade orçamental.
A participação no euro, por definição, iria eliminar as
políticas monetário-cambiais nacionais, o que conferia uma importância
acrescida às políticas orçamentais nacionais, que ficavam como o quase único
instrumento à disposição dos governos para enfrentar crises específicas dos
seus países.
Daí também a importância atribuída ao controlo das contas
públicas no Tratado de Maastricht, assinado em 1992. Se os orçamentos não
estiverem perto de equilibrados nos anos de vacas gordas, a política orçamental
nunca poderá ser usada para amenizar períodos de vacas magras.
Nos países periféricos, em que adesão ao euro correspondia a
um forte estímulo monetário, com a descida substancial das taxas de juro, havia
um argumento adicional para a contenção orçamental, para contrariar este
estímulo e impedir que ele se transformasse numa explosão de procura e perda de
competitividade.
Em Portugal, ao contrário de Espanha, os governos não
perceberam isto e julgaram que os critérios de Maastricht eram uma mania da
“Europa” e não uma necessidade absoluta de preservação da saúde da economia
nacional. Não só não houve a contenção orçamental necessária, como ainda se
criaram PPP, que são pura desonestidade de contabilidade pública.
Em 2001, no final do “pântano” de Guterres, deu-se um novo
passo na fraude, ao apresentar em Bruxelas um défice totalmente martelado, de
cerca de 1% do PIB, que acabou por se revelar ser superior a 4% do PIB,
inaugurando – com duplo estrondo – a entrada de Portugal no processo de défices
excessivos, por ultrapassar os 3% do PIB, e por ter sido fraudulentamente
camuflado.
Em 2009, repetiu-se a fraude, tendo Sócrates escondido o
verdadeiro défice até as eleições legislativas desse ano. Neste caso, não foram
só os nossos parceiros comunitários que foram enganados, foram também os
eleitores, que foram impedidos de fazer uma avaliação política do governo.
Infelizmente, porque o público português parece o mais
distraído de todos, é importante sublinhar que estas trafulhices nas contas
públicas são altamente destrutivas da imagem de Portugal no exterior, que
afastam os investidores estrangeiros e fazem subir as taxas de juro, porque
ninguém quer investir num país em que o próprio governo se comporta como um
delinquente de vão de escada.
Em 2016, as sanções, que sempre estiveram previstas para o
não cumprimento dos limites orçamentais, passaram a estar muito mais próximas
de ser aplicadas, o que torna mais grave a desonestidade orçamental, já que
esta nos pode custar – directamente – centenas de milhões de euros em sanções.
Pelos custos de reputação, pelos custos em taxas de juro (do
Estado, da banca, das empresas e das famílias), pelas sanções, defendo que os
responsáveis por uma eventual desonestidade orçamental, provavelmente o
Ministro das Finanças, o Secretário de Estado do Orçamento e o Director Geral
do Orçamento, passem a ser criminalmente responsáveis por tal.
Não nos tentem enganar com qualquer subalterno, porque
nenhum funcionário público participaria em tal coisa, sem ordens superiores, da
mais alta instância. Aliás, convém perguntar, se algum funcionário for
submetido a pressões para perpetrar estas ilegalidades, que protecção legal
pode esperar? Vai ser perseguido como todos os outros que antes se “atreveram”
a denunciar corrupção? O Ministério Público continua com a cultura do
“respeitinho”?
Para terminar, devo acrescentar que quem estiver contra esta
proposta de alteração legislativa terá dificuldade em se libertar de suspeitas
de encobrimento.
PS. Que loucura se apossou deste governo que cria no
orçamento uma norma que desresponsabiliza autarcas por má despesa pública? Ao
fim de 14 anos de austeridade, que continua sem fim, os portugueses querem o
regresso da bandalheira na despesa financiada com o dinheiro dos nossos
impostos?
[Publicado no jornal online ECO]
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