A sociedade civil tem
um papel relevante a desempenhar na reforma do Estado
Saiu no Público de
8 de Janeiro passado, o texto “Reformar a Administração Pública”, assinado por Fernando
Bello, Francisco Seixas da Costa, João Costa Pinto, João Ferreira do Amaral, João
Salgueiro, José Manuel Félix Ribeiro e Miguel Lobo Antunes, fruto de reflexões
que este grupo vem fazendo sobre este e outros temas.
Em primeiro lugar, é de louvar o esforço da “sociedade
civil” em reflectir sobre o país, o que parece escassear em outros locais onde
esta reflexão deveria ser obrigatória, como os partidos políticos e as universidades.
Em segundo lugar, correndo o risco de errar, fiquei com a
sensação que a divulgação deste contributo sobre a reforma da Administração
Pública (AP) foi muito reduzida e o seu impacto, infelizmente, mínimo.
Como considero que aquele texto é um bom ponto de partida,
embora ainda demasiado genérico, dou aqui algumas achegas ao tema, ainda no
domínio da generalidade.
Reproduzo o início do ponto 2 daquele texto: “Se há tantos
anos se fala em reformar a AP, porque não se põe em prática? Será que é possível
fazê-lo?”
Pergunto eu: porque é que as reformas não têm ido avante
e/ou não têm sido suficientemente profundas e eficazes? Em particular, porque
que é que a proposta de reforma apresentada pelo XIX governo foi tão tardia e
fraca (para não lhe chamar outros nomes, que bem merecia)? Este governo não só
parecia imbuído de espírito reformador, como estava obrigado, por pressão
externa, a fazê-lo, o que poderia servir de pretexto para ir bem longe.
Portugal tinha estado na iminência da bancarrota e o governo recém eleito tinha
também legitimidade para desencadear mudanças profundas.
O primeiro problema, encadeado no segundo (o medo de
reformar), é que os partidos na oposição não se preparam verdadeiramente para
governar, não havendo um governo sombra, de ministros-sombra que se vão
inteirando dos problemas e iniciam atempadamente o que irão fazer quando
fizerem parte de um novo executivo. Ao perder dois anos preciosos, o governo de
Passos Coelho terá perdido o tempo certo para encetar uma verdadeira reforma da
AP.
O segundo problema, bem mais grave, considero que seja o
medo de reformar. E porquê este medo? Mais uma vez, sem ter a certeza de estar
certo, imagino que este temor esteja associado à dificuldade em alterar as
condições dos funcionários públicos e o medo dos sindicatos do sector público,
quase os únicos com poder em Portugal.
Antes de mais, tal como em outros casos, parece-me que estes
sindicatos estão mais preocupados em defender uma agenda político-partidária,
do que em defender os verdadeiros interesses dos trabalhadores, sendo, em
última análise, fracos representantes destes.
Por tudo isto, parece-me essencial envolver estes sindicatos
em qualquer tipo de reforma da AP, prevendo dois tipos de resultados, extremos,
para simplificar. Na melhor das hipóteses, poderemos descobrir que estes
sindicatos não são tão contrários a uma reforma da AP, sobretudo se forem
levados a bem.
Na pior das hipóteses, estes sindicatos poderão revelar-se
completamente reaccionários e imobilistas. Neste caso, mesmo assim, não há
razões para desesperar. Se, perante propostas de mudanças de elevada qualidade
e obviamente boas para a generalidade dos portugueses, os sindicatos ficariam
perante uma forte possibilidade de perda de poder. A oposição dos sindicatos a
mudanças consensuais e altamente elogiadas pela generalidade da população
deveriam levar a uma forte diminuição da sua aceitação e a uma clara diminuição
do seu poder reivindicativo. Os sindicatos que se rebelassem contra estas
reformas pagariam um elevado preço por isso, o que poderá constituir um
poderoso travão a que o venham a fazer.
[Publicado no jornal “i”]
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