Rezo pelos mortos e
rezo para que estas mortes não tenham sido em vão e se faça finalmente o que
urge fazer.
Não me vou focar no incêndio de Pedrógão Grande, embora
espere que o número extraordinário de mortes impulsione mudanças que se
aguardam há décadas. Ainda assim, tem que se referir que não é aceitável que o
sistema de comunicação de emergência (SIRESP), não funcione em situações de
emergência e isso mesmo esteja previsto no contrato inicial com o Estado. Também
não se compreende como é que os aviões Kamov, em mais um contrato dos mais
nebulosos contornos, só voltem a estar operacionais no próximo ano. É de susto
que o plano nacional contra incêndios esteja sem avaliação há quatro anos; e
fico-me por aqui.
Cerca de 85% da floresta é detida por 500 mil proprietários,
estando o resto nas mãos do Estado e da indústria das celuloses. O Estado não é
um proprietário particularmente zeloso, mas as celuloses são muito eficazes e
têm taxas de incêndio muitos inferiores à média nacional porque têm o máximo
interesse em limpar os terrenos e ser extremamente eficientes no combate a
acidentes.
No caso da miríade de pequenos proprietários, as coisas são
muito diferentes. Sublinhe-se que mais de metade da área ardida é de matos, ou
seja, de terrenos que estão ao abandono. Se não retiram qualquer tipo de
rendimento destes terrenos, é impossível a estes proprietários gastarem o que
quer que seja na sua limpeza. Não vale a pena nem lirismos nem voluntarismos de
criar leis que obrigam a limpar. Todos nos lembramos o que aconteceu aos
prédios com rendas congeladas: como os rendimentos não chegavam para quase
nada, o Estado deixou de aplicar a lei que obrigava os senhorios a fazer obras
com regularidade e os prédios chegaram ao estado de degradação de que todos nos
recordamos.
Das duas, uma: ou se criam condições de rentabilização dos
terrenos actualmente abandonados ou tem que ser o Estado a fazer a sua limpeza.
Só há duas espécies com rentabilidade económica interessante: o pinheiro bravo
e o eucalipto, que representam quase metade da floresta portuguesa. As ideias
voluntariosas de proibir o eucalipto são baseadas no preconceito de que os
incêndios estão associados ao eucalipto, quando esta é a plantação que mais
condições tem de gerar recursos que permitam a limpeza e protecção da floresta.
Para além disso, sem acesso a plantações economicamente interessantes, o
destino mais provável dos terrenos deverá ser o abandono, mais mato, logo mais
incêndios.
Há outras hipóteses de rentabilizar os terrenos actualmente
abandonados. Pode-se subsidiar a pastorícia, tendo cuidado que ela não produza
estragos em zonas agrícolas. Portugal importa enormes quantidades de cereais
para alimentar o gado, pelo que este subsídio pode ser duplamente interessante,
quer pela prevenção dos fogos quer pela substituição de importações. Tal como o
Henrique Pereira dos Santos tem vindo a sugerir, deve-se subsidiar a “gestão de matos, quer na pastorícia, quer na resinagem,
quer mesmo na gestão da biodiversidade”.
Em resumo, o que falta fazer há décadas é prevenção, que se
faz entre Outubro e a Primavera; qualquer medida com incentivos económicos
errados está destinada a falhar à partida.
[Publicado no jornal online ECO]