A birra de António
Costa de não apresentar um plano B orçamental está ao nível de perigosidade da
birra de Sócrates de não pedir auxílio à troika
O recuo da ideologia tem levado ao aparecimento de, pelo
menos, dois tipos de escolhas, como uma forma pobre de diferenciação política.
Por um lado, a criação de um conjunto apreciável de medidas folclóricas, sem
substância ideológica, como é o caso da luta do PS, desde 2011, com o IVA da
restauração.
Por outro, há as birras ou rivalidades, ao nível da luta de
galos. Neste segundo grupo, está a diabolização do FMI, levada a cabo por
Sócrates, que trouxe elevados prejuízos ao país. Por ter diabolizado o FMI, o
antigo primeiro-ministro adiou muito mais tempo do que seria sensato o pedido
de ajuda externa, só o tendo feito quando o país já estava com a corda na
garganta, sem qualquer poder negocial. Por isso, o nosso programa de
ajustamento teve um caracter punitivo que deve ser assacado a Sócrates. Para
além disso, ao ter pintado de negro um pedido de auxílio, transformou este numa
derrota política muito mais severa do que se tivesse defendido que aquele
decorria de fragilidades estruturais do país.
Neste momento, demonstrando mais uma vez que o PS não
aprendeu nada com os seus erros passados, estamos a assistir a uma repetição
deste filme, como num velho e decadente cinema de reprise, com a absurda teimosia de António Costa de não apresentar
um plano B orçamental, apesar das exigências de Bruxelas.
De novo, tem que se salientar que foi o actual
primeiro-ministro que, de forma totalmente imprudente, se encurralou na actual
armadilha. A mera existência de um plano B não tem absolutamente nada de
ideológico, decorre apenas do mais elementar sentido de prudência e bom senso.
O conteúdo do plano B terá, certamente, uma tonalidade ideológica, sendo
completamente diferente se for traçado por um governo de esquerda ou de
direita, mas a existência do plano em si nada nos diz sobre as opções
políticas, mas tão só sobre a qualidade da governação.
Mas António Costa assentou o orçamento de 2016 em duas
fantasias: em primeiro lugar, o cenário macroeconómico, que não levou em linha
de conta a desaceleração internacional em curso, nem os fortes danos que a sua
política anti-empresarial teria sobre o investimento; em segundo lugar, ignorou
os impactos negativos das suas medidas orçamentais, em particular o aumento do
imposto sobre os combustíveis, que desviaram muitas receitas fiscais para
Espanha.
Qualquer pessoa que não fosse destituída do maior elementar
bom senso e do mais básico conhecimento de economia, sabia, à partida, que um
plano B seria essencial. Talvez fosse difícil prever que apenas um mês e meio
após a entrada em vigor do novo orçamento a Comissão Europeia (CE) já estaria a
pedir um plano B, mas é totalmente óbvio que uma qualquer versão deste plano
teria que ser disponibilizada – e aplicada – dentro de meses.
António Costa, por pura imprudência e irresponsabilidade,
colocou-se na posição de recusar divulgar um plano B, mesmo agora que a CE
ameaçou aplicar sanções em Julho.
É evidente que a CE não quer aplicar sanções, como já em
2002 evitou aplicá-las à França e Alemanha. Bruxelas teme, com razão, os
resultados das eleições espanholas e o referendo inglês de Junho, onde o
sentimento anti-europeu impera. No entanto, não pode aceitar a inacção do
governo português.
A birra absurda de António Costa, como antes a birra de
Sócrates, tem todas as condições de custar caríssimo ao país. Convém recordar
que, antes das sanções de Bruxelas, é muito provável que cheguem as sanções dos
mercados financeiros, com uma gravosa subida das taxas de juro.
[Publicado no jornal “i”]
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