Há cerca de 100 anos que a ciência económica explicou que
lançar um imposto no meio de uma recessão contribui para a agravar.
Nos últimos tempos, tem-se debatido a ideia de lançar um
imposto sobre os que menos sofreram com a pandemia, para ajudar os que mais têm
sofrido.
Antes de mais, é preciso esclarecer que, em Portugal, são
raríssimos os casos de beneficiários da pandemia, ao contrário dos EUA, onde as
designadas empresas tecnológicas alcançaram valorizações recordes.
Há uma outra questão que tem passado ao lado dos proponentes
de um aumento de impostos, talvez por a generalidade deles serem funcionários
públicos. Quem trabalha no sector privado começou por sofrer a incerteza de
perda de rendimentos, mesmo que, no final, estes não se tenham concretizado.
Para além disso, enquanto a pandemia não for claramente debelada, não é
possível saber quem mais sofre com ela, porque ainda há muito desemprego
adiado, pelas ajudas públicas e moratórias de créditos. Só no final é que saberemos
quem foi prejudicado.
Se houve poucos beneficiários, indirectos, do COVID-19,
houve imensos que perderam com ele, desde logo, os que perderam a vida ou a
saúde, a sua própria e/ou dos seus familiares e amigos.
Em relação a perdas económicos, houve um número muito grande
de pessoas com perdas, algumas das quais com quebras brutais do rendimento. No
entanto, estas perdas foram muito aumentadas pela forma como o governo reagiu:
com atrasos inaceitáveis, com burocracias absurdas, com critérios demasiado
restritivos e mesmo mesquinhos. Houve atrasos de meses que causaram um
sofrimento brutal e desnecessário e que não aparecem nas contas públicas
anuais. Mesmo assim, fomos confrontados com o cúmulo do absurdo: o governo nem
sequer gastou a despesa autorizada pela AR no orçamento aprovado ANTES da
pandemia, quanto mais no orçamento rectificativo. Foram quase 7 mil milhões de
euros não gastos, o que corresponde a mais de metade do IRS cobrado em 2019.
Se o governo não foi capaz de ajudar quem precisava, apesar
de ter acesso a condições para o fazer (autorização da AR e juros negativos), o
que nos permite acreditar que um pouco mais de receitas fiscais teriam feito a
diferença? Que garantias temos que não seriam desbaratadas na primeira
oportunidade, nomeadamente face à forma amadora (e caríssima) com que tem sido
gerido o dossier TAP, só para dar um exemplo?
Finalmente, passemos à questão da estabilização económica
(minimizar as flutuações económicas), uma questão que passou a fazer parte das
funções económicas essenciais do Estado há cerca de 100 anos, através do
trabalho de Keynes. Uma das coisas que mais horrorizava este economista era a
forma como os governos tentavam equilibrar o orçamento no meio de uma grave
recessão, lançando impostos que só a agravavam. Ou seja, aumentar impostos no
meio da pandemia é o pior que se pode fazer.
Em resumo, a ajuda aos prejudicados pela pandemia deveria
ser mais generosa imediatamente e, antes de qualquer subida de imposto, é essencial
aumentar a eficiência da despesa pública.
[Publicado no Jornal Económico]
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