Toda a esquerda irá
ser obrigada a engolir muitos sapos, para evitar que a descida de perspectivas
da DBRS sobre Portugal seja a antecâmara de um novo resgate e de uma nova
maioria absoluta da direita, com maiores perdas de “conquistas de Abril”.
Esta semana veio acentuar a previsão que fiz na semana
passada, de que a agência de rating
DBRS iria baixar as nossas perspectivas de “estáveis” para “negativas”. Por um
lado, a ARC ratings (a antiga Companhia Portuguesa de Rating, agora com
parceiros internacionais) fez isso mesmo, embora esta agência não seja
relevante para o BCE. Por outro, o ministro das Finanças, um “prodígio”
político, veio mesmo dizer que evitar um segundo resgate (ou o quarto desde o
25 de Abril) era a sua principal preocupação, uma mudança de discurso radical
face aos últimos meses, um inequívoco reconhecimento da forte degradação da
nossa condição.
Gostaria hoje de explicar porque, na actual situação, aquela
decisão é a melhor, para quase todos. Para a DBRS, isso irá aumentar a sua
visibilidade internacional, porque coloca Portugal a um passo do abismo e
totalmente dependente da próxima decisão dela. Se tudo correr pelo melhor, o governo
português tomará fortes medidas que permitirão a recuperação das perspectivas
para o nível de “estáveis” dentro de seis meses. Isto será magnífico, até para
o ego dos dirigentes da DBRS, por conseguirem “mandar” no executivo luso.
Para a Comissão Europeia e para o Conselho Europeu isto será
também excelente, porque não têm que recorrer às polémicas sanções, porque a
decisão desta agência de rating faz o
trabalho sujo por eles, obtendo os resultados desejados.
Para Portugal, o ideal seria, obviamente, que este governo
ou não tivesse optado pela mais disparatada política económica e orçamental ou
que fosse capaz de reconhecer as suas péssimas consequências e estivesse a
arrepiar caminho. Mas já que este executivo não aprende, o mal menor é a
decisão da DBRS a 21 de Outubro, para colocar um ponto final na
irresponsabilidade vigente.
Para a coligação de esquerda é que vai ser horrível. Vão
começar por ficar numa posição muito frágil, com a ameaça de um novo resgate se
não tomarem fortes medidas e recuarem em algumas que decidiram e terão que
reconhecer que estavam errados. Se recordarmos a pirueta do Syriza, muito mais
combativo do que os partidos de esquerda portugueses, podemos presumir que
todos eles, até o PCP, se renderão à evidência que têm de “obedecer” à DBRS. A
alternativa seria o retorno da troika,
eleições antecipadas e uma mais do que provável nova maioria absoluta da
direita. Nesta reencarnação, é muito provável que este novo governo destruísse
muito mais “conquistas de Abril” do que o anterior, pelo que o PCP deve estar
disponível para engolir muitos mais sapos do que afirma actualmente.
Aliás, a 15 de Novembro deverá ser divulgada a estimativa
rápida do PIB do 3º trimestre, que deverá constituir a machadada final na
política económica do governo, ao revelar que não há retoma nenhuma, sendo que
as perspectivas para o 4º trimestre se terão deteriorado profundamente, com a
mais do que provável decisão da DBRS.
Quanto à direita, continua a não reconhecer que, em 2011,
foi mal preparada para o governo e que, por isso, fez um trabalho pouco mais do
que sofrível, tendo fracassado vergonhosamente na reforma da despesa pública.
Não se compreende, assim, porque estão a dormir à sombra da bananeira, à espera
que este executivo caia de podre. Acham que resolveram o problema da estagnação
dos últimos 15 anos? O que é que estão à espera para estudar, planear, preparar
o regresso ao poder? Julgam que basta um pouco de demagogia? Acham que o país
não merece melhor?
[Publicado no jornal “i”]
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