António Costa e o PS
devem pagar um elevado preço político por derrubarem um governo dos vencedores
das eleições
O PR tem o dever de convidar Passos Coelho para formar
governo, “ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo
em conta os resultados eleitorais” (artº 187º da Constituição).
Há quem defenda que, dadas as movimentações à esquerda,
Cavaco Silva deveria passar por cima desta fase e convidar já António Costa.
Estou totalmente em desacordo. Em primeiro lugar, não é nada óbvio que o
secretário-geral do PS esteja em condições de garantir a disciplina de voto
dentro do seu próprio partido, tendo em atenção várias reacções que já foram
tornadas públicas, a mais corajosa e responsável das quais da parte de
Francisco Assis (mesmo estando fora da AR).
Em segundo lugar, Costa e o PS devem ser obrigados a pagar o
preço político de chumbar um governo formado pelos vencedores das eleições,
sobretudo tendo em atenção que a coligação já tinha anunciado que não
levantaria obstáculos a um executivo minoritário socialista, como o PSD já
tinha feito em 1995. Julgo que para os eleitores não será nada indiferente a
diferença de atitude entre quem se mostra cooperante e quem não aceita o
veredicto eleitoral ao ponto de o sabotar.
Em terceiro lugar, também se lhes deve exigir que paguem o
preço político pelo tipo de argumentação com que justificarão o derrube do novo
governo, sobretudo para se poder confrontar essa argumentação com aquela que
venha a ser a acção futura dum eventual executivo que integre o PS. Seria
verdadeiramente indesculpável perdoar o comportamento indigno de António Costa
e evitar que pague as consequências dos seus actos.
Chumbado um governo do PàF, será a vez do líder do PS tentar
a sua sorte. Nesse caso teríamos duas hipóteses: uma primeira, em que o PCP não
aceita integrar o executivo, mas em que o BE aceita ou não; uma segunda, com
uma coligação dos três partidos de esquerda no governo.
Se o parlamento não aceita que 107 deputados sustentem um
executivo, parecerá muito estranho que aceitem um governo apenas socialista,
com o apoio directo de apenas 86 deputados, ou mesmo uma coligação do PS com o
BE, que teria apenas 105 deputados. Ou seja, se António Costa não conseguir
levar tanto o BE como o PCP para o governo, perde a razão para ter derrubado o
governo do PaF.
Na segunda hipótese, parece evidente que esse governo terá
uma vida extremamente difícil, em que todos terão que engolir muito do que disseram
nos últimos anos. O mais grave nem serão os ataques que receberão da oposição
ou da rua, mas os conflitos internos dentro de cada partido e as divergências
entre os parceiros governamentais. É impossível acreditar que esta aliança
contra-natura tenha uma vida longa, se acrescentarmos a tudo isto, já mais do
que suficiente, os variados sinais de deterioração das condições internacionais
nos próximos tempos.
Na verdade, para o PS, o que faria mais sentido era fazer
rapidamente eleições internas, substituir este líder que se revelou incapaz de
ganhar as eleições mais fáceis desde 1995 e deixar a direita queimar-se com as
consequências do enfraquecimento da conjuntura externa.
Há muitos políticos que colocam os interesses partidários
acima do interesse nacional, mas o que António Costa está a fazer, como antes
dele já Sócrates o fizera, é colocar os seus interesses pessoais acima do
próprio partido.
Para o país, o que parece imprescindível é que se altere a
Constituição, no seu artigo 172º, que proíbe a dissolução da AR com prazos
absurdos, que deveriam ser totalmente eliminados. Tudo indica que o país vai
perder seis meses por causa de – mais uma – norma constitucional disparatada.
[Publicado no jornal “i”]
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