O nosso elevado e persistente défice externo (que se agravou no 2º trimestre) tem por trás dois problemas: falta de poupança e falta de competitividade. Em relação à competitividade, o Banco de Portugal recalculou-a e afinal caiu menos do que na zona do euro (Boletim Económico, Verão 2010, p. 28). Mas como esta revisão da competitividade não levou a qualquer revisão das contas externas, somos forçados a concluir que, em Portugal, mesmo uma modesta perda de competitividade tem efeitos devastadores sobre as contas externas, tendo levado a acumular uma dívida externa que já ultrapassa os 110 % do PIB.
Esta “descoberta” do Banco de Portugal não pode tranquilizar ninguém. A única esperança que ela poderá trazer é que uma modesta recuperação da competitividade traga um verdadeiro milagre sobre as contas externas, reforçando a necessidade de apostar justamente nessa recuperação.
Como o problema da competitividade tem recebido muito mais atenção do que o problema da poupança, vou hoje falar sobre este tema. Portugal foi o país da UE em que a poupança bruta mais caiu (de 19,8% em 1998 – último ano antes do euro – para 8,5% do PIB em 2009). No ano passado, já só a Grécia tinha uma poupança inferior a Portugal (5,0% do PIB, dados da OCDE, Jun-10). Estaremos com uma taxa de poupança que será cerca de metade da espanhola (19,7% do PIB em 2008). Ou seja, estamos com um grave problema de falta de poupança e em termos deste indicador estamos quase como os gregos.
Como aumentar a poupança? A primeira ideia que surge é a criação de benefícios fiscais para um tipo particular de aplicações. Mas tipicamente estes benefícios não aumentam a poupança (já viram alguém deixar de fazer férias no Brasil para fazer um PPR?), apenas desviam o seu destino. Num número muito significativo de casos, incentivos para activos particulares apenas atraem poupanças de anos anteriores. Pior ainda, ao não promoverem a poupança privada e ao diminuírem a poupança pública (pelo benefício fiscal) acabam por diminuir a poupança nacional, o que não poderia ser mais desadequado.
Há uma outra medida que não vale a pena pedir: uma redução generalizada e uniforme da fiscalidade sobre a poupança. Não vale a pena pedir porque não há margem orçamental para isto e porque, com taxas de juro brutas tão baixas, é altamente improvável que uma diminuição da fiscalidade produzisse quaisquer resultados sobre a poupança.
Uma medida mais drástica seria a redução dos impostos sobre o rendimento (IRS) e o aumento dos impostos sobre o consumo (IVA e outros). Em tempos normais esta medida provocaria uma fortíssima oposição por aumentar a desigualdade da distribuição dos rendimentos. Em tempos de subida generalizada de impostos é praticamente impossível de propor. Mesmo assim a melhor alternativa à redução do IRS seria a redução das contribuições sociais, o que ajudaria a melhorar a competitividade.
Só me ocorre mais uma alternativa, um pouco heterodoxa: uma campanha publicitária, para transmitir duas ideias. A primeira ideia é fazer passar a mensagem que estamos com uma taxa de poupança muito baixa, muito abaixo de Espanha e muito próxima da da Grécia. Estamos muito longe daquilo que já fomos capazes e muito próximo de comportamentos que nos podem colocar em grandes sarilhos.
A segunda ideia é a atitude a ter em relação à redução do consumo. Os portugueses não devem reduzir o consumo numa atitude de desgraçadinho, de quem está a fazer sacrifícios impensáveis, uma vítima de todas as perfídias, etc, etc. Devem fazê-lo numa atitude responsável. Ao poupar estou: a) a prescindir de gastos que não são verdadeiramente essenciais; b) a dar o meu contributo para que o país saia do buraco em que está; c) a ajudar o planeta, que está a ser muito maltratado pelo excesso de consumo (agravado pela falta de eficiência energética na produção), estou a reduzir a pegada ecológica.
[Publicado no Jornal de Negócios]
1 comentário:
Pedro Braz Teixeira
Duas notas de atenção:
Os impostos sobre o consumo não afectam de igual modo os contribuintes, por isso,
aumentar o preço da gasolina em 20 cêntimos, isto é, aumentar o ISP nesse montante e
aumentar o imposto de circulação em 60% ajudava a:
diminuir o défice de importações
ajudar na pegada ecológica
aplicar realmente o princípio do utilizador pagador nas estradas.
(Pelas minhas contas, cerca de 30/35% da população não tem carro, mas paga as estradas?)
Sobre a balança.
Talvez agora se começe tomar consciência dos erros políticos que foram estes últimos 10/15 anos.
Duas empresas (GALP e AUTOEUROPA) representam +/- 18/20% das nossas exportações; como não fabricamos motores, chapas em aço ou crude e, nosso valor acrescentado (médio) em ambas é de +/- 20/30%, qualquer aumento da produção reflecte-se nas importações.
Cumprimentos
joão
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