O próximo governo deverá
ser socialista e dificilmente durará muito tempo
As últimas sondagens continuam a dar um empate técnico entre
os principais contestantes e a campanha eleitoral, quase totalmente afastada do
mais importante, não deverá alterar esta circunstância.
Continuo a não acreditar num governo de bloco central, que
seria sempre muito instável, em clima de guerrilha interna permanente. Vejo
como mais provável um governo do PS, talvez em coligação com os novos pequenos
partidos, do que um executivo do PSD-CDS, mesmo que estes tenham marginalmente
mais deputados do que os socialistas. Com um parlamento com uma claríssima
maioria de esquerda parece muito difícil que um governo de direita tenha
qualquer hipótese de vingar. Já um executivo liderado pelo PS poderá contar,
por algum tempo, com a abstenção do PC e BE, que o poderão assumir como mal
menor.
Mas será sempre um governo muito condicionado, enfrentando
uma conjuntura desfavorável em vários aspetos.
Antes de mais, a conjuntura internacional parece estar a
mudar para pior. Até há não muito tempo, o próximo ano era considerado como de
continuação da recuperação internacional, mas várias nuvens têm ensombrado esse
cenário. Aproxima-se o momento de subida das taxas de juro de referência nos
EUA e teme-se que isso provoque um terramoto nos países emergentes demasiado
endividados em dólares. A China tem apresentado sinais também pouco favoráveis
e um abrandamento daquela que tem sido a locomotiva do crescimento mundial
deverá espalhar-se a quase todos os países, avançados e emergentes.
Uma desaceleração internacional deverá pressionar ainda mais
o preço do petróleo, colocando dificuldades adicionais a Angola, com múltiplas
ramificações a Portugal tais como a repatriação de nacionais, suspensão de
remessas, quedas das exportações, problemas de crédito e nas filiais dos bancos
portugueses naquele país.
A nível europeu, temos sempre que contar com a caixinha de
surpresas em que se transformou a Grécia, que foi obrigada a aceitar um
terceiro resgate impossível de cumprir, que não deverá demorar muito tempo a
causar novos problemas. Para além disso, estamos perante uma crise de
refugiados, cuja proposta de solução, com quotas obrigatórias, parece fadada
para criar mais problemas do que os que vai resolver.
Em Portugal, teremos um governo obrigado a engolir a
generalidade das suas promessas eleitorais, criticado por uma direita que, na oposição,
deve adotar uma irresponsabilidade como a que o PSD exibiu a partir de 1995. A
esquerda que, pela sua abstenção, permitirá a sobrevivência do executivo, terá
cada vez mais dificuldades em continuar a fazê-lo, sempre que novas medidas de
austeridade tiverem que ser aprovadas.
Para além disso, teremos o julgamento de Sócrates que, dada
a sua personalidade, jamais aceitará ser imolado sozinho. Até aqui, o PS tem
conseguido – miraculosamente – manter-se à margem dos problemas judiciais do
seu antigo secretário-geral mas, quando as acusações forem tornadas públicas, é
muito provável que haja várias novas “baixas” socialistas, porque é impossível
ele ter agido sozinho.
Se um governo socialista, já fragilizado, assistir à
exposição pública de muitos dos podres do seu partido é provável que aconteçam
três coisas. Um primeiro efeito será o esvaziamento do PS como partido de
poder, como aconteceu ao PASOK na Grécia. Uma segunda consequência deverá ser o
surgimento de novas agremiações políticas, tal como tem acontecido noutros
países e que, para surpresa de muitos, ainda não aconteceu em Portugal.
Finalmente, deveremos ter a queda do governo, eleições antecipadas e um novo
espectro partidário, que já não me atrevo a antecipar.
Em relação ao Presidente da República que deverá ser eleito
entretanto, não me parece que tenha grande margem para alterar o cenário
descrito, a não ser, talvez, a de gerir a sua duração.
[Publicado no jornal “i”]
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