A solidez do sistema financeiro português é um dos três objectivos do programa acordado com a troika. Para isso foram anunciadas vários objectivos, entre as quais se destacam: a) um aumento dos capitais nucleares dos bancos, que deverão passar de 7,1% do activo no final de 2010 para 10% no final de 2012; b) uma redução da proporção do crédito a clientes, dos actuais 148% para 120% dos depósitos.
É evidente que muitos portugueses estão insatisfeitos com as imposições da troika e no seu caso os bancos podem argumentar que as medidas são desagradáveis, mas não podem dizer que são medidas dispensáveis.
Em relação ao aumento de capital, digamos que há quatro soluções possíveis. A primeira é os bancos venderem participações em sectores que não têm relação com a sua actividade. O BES vai ficar triste de deixar de ser um accionista decisivo na PT, mas provavelmente não terá alternativa.
Uma segunda solução consiste na venda de participações em bancos noutros países. Esta solução pode ser particularmente ingrata porque para alguns bancos portugueses os lucros actuais vêm quase exclusivamente do exterior. A maior parte da actividade bancária em Portugal dá prejuízo neste momento e a forte queda dos resultados do 1º semestre reflecte exactamente isso. O caso mais flagrante é o do crédito à habitação, que representa cerca de 40% dos créditos dos bancos portugueses e que foi contratada com spreads baixíssimos por prazos longuíssimos. Em emissões recentes os bancos só conseguiram fundos a 8% mas a maior parte das famílias está a pagar actualmente taxas de juro abaixo dos 3%.
Os problemas da segunda solução também contaminam a terceira solução: pedir aos accionistas que invistam mais no banco. Será difícil convencer os actuais accionistas e mais ainda eventuais novos accionistas a investir num negócio que está a gerar poucos lucros. É também difícil desenhar perspectivas risonhas porque a nossa economia irá permanecer em recessão até 2012.
Finalmente a quarta solução é recorrer aos 12 mil milhões de euros que a troika acordou em nos emprestar, tendo justamente a função de aumentar o capital dos bancos. A desvantagem é passarem a ter o Estado como accionista, com a perda de liberdade que isso implica.
Haveria ainda uma quinta solução, a redução do crédito, que vou tratar na questão do segundo problema que os bancos têm que resolver: a desproporção entre o crédito e os depósitos. Antes de mais convém explicar que este problema nasceu das políticas económicas dos últimos 15 anos, que nos levaram a viver a crédito e a acumular uma dívida ao exterior de mais de 110% do PIB.
Este problema tem um lastro gigantesco e vai ser muito difícil de solucionar, passando necessariamente por o crédito crescer muitíssimo menos do que os depósitos e até diminuir nalguns casos.
No imediato as restrições crescentes que os bancos estão a colocar na concessão de crédito não terão grande consequência. Por um lado a forte subida das taxas de juro dos créditos diminui obviamente a quantidade procurada de crédito, mas a falta de perspectivas das empresas e famílias também as faz recorrer menos ao crédito. Em 2013 é que as coisas poderão ficar mais complicadas, com as restrições dos bancos a constituírem um forte entrave a uma retoma robusta.
Outra solução para diminuir a desproporção entre créditos e depósitos é, obviamente, tentar angariar mais depósitos. É isso que os bancos estão a fazer, numa significativa luta pelos depósitos que os tem feito subir as taxas de juro oferecidas, não só por causa deste problema, mas também porque estão com muita dificuldade em obter fundos a taxas acessíveis. Por seu lado, esta subida das taxas de juro dos depósitos vai diminuir ainda mais as margens dos bancos, agravando as já difíceis condições de rentabilidade referidas acima.
Os problemas enfrentados pela banca são difíceis, mas há soluções disponíveis, inclusive abundantes fundos da troika, que poderão ser utilizados em último recurso.
[publicado no "i"]
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