Com uma das dívidas externas mais elevadas do mundo, Portugal está “condenado” a atrair capitais externos, mas convinha que fosse atraente para investimento de qualidade.
Em 1995, Portugal tinha as contas externas equilibradas, num
triplo sentido: tinha uma conta corrente equilibrada; a AutoEuropa iniciou a
sua laboração, melhorando muito a qualidade das nossas exportações;
praticamente não tínhamos dívida externa, de apenas 8% do PIB.
A partir daí, iniciou-se um ciclo de absurdos défices
externos, próximos dos 10% do PIB, que fizeram explodir a nossa dívida externa
até 110% do PIB em 2011, o que nos fechou o acesso a financiamento externo e
nos conduziu para os braços da “troika”. Se não estivéssemos no euro, das duas
uma: ou não poderíamos ter conduzido tão imprudentes políticas ou teríamos sido
forçados a chamar o FMI dez anos antes.
Ficámos assim com uma das dívidas externas mais elevadas do
mundo, porque fora da moeda única os investidores estrangeiros já nos teriam
fechado a torneira muito antes de chegarmos a tão estratosférico endividamento.
Pior ainda: uma parte excessiva desta dívida é financeira, o que a torna
extremamente volátil.
Uma das consequências mais visíveis deste endividamento foi
o termos perdido centros de decisão: quase todas as principais empresas
portuguesas passaram a estar nas mãos de investidores estrangeiros.
Forçados a reconhecer a dependência de capitais externos,
governos de várias cores têm recorrido a meros expedientes: atrair investidores
cujo património tem origens pouco claras, das mais altas figuras de regimes
cleptocratas; cortejar empresas de capitais públicos de Estados pouco amigos da
democracia e dos direitos humanos; incentivar a imigração de luxo, com
benefícios fiscais que escandalizam Estados Membros da UE, etc.
Mas uma coisa é vender património português já existente,
outra é atrair investimento de raiz, que gere emprego, que traga inovação, que
contribua para a melhoria da qualidade da produção e da gestão no nosso país.
É urgente acabar com os remendos e assumir que temos que
melhorar a estrutura da nossa dívida externa, transformando-a em investimento
directo estrangeiro (IDE), em novas unidades a construir no futuro.
Para isso, precisamos de nos tornar verdadeiramente
atraentes para o IDE, como têm feitos os países do Alargamento da UE, que nos
têm vindo a ultrapassar. Temos que acabar com esta esquizofrenia de criar
condições absurdamente favoráveis para os vistos gold, que envolvem
investimentos com pouco interesse, e ter obstáculos absurdos para os novos
investimentos, que nos interessam realmente.
Destes, destaco apenas dois: as taxas de imposto e a
burocracia dos licenciamentos. A nossa fiscalidade sufocante faz com que muitos
potenciais investidores nem sequer considerem estudar a sério a hipótese de
Portugal, que fica logo fora da “short list”. Em seguida, segue-se o calvário
do licenciamento, muitas vezes juncado de cadáveres de intenções. Em suma,
impõe-se parar com os expedientes e assumir a vontade de atrair investimento
novo de qualidade.
[Publicado no Jornal Económico]
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