quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Acordar as elites

Ao contrário da generalidade dos países europeus, Portugal tem estado estagnado nos últimos 16 anos, mas nem as elites nem o cidadão comum parecem ter interiorizado isto.

Se olharmos para o conjunto dos últimos 16 anos, verificamos que Portugal foi um dos países que menos cresceu na UE, quando deveria ter crescido acima da média, porque se deveria estar a aproximar do rendimento médio europeu. Se não estamos a convergir é porque algo de muito errado se passa no nosso país. Este problema é tão grave, estranho, raro e já dura há tanto tempo, que é profundamente chocante que as nossas elites ainda não o tenham interiorizado.

Crescimento acumulado do PIB, 2000-2015

[ver gráfico no link]
Fonte: AMECO

O problema começa por ser grave porque um fraco crescimento coloca tudo em causa: o emprego, os salários, o poder de compra dos portugueses, a sustentabilidade do Estado social, as finanças públicas, etc. Portugal cresceu pouco mais de um décimo da média da UE, em termos acumulados, o que dá uma ideia do abismo que nos separa dos outros.

Depois, é estranho, porque, em princípio, deveríamos estar a convergir para a média comunitária porque partilhamos muita legislação, uma mesma moeda e até recebemos um montante significativo de fundos comunitários justamente para convergir.

É raro, porque só a Grécia está numa posição pior do que a nossa e isto apenas a partir da crise do euro, desde 2010, já que anteriormente, ao contrário de Portugal, estava a convergir para a média. O outro caso de um país pior do que o nosso, a Itália, é diferente, porque eles já atingiram a média europeia, pelo que a pressão para convergir para a média já deixou de funcionar, o que não impede o problema de também ser grave para eles.

Finalmente, esta “doença” já dura há 16 anos, pelo que é impressionante como é que ainda não foi assumida pelas nossas elites e também pelos portugueses em geral.

Por seu turno, esta falta de consciência das elites tem dois grupos de consequências extremamente graves. Por um lado, porque permite a apresentação de propostas políticas supostamente “alternativas” e, por isso mesmo, saudáveis no debate político, quando não passam de pura fraude. Tentar reverter normas que vigoraram durante um período em que Portugal fracassou completamente, quer pela ausência de resultados, quer pela insustentabilidade, que se distingue pela explosão do endividamento externo, que passou de 8% em 1995 para mais de 100% do PIB, a partir de 2009, é absurdo.

Por outro lado, isto bloqueia a aprovação de medidas estruturais essenciais para sairmos do buraco em que nos encontramos. Se as elites pensam que estamos apenas a viver um mau momento, por exclusiva influência europeia, qual a motivação para adoptar medidas completamente diferentes? Se estamos tão mal como todos os outros, porque razão haveríamos de adoptar medidas ousadas?

Por isto tudo, parece essencial acordar as elites portuguesas, para que não mais se possa ignorar este problema e o encaremos de frente.


[Publicado no jornal online ECO]

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