Ainda não foram
aprendidas todas as lições da grande crise, agravada pela falência do Lehman
Brothers há cinco anos
Há cinco anos, a 15 de Setembro de 2008, quando o banco de
investimento Lehman Brothers declarou falência, teve início a mais grave crise
económica dos últimos 80 anos. Comparada com a anterior, esta crise tem
produzido transformações demasiado curtas.
Em 1929, teve início a Grande Depressão, que só terminou
mesmo, nos EUA, com a escalada de armamento provocada pela II Guerra Mundial
(1939-1945).
Mas a Grande Depressão trouxe como resposta uma mudança da
agulha na política económica, que se afastou do liberalismo e se aproximou
claramente do intervencionismo, mutação essa que perdurou até aos anos 80. No
caso da banca, esse intervencionismo traduziu-se, nos EUA, na lei
Glass-Steagall (1933), que separou, de forma muito clara, as actividades da
banca comercial e a de investimento.
A vitória liberal, protagonizada por Thatcher e Reagan, no
início dos anos 80, fez recuar o intervencionismo estatal, em particular no
sector financeiro. A desregulamentação financeira está, aliás, na origem de
dois graves problemas actuais. Em primeiro lugar, a absurda financeirização das
economias que se lhe seguiu levou este sector a absorver uma proporção muito
para lá do razoável dos recursos económicos. Em segundo lugar, realizou, de
forma camuflada, gigantescas transferências de riscos que, quando foram
desvendadas, provocaram o caos.
Este segundo aspecto relaciona-se com um dos mais graves problemas
encontrados no sector financeiro: um abaixamento generalizado dos padrões
éticos, com honrosas excepções.
Foi enganando este mundo e o outro que os grandes bancos
americanos nos trouxeram à crise do
suprime, em 2007, que resultaria na falência do Lehman Brothers, a partir do
qual todos os problemas se aceleraram. Em Portugal, também fomos vítimas de
outro tipo de comportamentos menos correctos, como se tem vindo a verificar no
grau de exotismo dos contractos de swaps,
supostamente feitos para minimizar riscos e cujo resultado é o oposto.
O antigo presidente da Estradas de Portugal (EP) afirmou recentemente
que sem o contrato swap celebrado em
2010 a empresa não teria conseguido obter financiamento nem na banca nacional
nem internacional. Parece querer ele dizer com isto, que era imperioso que
aquele contrato tivesse sido realizado. Pois eu fico com uma dúvida: se o
contrato de swap é que permitia o acesso a crédito, que cláusulas leoninas
conteria ele?
Apesar dos problemas descritos, a crise actual tem tido um
impacto estranhamente limitado nas escolhas políticas dos principais países.
Não sou propriamente partidário de um recuo genérico na liberalização
económica, mas é um pouco estranho que não haja sequer mais tentativas nesse
sentido.
Para além disso, esperar-se-ia uma forte reforma do sistema
financeiro, para impedir a repetição dos problemas actuais. Em particular,
esperar-se-ia uma qualquer versão actualizada da lei de separação entre a banca
de investimento e a banca comercial, para impedir que jogadas de alto risco
feitas no segmento de investimento contaminassem o sector mais tradicional e
mais essencial à economia.
Isto não foi feito nos EUA, nem em Portugal, apesar de, no
nosso país, a banca estar a beneficiar de montantes muito significativos de
ajuda pública, em alguns casos para tapar buracos deixados pelas mais
imprudentes apostas financeiras. Na verdade, a crítica da extrema esquerda, de
“economia de casino”, acaba por ter uma razoável aderência à realidade, no
sector da banca de investimento.
O que será necessário para que verdadeiras reformas sejam
introduzidas? Mais uma catástrofe, como o fim do euro? Talvez, embora se deva
acrescentar que, quando isso acontecer (e insisto em afirmar “quando” e não
“se”), a falência do Lehman Brothers parecerá uma ligeira indisposição.
[Publicado no jornal i]
Sem comentários:
Enviar um comentário