Ao contrário do que o
governo diz, a execução orçamental está a correr muito mal, maquilhada com
atrasos nos reembolsos de IRS e com adiamento no pagamento a fornecedores. A
economia está muito pior do que o cenário delirante em que o orçamento foi
baseado e no segundo semestre as contas públicas deverão sofrer um rombo com a
diminuição do IVA da restauração, a reposição de salários na função pública e a
semana das 35 horas.
Depois de muitas incertezas, a Comissão Europeia abriu um
processo que pode conduzir a sanções a Portugal e Espanha. Antes de mais convém
lembrar que esta é a primeira vez que tal ocorre, embora o não cumprimento da
norma sobre os défices orçamentais já tenha sido violada em mais de cem casos
desde o início do euro, por um número elevadíssimo de países, incluindo a
própria Alemanha.
No entanto a Comissão não fez qualquer proposta concreta de
sanção, devendo esta sua avaliação ser alvo de apreciação na próxima reunião de
ministros das Finanças, no próximo dia 12. Aí, a avaliação será muito mais
política, havendo dois campos opostos. Aquele que é liderado pela Alemanha
pretende que haja sanções, para que não se instale o laxismo e que se reforcem
as condições de integração europeia. Do lado oposto estarão os que se opõem às
sanções, provavelmente com dois tipos de motivação bem diferente. Uma primeira,
mais presente nos países do Sul, será a de se livrarem de sanções no futuro.
Uma segunda, mais altruísta, será a de limitar a expansão do sentimento
anti-UE, já muito inflamado e mais ainda pelo resultado do Brexit.
Será fácil – e correcto – argumentar que estamos perante
dois pesos e duas medidas, mas em algum momento do tempo se teria que passar a
exigir o cumprimento das normas orçamentais, sob pena de que se instale um
desrespeito generalizado. Aliás, parece evidente que terá sido a inexistência
passada de sanções que terá levado Passos Coelho a correr os riscos que correu
no orçamento de 2015.
Em relação à razão porque Portugal corre o risco de sofrer
sanções, elas não se prendem apenas com o défice de 2015 ter ficado acima dos
3% do PIB, mas porque nesse ano não houve redução do défice estrutural
(expurgado do ciclo económico). Entre 2013 e 2015, o nosso país deveria ter
reduzido o défice estrutural em 2,5% e a correcção não chegou a metade disso
(1,1%).
Se o Ecofin da próxima terça-feira aprovar sanções, a
Comissão tem 20 dias para fazer uma proposta concreta de multa e também tem que
propor a suspensão de novos compromissos (mas não de pagamentos) de fundos
comunitários.
Já tinha sido ventilado anteriormente que Portugal teria
algumas semanas para tomar medidas correctivas e espero bem que o faça.
Ao contrário do que o governo diz, a execução orçamental
está a correr muito mal, maquilhada com atrasos nos reembolsos de IRS e com
adiamento no pagamento a fornecedores. A economia está muito pior do que o
cenário delirante em que o orçamento foi baseado e no segundo semestre as
contas públicas deverão sofrer um rombo com a diminuição do IVA da restauração,
a reposição de salários na função pública e a semana das 35 horas.
Por tudo isto, que não é pouco, seria sempre necessário um
plano B, do qual o executivo tem fugido como diabo da cruz, com medo das suas
repercussões na sobrevivência da “gerigonça”.
Agora temos a provável ameaça de sanções e novas exigências
para o orçamento de 2017. Aí, António Costa será confrontado com um dilema
terrível: ceder a Bruxelas e, em consequência disso, perder apoio parlamentar e
ser forçado a demitir-se, ou ceder aos seus parceiros e colocar o país a caminho
de chamar de novo a troika.
[Publicado no jornal “i”]
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