Há uma enorme
hipocrisia no Estado social, quando os governos não querem pagar a factura do “social”,
impondo a alguns privados, escolhidos de forma arbitrária e – demasiadas vezes
– da forma mais injusta, o custo destas ajudas.
Esta hipocrisia tem dois aspectos. O primeiro é, desde logo,
a vergonha de o Estado se dizer muito empenhado em certo tipo de auxílio, mas
não querer pagar a factura.
O segundo aspecto, demasiadas vezes negligenciado, é a
criação de incentivos perversos, que destroem as boas intenções.
Se, por hipótese, o Estado legislar no sentido de pessoas
com mais de 60 anos passarem a usufruir de contratos de arrendamento permanentes,
está-se a criar uma barreira brutal ao arrendamento a pessoas que estejam a
alguns anos de completar aquela idade. Como o senhorio sabe que, a partir daí,
é como se perdesse a sua propriedade, quase de certeza que não vai aceitar este
tipo de inquilinos. Ou seja, uma legislação aparentemente bondosa, produz os
efeitos opostos daqueles que se pretende alcançar.
Uma das maiores hipocrisias diz respeito aos aumentos
diferenciados entre o Indexante de Apoios Sociais (IAS) e o salário mínimo.
Como já expliquei detalhadamente aqui, entre
2006 e 2018, o IAS foi aumentado em apenas 43€, enquanto o salário mínimo foi aumentado
em 194,10€. Qual é a lógica do Estado “social” aumentar muito menos os
rendimentos que dependem directamente de si do que aqueles que dependem das
empresas?
Aquela que foi, até hoje, sem dúvida, a mais cara, para os
privados e para a economia como um todo, de todas estas hipocrisias foi o
congelamento das rendas em 1974, em que os senhorios foram forçados a subsidiar
fortemente os inquilinos, num ambiente de elevadas taxas de inflação.
Esta medida foi injusta para os senhorios, porque a
transferência não era função do nível de rendimento ou riqueza deles; e foi
injusta para os inquilinos, porque também não dependida do seu estado de
necessidade económica. Aliás, os inquilinos mais ricos, a viver em habitações
maiores, mais luxuosas e em melhores localizações receberam subsídios maiores.
Para além disso, os novos inquilinos, por mais pobres que fossem, não tinham
direito a qualquer subsídio de renda, sendo obrigados a desterrar-se nos mais
recônditos subúrbios.
Para além das injustiças pessoais, esta medida teve efeitos
devastadores a nível macroeconómico. O investimento em habitação representa,
tipicamente, cerca de metade do stock de capital dum país e, em Portugal, isto
deve representar algo na ordem dos 150% do PIB. Sem rendimentos para realizar
obras de manutenção, muitos senhorios foram forçados a assistir à degradação
sucessiva do seu património e a perda para o país andará na ordem de um
múltiplo de 10% do PIB. Ainda hoje, sobretudo em Lisboa e no Porto, podemos
assistir ao descalabro provocado por esta política, com inúmeros prédios em
ruínas.
É importante – e legítimo – perguntar: quanto custa este
Estado “social” paralelo que é imposto aos investidores, empresas, etc.? É que
este Estado “social” adicional tem que ser somado ao Estado (despesa pública) que
já nos custa 44% do PIB (em 2018).
[Publicado na CapitalMagazine]
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