domingo, 13 de dezembro de 2015

Perspectivas em deterioração

Quer o contexto internacional quer o novo governo deverão resfriar a economia portuguesa

Esta semana, o Banco de Portugal divulgou as suas novas previsões para a economia portuguesa, que foram ligeiramente revistas em baixa (para 2016, o PIB deverá agora crescer agora 1,7% em vez de 1,9%), sobretudo devido ao abrandamento do contexto internacional. Estas perspectivas estão agora alinhadas com as da Comissão Europeia, mas ainda um pouco acima das do FMI (1,5%), que está mais pessimista, não só em relação ao próximo ano, mas em relação aos seguintes, em que prevê uma desaceleração da actividade, ao contrário das outras duas instituições, que antecipam uma aceleração da recuperação.

Infelizmente, penso que as estimativas do FMI são ainda optimistas, porque assumem uma desaceleração mínima na China, de 6,8% em 2015 para 6,3% em 2016, o que parece estar longe do que se avizinha. A queda recente do preço do petróleo, para um mínimo desde o início da crise de 2008, é um indicador do enfraquecimento da procura global, da qual a China tem sido, de longe, o principal motor.

Regressando a Portugal, em relação às influências internas, os números do banco central foram calculados com base na usual hipótese técnica de “políticas invariantes”.

Na verdade, sem tentar colocar números nos resultados, parece que se podem inferir algumas consequências económicas resultantes do novo enquadramento político. Em primeiro lugar, tem havido uma enorme dificuldade em concretizar os acordos de esquerda e aquilo que aqui designei como “prólogo orçamental” continua por concluir. Ou seja, é de admitir que as decisões do novo governo permaneçam envoltas numa elevada incerteza até à última hora, enquanto o próprio momento de decisão parece ser sucessivamente protelado. Excepto nos casos em que a demora poderia permitir um debate e uma reflexão aprofundada, como infelizmente foi o caso da decisão de eliminar as provas do 4º quarto.

Esta incerteza deverá adiar decisões de investimento e pode também levar os consumidores a criar poupanças de precaução.

Para além disso, as decisões já tomadas e outras que parecem em vias de o ser, como a reversão de privatizações, a marcha atrás na reforma do IRC e a subalternização da Concertação Social, espelham uma atitude anti-empresarial, que só pode ter como consequência um recuo no investimento previsto, movimento de que já há sinais evidentes, sobretudo naqueles que contactam de perto com investidores.

Parece que o novo governo está a ignorar este tipo de efeitos, enquanto espera que os estímulos orçamentais se traduzam numa forte aceleração da economia, para 2,4% em 2016 e uns miraculosos 3,1% em 2017, um valor que não é atingido há quinze anos. Estas perspectivas terão que ser em breve revistas, quer devido à referida desaceleração internacional, quer devido ao reconhecimento de que as metas orçamentais exigidas pela UE não permitem os estímulos sonhados pelo PS. Para além disso, mas em relação a isso não espero que haja já um reconhecimento deste facto, despejar dinheiros públicos pela economia não se deverá traduzir tanto em crescimento, mas sobretudo em importações.

Em relação ao futuro próximo, vejo duas incertezas principais. Em primeiro lugar, qual o grau de influência que o PCP conseguirá obter junto do governo, o que terá impactos significativos na relação com as entidades patronais e recuo no investimento, bem como num maior descontrolo das contas públicas.

Em segundo lugar, como é que a UE reagirá, quer à reversão de reformas penosamente alcançadas com a troika, quer a um menor controlo orçamental.

Teremos assim uma luta entre o PCP e a UE, por interposta pessoa do governo socialista. Veremos quanto tempo levará até que a UE vença este combate tão desigual.


[Publicado no jornal “i”]

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