Peço ao INE para dar
uma clara centralidade ao tema da distribuição dos salários e rendimentos,
criando uma publicação anual dedicada ao tema.
Já se percebeu que os sindicatos tradicionais estão em declínio
acelerado e que novas formas de luta laboral vão emergir. Por isso, torna-se
cada vez mais importante conhecer a distribuição dos salários em Portugal, para
perceber melhor a razoabilidade das reivindicações que irão surgir.
Aliás, o tema da (re)distribuição é tão central no debate
político que é essencial que haja fácil acesso a informação detalhada sobre a
distribuição dos salários e dos rendimentos.
Tanto quanto é do meu (limitado) conhecimento, o INE apenas
publica, num quadro quase escondido, informação sobre salários, em intervalos
tão alargados, que os dados acabam por ser pouco úteis.
Trata-se do “Quadro 30a: Trabalhadores por conta de outrem
segundo a região de residência NUTS II (NUTS-2013), por setor de atividade
principal (CAE-Rev. 3) e escalão de rendimento salarial mensal líquido”, das
Estatísticas do Emprego. Em relação a 2018, os dados apresentados são (meus
cálculos):
Distribuição dos salários, 2018
Salário mensal
|
% do total
|
% acumulada
|
Menos de 310 euros
|
3,1%
|
3,1%
|
De 310 a menos de 600 euros
|
23,7%
|
26,7%
|
De 600 a menos de 900 euros
|
38,2%
|
64,9%
|
De 900 a menos de 1 200 euros
|
14,9%
|
79,8%
|
De 1 200 a menos de 1 800 euros
|
14,4%
|
94,2%
|
De 1 800 a menos de 2 500 euros
|
3,9%
|
98,1%
|
De 2 500 a menos de 3 000 euros
|
0,8%
|
99,0%
|
3 000 euros e mais euros
|
1,0%
|
100,0%
|
Um dos aspectos mais chocantes desta forma de apresentar os
dados, é que ela não permite identificar uma das estatísticas mais elementares,
a mediana, o salário do trabalhador que está exactamente nos 50% da
distribuição. Deverá andar próximo dos 780€, o valor interpolado, mas não faz
sentido este dado não ser divulgado explicitamente.
Segundo a ANTRAM, os motoristas de matérias perigosas,
ganham cerca de 1440€ mensais. Olhando para a tabela acima, ficamos a saber que
mais de 80% dos trabalhadores ganham menos do que isso, mas não conseguimos ter
a certeza se também é verdade para 90%. Se tivéssemos a distribuição dos
salários por qualificação profissional iríamos certamente chegar a valores
ainda mais extremos.
Por tudo isto, faço um pedido ao INE: dê uma clara
centralidade ao tema da distribuição dos salários e rendimentos, criando uma
publicação anual dedicada ao tema.
Precisamos de conhecer todos os limites dos decis da
distribuição de salários, ou seja, quanto ganha o trabalhador no escalão dos
10%, 20%, 30%, etc. A partir dos 80%, será útil conhecer os dados de forma mais
detalhada, por exemplo, dos 85%, 90%, 92%, …, 99%, 99,5%, 99,9%.
Também queremos saber a distribuição por sexo e por nível de
formação, para termos informação clara sobre a diferença salarial entre homens
e mulheres. Como é evidente, também as diferenças a nível geográfico e etário,
entre outras, em apresentação matricial.
Já que interpelei o INE por este motivo, permito-me fazer
outros pedidos, de muito menos monta. Era muito bom padronizar as suas
publicações, sobretudo os ficheiros excel, que parecem feitos por um conjunto
de departamentos que não comunicam entre si.
Por exemplo, os indicadores de confiança apresentam sempre,
e muito bem, as suas séries cronológicas completas. Os dados do comércio
internacional apresentam apenas o último ano e as estatísticas do emprego nem
isso. Basta olhar para o Boletim Estatístico do Banco de Portugal para perceber
como se padroniza a apresentação dos dados mais diversos.
Também poderia fazer inúmeras sugestões de como melhorar o
site do INE e a apresentação da “Base de dados”, se tiverem interesse nisso.
[Publicado no jornal online ECO]
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